As Aventuras de Paddington

Ursinho de best seller inglês ganha as telas em suas aventuras pelo mundo moderno.

Os livros de Michael Bond narrando as histórias do urso Paddington, que apareceu pela primeira vez nas livrarias britânicas há cinquenta e seis anos, não são muito conhecidos no Brasil. Mesmo sem As Aventuras de Paddington Postera familiaridade e a nostalgia acrescentando à experiência cinematográfica desta adaptação, As Aventuras de Paddington é, ainda assim, um belo, doce e divertido filme, protagonizado por um personagem adorável.

Depois de mostrar como seus tios tiveram o primeiro contato com os humanos através da chegada de um explorador britânico, a história de Paddington (voz de Ben Whishaw na versão original, infelizmente não lançada no Brasil) tem início quando um terremoto tira a vida de seu tio Pastuzo (voz de Michael Gambon). Buscando uma vida melhor para o sobrinho, sua tia Lucy (voz de Imelda Stauton) manda o jovem Paddington para Londres, onde o explorador prometeu que a família sempre seria bem recebida. Chegando na chuvosa capital, o ursinho conhece, na Estação de Paddington, a família Brown, que aceita abrigá-lo por apenas uma noite enquanto ele não encontra um novo lar.

Mantendo-se fiel ao espírito dos livros lançados na década de 50, o design de produção de Paddington é um dos aspectos mais fascinantes da obra. Ambientado nos dias de hoje, como deixa clara a presença de fones de ouvido, laptops e celulares, o filme traz um clima retrô através dos figurinos, da decoração da casa da família Brown (repleta de papéis de parede decorados, luzes, objetos e cores fortes) e, inclusive, do intricado sistema utilizado pela Organização dos Geógrafos para consulta de documentos. Assim, o traje típico do urso – o chapéu vermelho de explorador e o casaco vermelho -, além de apropriado ao clima londrino, mostra-se em harmonia com os outros elementos da decoração.

Além disso, o design de produção traz ao filme um tom de livro infantil – algo, obviamente, muito apropriado à adaptação, e de que o diretor e roteirista Paul King faz ótimo proveito ao trazer, por exemplo, uma casa de bonecas transformando-se na residência dos Brown, ou com os diferentes recursos gráficos que, certa vez, contam a história de um garoto judeu através de um antigo trem de brinquedo e, em outra sequência, inserem Paddington no filme sobre a visita do explorador ao Peru. Os efeitos especiais do protagonista, por sua vez, são excelentes – enquanto o animal mostra-se realista em suas expressões faciais e na forma como seus pelos se movem, por exemplo, suas interações com os humanos também são impecáveis.

Apesar de ser óbvio desde o primeiro encontro que os Brown vão, eventualmente, mudar de ideia sobre fazer de Paddington parte da família, o carisma da família faz com que isso não incomode tanto. Afinal, o próprio filme parece reconhecer isso – a placa do “achados e perdidos” da estação ilumina-se quando a Senhora Brown (Sally Hawkins) aproxima-se para conversar com o urso. Os argumentos da família para quererem outro lar para o urso fazem sentido e não são resultado de maldade e, portanto, a “reviravolta” nos sentimentos também acontece de forma natural. Enquanto a rigidez do Senhor Brown (Hugh Bonneville) é racional, a bondade da Senhora Brown é condizente com a personalidade fantasiosa e doce de uma mulher que ganha a vida ilustrando livros de aventura. Já as crianças Judy (Madeleine Harris) e Jonathan (Samuel Joslin) tem a oportunidade de ter alguma importância na trama, participando ativamente da sequência que se passa no museu de história natural.

Enquanto isso, Nicole Kidman, na pele de Millicent – e obviamente se divertindo muito com a maldade de sua personagem – consegue transformar uma vilã unidimensional em uma personagem interessante e que consegue estabelecer-se como um perigo real para o ursinho. Além disso, é sempre bom ver nas telas uma mulher cuja maldade não seja resultado de um coração partido ou do desejo de conquistar um homem.

As Aventuras de Paddington Crítica

Mas, é claro, o grande destaque da obra é o urso Paddington que, aqui, consegue mostrar mesmo ao público que não o conhece porque é uma figura tão marcante na literatura infantil britânica. O ursinho não perde o espírito bondoso e a boa educação mesmo depois de passar por diversas situações desesperadoras, e mesmo a hesitação dos Brown em abrigá-lo não diminui seu carinho pela família. Por outro lado, sua falta de familiaridade com a cidade e com os hábitos humanos é divertidíssima – destacando-se a sequência no banheiro, que ele depois classifica como “um lugar muito perigoso”, e sua tentativa de andar de escada rolante, que inclui uma interpretação literal da frase “cachorros devem ser carregados no colo”.

Sem alienar o público infantil, o longa consegue, mesmo assim, incluir passagens claramente voltadas aos espectadores mais velhos, seja o explorador mencionando “um interessante boxeador que conheci em um bar” ou assuntos mais pesados, como as semelhanças entre a ida de Paddington a Londres em busca de um lar e as crianças órfãs da Segunda Guerra Mundial fazendo o mesmo, ou a discussão entre os geógrafos sobre o que constitui-se como um “povo civilizado”.

Repleto de nomes conhecidíssimos do cinema britânico (Kidman sendo a única atriz de fora do Reino Unido) e adaptando um clássico da cultura do país, é uma pena que o público brasileiro não tenha a opção de conferir a obra em toda a sua “inglesice”, pois, se o sotaque paulista de Paddinton incomoda um pouco, é triste a inclusão de “brasilidades” como uma menção ao Corinthians e ao Flamengo, que não acrescentam – obviamente – absolutamente nada à história e só servem para tirar o espectador do filme.

As Aventuras de Paddington é, portanto, um filme agradável e divertido para toda a família, mesmo sendo protagonizado por um personagem desconhecido da maior parte do público brasileiro. Com um senso de humor eficiente, personagens carismáticos e um protagonista memorável, o filme merece ser visto e, principalmente, revisitado quando estiver disponível na versão original legendada.


“Paddington” (Ing, 2014), escrito por Paul King e Hamish McColl, à partir do livro de Michael Bond, com Nicole Kidman, Ben Whishaw (voz no original), Michael Gambon, Peter Capaldi, Sally Hawkins, Imeld Stauton e Jim Broadbent


Trailer – As Aventuras de Paddington

Mariana González
Mariana González

Mariana González é jornalista e colaboradora do CinemAqui desde 2013. Além de escrever sobre cinema, tenta se aventurar atrás das câmeras. No Twitter, pode ser encontrada no @mariszalez.

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