Gary Johnson, este pacato, metódico, monótono professor de Psicologia e, como se não bastasse, Filosofia, vai aprontar poucas e boas em uma adaptação livre de sua biografia em um romance fofo e doentio na medida certa para que nós, espectadores, nos identifiquemos com as ondas da paixão entre a inesquecível Madison e o agora alterego perigoso e atraente Ron.
Um filme com uma trama com mudança de personalidade atrelada à máxima filosófica de Nietzsche em se transformar na melhor de suas versões dentro de uma investigação policial envolve uma porrada de temas. Felizmente, o Assassino por Acaso consegue dar uma ideia, ainda que não muito profunda, de como todos estes temas poderiam dialogar entre si.
Me incomoda um pouco o fato dos seus personagens serem tão amáveis (e a química do casal tão instantânea!) e ainda assim precisamos percorrer um longo caminho para a redenção. Mas esta é a regra do jogo: sem conflitos, sem filme.
Mas o que incomoda (de verdade!) é que o forte do diretor Richard Linklater (“Trilogia do Antes“, Jovens, Loucos e Rebeldes, Escola do Rock e Boyhood) não é nos envolver em tramas complexas e fechadas, mas nos embalar em experiências humanas que realçam a relação irreconciliável entre a lógica racional e as emoções que trazem essa mesma lógica viva e com energia para nosso mundo verborrágico e implacável.
Não à toa Linklater é o anfitrião de temas existenciais com uma irreverência quase impossível. E não à toa acompanhei este filme com pelo menos um pouco de ceticismo.
O resultado não é dos melhores. Ele é engraçado, isso ele é. Um humor em alguns momentos sombrio e até condenável, dependendo de como você enxerga o sistema de justiça. Esse tema infelizmente não é desenvolvido o suficiente até o momento em que um personagem chave morre e esta seria uma rima perfeita (não foi dessa vez).
Mas se o pecado do Assassino por Acaso é não ser profundo demais em uma comédia “dark”, acho que ele está mais que perdoado pelo espectador comum, que vai se divertir imensamente com a trama principal. Há uma tensão tremenda que nunca termina, mas que te engana em alguns momentos onde parece que tudo irá dar certo até não dar. Gente que vai ao cinema adora isso.
“Hit Man” (EUA, 2023); escrito por Richard Linklater, Glen Powell, e Skip Hollandsworth; dirigido por Richard Linklater, com Glen Powell, Adria Arjona e Austin Amelio.