É uma lufada de ar fresco um filme romântico que não tenha o nome de Nicholas Sparks no cartaz. Afinal, parece que tudo hoje em dia segue essa fórmula, e, por mas bem sucedida financeiramente que ela seja, não satisfaz sempre. É bom variar.
A Incrível História de Adaline traz uma história com ares de O curioso caso de Benjamin Button. A qualidade de fábula conferida tanto pela trama quanto pela narração em off cai muito bem a uma história fantástica que tem toda sua essência baseada na protagonista: Adaline é uma mulher nascida em 1908 que, após um acidente, curiosamente para de envelhecer. Ela continua eternamente com aparência de 29 anos e, conforme as décadas passam, ela se vê obrigada a trocar de identidade periodicamente afim de preservar seu segredo. Assim, Adaline também leva uma vida reclusa: apenas sua filha (Ellen Burstyn) sabe de sua situação e Adaline faz questão de manter tudo como está.
Nos dias atuais, a protagonista atende pelo nome de Jennifer, trabalha na Biblioteca Pública de São Francisco e está prestes a mudar novamente de identidade, quando, na noite de seu aniversário – que também é Ano Novo –, ela conhece Ellis. De início a contragosto, “Jenny” inicia um relacionamento com Ellis, que é simplesmente o homem perfeito para ela: é bonito, rico, inteligente, romântico e com uma queda por história antiga.
Então, nós temos uma história com potencial, bons atores, uma protagonista interessante e um mote que parece eficiente. O problema é que não importa o quanto Lively e Huisman sejam bonitos, bons atores ou perfeitos para seus personagens, eles simplesmente não têm química em tela. E isso é o que quebra a aura de romance que o filme tenta estabelecer.
Não me leve a mal, o problema não é que o filme acaba por não ser um romance: é que ele tenta demais ser um romance, mas não consegue devido à falta de química do casal protagonista. Esse efeito é potencializado por uma história de fundo que vai se revelando aos poucos e toma mais atenção do que a trama principal. Adaline manteve sempre seu segredo, exceto por uma vez, em que se entregou, se apaixonou, mas fugiu para não contar a verdade. E isso a marcou para sempre. A ideia que essa subtrama dá, ao bater insistentemente na tecla de que a revelação só aconteceu uma vez, possibilita duas opções: ou essa pessoa vai voltar, ou ela terá outro relacionamento tão intenso quanto com outro alguém. Entretanto, nenhuma dessas duas coisas acontece: o romance de Ellis e “Jenny” parece forçado desde o início, e não fica mais natural com o passar do filme; já o amor do passado meio que aparece, mas nada demais acontece entre eles. Ficamos esperando pelo clímax romântico. Só que ele nunca chega.
Outro problema de A incrível história de Adaline é a narração em off. Apesar de casar com o ar de fábula, ela é mal escrita e mal colocada. Aparece em momentos aleatórios, não tem fluidez, apenas explica “tim tim por tim tim” o que tem que explicar. Mas, ora, o cinema é uma arte baseada na imagem e, como disse Hitchcock: “Quando se escreve um filme, é indispensável separar nitidamente os elementos de diálogo e os elementos visuais e, sempre que possível, dar preferência ao visual”. É muito mais fácil falar o que acontece do que mostrar.
Embora a primazia cinematográfica seja da imagem, a narração em off é um recurso que pode ser ainda mais complexo do que a construção visual, pois a linha entre explicar uma ação e conduzir uma narrativa é muito tênue. Já tive a oportunidade de escrever algumas narrações e sei que é muito fácil perder a mão, ou, mesmo, não encontrar o rumo de jeito nenhum, o que deixa o texto deslocado da narrativa, que, por sua vez, parece preguiçosa. Porém, quando bem utilizado, o recurso diferencia a narrativa do comum. Poderia ser o caso com A incrível história de Adaline. Mas não é.
O que o filme tem de defeitos em outros departamentos, porém, tem de qualidades visuais. Repare nos detalhes de figurino, maquiagem e arte, especialmente nos flashbacks. O visual passeia com naturalidade pelas décadas e é de encher os olhos.
A Incrível História de Adaline é uma sequência de más escolhas do roteiro somada a opções de direção duvidosas em uma história que proporcionaria muito mais. Os atores estão apenas bem, quando poderiam estar ótimos; a trama é apenas ok, mas poderia ser excelente; o visual se salva maravilhosamente, porém, não salva o filme todo. Um filme que fica no meio, mas que poderia estar no topo e entrar junto para aquele conjunto de romances fabulosos que cavocam seu lugar em nossos corações, como O Fabuloso Destino de Amélie Poulain ou uma série de filmes de Woody Allen. É uma pena que não chegue lá.
“The Age of Adaline” (EUA) escrito por J. Mills Goodloe e Salvador Paskowitze, dirigido por Lee Toland Krieger, com Blake Lively, Michiel Huisman, Ellen Burstyn e Harrison Ford.
2 Comentários. Deixe novo
Explicou muito bem o problema da narração. É muito fácil “perder a mão”, ou até perder a própria função. Afinal de contas, se está usando, é porque deve ter um motivo. Usar por usar soa justamente o que geralmente é: preguiça.
PS: Fora as atuações mornas, é bom lembrar que tem Harrison Ford no elenco, e ele está “envelhecendo” muito bem como ator. Digo isso por este Adaline e Uma Manhã Gloriosa.
Concordo com você em certos pontos, mas me pareceu que vc foi assistir ao filme disposto a não gostar, e isso já deixa sua crítica tendenciosa.