Olhando bem para A Favorita do Rei a impressão que fica é de uma carta de amor escrita para sua personagem principal, Jeanne du Barry, “amante oficial” do Rei Luís XV e que ficou famosa por ter escandalizado ainda mais a corte francesa do que a jovem Maria Antonieta. No final ambas foram para a guilhotina.
Mas antes disso (bem antes!), Jeanne nasceu protegida por um duque ricaço qualquer, mas acabou sendo expulsa de lá, depois de ser mandada embora de um convento (por ler umas histórias eróticas), se tornou cortesã. Mas seu caminho até chegar na corte ainda passou pelo canalha que lhe emprestou o sobrenome e lhe “cedeu” para o Rei, que se apaixonou.
O filme escrito pela própria diretora Maïwenn em parceria com Teddy Lussi-Modesto, Nicolas Livecchi e Marion Pin, tem tanta gente escrevendo com uma razão: sua complexidade. O filme se aprofunda em Jeanne (também vivida por Maïwenn) até a sua mais profunda camada, sem nunca deixá-la ser julgada pelo espectador como é feito pela corte. O olhar apaixonado da câmera e da história por ela é o mesmo de Luís XV (Johnny Depp).
O problema é que A Favorita do Rei em certos momentos soa obrigado a ser didático e expositivo com o trabalho de recriação de época, tanto no visual, quanto na pesquisa histórica. A narração inicial e no final dá a tudo uma cara de literatura clássica. A vontade de mostrar aquela corte com todos exageros e detalhes, dos mais luxuosos até os mais ridículos, na maioria do tempo é divertido, mas em outros apenas impede o filme de seguir um caminho mais ágil e interessante.
Parte desse problema ainda fica mais claro com uma estrutura quase episódica e que decide não seguir uma trama maior. Em vez disso, vai apenas mostrando capítulos dessa relação entre Jeanne e as pessoas ao seu redor, cada personagem, um lado que mostra o quanto essa mulher parecia ser muito maior do que qualquer corte ou tradição decandente do Palácio de Versalhes. Maïwenn sabe disso e sua clara paixão pela personagem vem disso.
Isso ajuda em seu trabalho como atriz, já que a personagem é apaixonante e o espectador ira se apegar completamente a suas vontades, dores e injustiças. Ao seu lado, Depp volta ao cinema depois da famigerada e vergonhosa luta jurídica com a ex-esposa, o resultado disso é uma atuação que entende o personagem, contida e que sabe que Luis XV não pode ser espalhafatoso, bem pelo contrário, precisa que seu olhar seja mais preciso do que qualquer reação.
Com esse casal de protagonistas que funciona e uma velocidade quase literária e até meio arrastada de A Favorita do Rei, o que sobra é um filme que valoriza o visual caprichado (filmado em locação, ao que tudo indica) e que fará o espectador acabará a sessão de cinema com a impressão clara de saber ainda mais sobre a história dessa mulher fortíssima e que entrou para a história da França. O que talvez seja o mais objetivo (concretizado) de Maïwenn.
“Jeanne du Barry” (Fra/Bel/UK, 2023); escrito por Maïwenn, Teddy Lussi-Modesto, Nicolas Livecchi e Marion Pin; dirigido por Maïwenn; com Maïwenn, Johnny Depp, Benjamin Lavernhe, Pierre Richard, Melvil Poupaud e Pauline Pollmann.