Boa Noite, Mamãe vai te enganar, e isso fará com que muita gente saia do cinema achando que o terror austríaco é muito melhor do que ele realmente é. Na verdade, até muito melhor do que ele parece se propor a ser.
Bem diferente do climático A Bruxa e do ágil Corrente do Mal (destaques do gênero no ano passado), Boa Noite, Mamãe parece mais preocupado em satisfazer não só seu público, mas também todos que entrarem por engano no cinema. Diferente dos outro dois, aqui seus espectadores podem até não embarcar na história logo de cara, mas no final das contas terão um monte de surpresas e sairão do filme com a impressão de terem visto um filmaço. Não viram. Ainda que a balança pese para seu lado.
No filme, que já ganha muita gente pela premissa, dois garotinhos recebem de volta a mãe em casa depois de uma intervenção cirúrgica que a obriga a cobrir a face com bandagens. O problema é que, em pouco tempo, os dois passam a achar que por baixo daqueles curativos não é a mãe deles, o que os faz entrar em uma espiral de insanidade que tem de tudo para acabar em tragédia.
Sim, Boa Noite, Mamãe começa como um suspense interessante e cheio de significados e detalhes para serem resgatados mais lá pra frente, em pouco tempo descamba para uma certa agressividade e enfim se torna um “torture horror” que deixaria Eli Roth orgulhoso. Mas tudo sem o devido cuidado, deixando tudo divertido para os fãs do gênero, mas meio forçado para quem parar para analisar tudo com um mínima profundidade.
No afã de desviar a atenção de seu público, a dupla de diretores/roteiristas Severin Fiala e Veronika Franz não se importa de entregar um resultado meio esburacado, que deixa de tocar em uma série de assuntos que dariam um recheio maior à história toda. Não existe citação nenhuma aos tais acidentes só citados, mas que movem a trama e muito menos o tema da separação dos pais é explorado. E ainda que isso possa ser considerado um modo de olhar o mundo através dos olhos da dupla de protagonistas, a impressão que fica é muito mais de falta de algo para se contar. (E aqui um “meio spoiler”) E até a suposta grande surpresa do filme fica obvia com pouquíssimo tempo de filme, já que a mã simplesmente ignora a existência de um dos filhos.
Por outro lado, mesmo em certos momentos que se entregam aos devaneios dos dois garotos, o visual vale a pena, mas o vazio com que tudo é tratado se mostra um desperdício. Existem momentos lindíssimos como quando a câmera observa a mãe se ajeitando dentro do vestido, ou até enquanto ela vai se despindo em meio a floresta, tudo contrabalanceado com baratas e mais uma ou outra nojeira. E tudo acaba rumando para o caminho óbvio de que realmente (pelo menos aos olhos dos dois) quem está ali não é sua mãe, mas sim um monstro qualquer.
E se Boa Noite, Mamãe não parece se dar ao trabalho de discutir o que é real ou não até seu último plano, pelo menos ele tem a coragem de tomar um caminho simples e que joga o espectador dentro de uma violência que acaba sendo o que mais marcará o filme no final das contas.
Isso, e um visual que sabe ser calmo e contemplativo ao mesmo tempo que cheio de gore e soando como prato cheio para aqueles que forem em busca de um terror que sai um pouco da mesmice com uma premissa curiosa e criativa, mas nem de longe tenta fazer algo diferente dentro do gênero.
“Ich Seh Ich Seh” (Aus, 2014), escrito e dirigido por Severin Fiala e Veronika Franz, com Lukas Scharz, Elias Schwarz, Susanne Wuest e Hans Escher