Há algo de belo na vida dos simples de mente, dos humildes de ambição. As pessoas são protagonistas da própria história, mesmo que essa história não seja grande coisa. Pelo menos são mais protagonistas do que as que estão na corrida dos ratos, correndo de um lado pro outro tentando melhorar de vida ou apenas pagar as contas. A Saída Está à Nossa Frente, filme americano independente daqueles independentes mesmo, captura essa essência. E nós somos capturados por essa fascinação.
Dirigido, escrito, produzido e editado por Rob Rice, sua câmera noturna dá o tom onírico e poético na jornada de uma família da vida real prestes a perder um ente querido. Mantendo em segredo isso, eles bolam um plano para sua filha, Cassie: ir morar em Los Angeles, deixar a periferia de beira de estrada onde morou a vida toda e ganhar a esperança de uma vida melhor. Deixar seus amigos de infância, também. Deixar seus parentes. Essa futura despedida acontecerá principalmente para seu pai, diagnosticado com uma doença terminal. Suas almas devem se encontrar em outro plano.
O filme todo acompanha essas pessoas, morando nesse vilarejo improvisado no meio do nada. O verdadeiro “American Way of Life”. Não o anunciado, o com marca registrada. Essas pessoas estão no limiar da pobreza e isso, por alguma razão que nos escapa, parece ótimo. Elas têm umas às outras, e isso é alguma coisa. Se formos pensar, apenas isso basta para viver um dia de cada vez.
A fotografia focada no horizonte, que no deserto sempre muda de cor e luz, serve para uma rima elegante entre os espaços caóticos dos habitantes. Os semblantes oscilam entre os planos sugerindo uma conexão do mundo mundano para o além. As interpretações são livres para o espectador. Peço que se lembre da primeira cena, em uma caverna, e irá entender.
Essa trilha sonora caótica como a história adquire um status de pertencimento, mas mais do isso, participa do clima de estranhamento, do distanciamento ao que estamos acostumados a ver no cinema. É curioso que em alguns momentos lembra música de alienígena. É o outro mundo o que aspira o trabalho de Colyn Cameron. E em uma troca visual com o filme ele nos entrega uma certa esperança.
Rob Rice pega uma influência nervosa dos cineastas de outras partes do mundo onde é comum filmar pobreza (nós inclusos). Ele transforma isso em uma poesia ao céu aberto, com direito a cores e luzes que não são comuns de serem vistas no horizonte norte-americano.
“Way Out Ahead of Us” (EUA, 2022), escrito e dirigido por Rob Rice, com Nikki DeParis, Tracy Staggs e Mark Staggs.
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