Vindo do roteiro do premiado Oslo, 31 de Agosto – onde o vício em drogas é explorado – o diretor norueguês Eskil Vogt aborda aqui outra difícil questão, a da perda de uma função básica do nosso corpo, a visão. Para isso, em Blind, Vogt (também responsável pelo roteiro) nos faz acompanhar de perto a adaptação de Ingrid (Ellen Dorrit Petersen) à recentíssima perda da habilidade de ver o mundo a seu redor. Isolada em sua casa por medo do novo universo lá fora, Ingrid começa a acompanhar a vida de seus vizinhos.
Tratando com cuidado a abordagem do que é perder a visão já adulto, o diretor nos coloca lado a lado com Ingrid em seu sofrimento, mostrando que, desde abrir uma gaveta na cozinha até limpar o chão quando se derruba algo, passam a ser tarefas delicadas e, muitas vezes, complicadas.
O tratamento do lado psicológico da protagonista, no entanto, se mostra muito mais experimental. Embora casada, o filme nos mostra Ingrid como uma pessoa isolada, simbolizando a forma como se sente. E quando começamos a acompanhar a vida de seus vizinhos, algo logo soa estranho. O motivo é que as vidas que Ingrid acompanha são, na verdade, produtos de sua imaginação.
Embora a ideia no papel seja interessantíssima, o problema é que ela nunca funciona no filme. Desde as terríveis gags sem graça (a personagem de Elin é puro incômodo!) passando por momentos em que o real e o imaginário se misturam de forma a criar apenas confusão – ou, pior, desinteresse no espectador – quando deveriam, imagina-se, criar algum tipo de suspense, surpresa ou mistério sobre “o que realmente está ocorrendo”, as viagens de Ingrid nunca mostram exatamente ao que vieram no filme.
O sofrimento dela é muito mais bem trabalhado com ideias simples, mas eficazes, como, por exemplo, quando ela, sozinha em casa, imagina que o marido a esteja observando. Isto cria belas sequências que exploram tanto a carência, quando a solidão que Ingrid vive.
Vivendo Ingrid com entrega total, a atriz Ellen Dorrit Petersen tira mais do filme do que ele realmente merece, e é graças majoritariamente a ela que verdadeiramente nos envolvemos com as dificuldades de sua personagem. O mesmo, no entanto, não pode-se dizer do filme como um todo. Tomando tempo demais de projeção, as histórias paralelas, logo que notamos o que realmente são, se tornam um fardo. E, assim, a segunda metade do longa parece interminável.
Ainda que não tenha o resultado esperado, Blind não deixa de ser um filme interessante devido aos pontos que funcionam nele. As ideias nele abordadas – mesmo que mal abordadas – são, de fato, temas ricos para discussão. Como realmente lidaríamos com a cegueira quando enxergamos a vida toda? Esqueceríamos tudo inclusive a cor da nossa casa? E para onde iria nossa mente quando envolta em uma constante escuridade? O filme levanta estas e outras questões. Uma pena que não as desenvolva melhor.
“Blind” (Nor, 2014), escrito e dirigido por Eskil Vogt, com Ellen Dorrit Petersen, Henrik Rafaelsen, Vera Vitali e Marius Kolbenstvedt.