Édifícil entender como projetos como Código de Silêncio ganham vida. Não existe nada de novo no filme lançado pela Netflix a não ser na capacidade de mostrar que é perfeitamente possível fazer um filme sem nenhum tipo de temática negra, mas ainda assim todo feito por negros.
Pensando bem, só isso já torna o filme mais que interessante. Mas de qualquer jeito a fragilidade de sua trama desperdiça a oportunidade de provar que é possível, mesmo se posicionando, ainda sim ser bom.
Nele, um jovem negro, Zurich (Trevor Johnson), em uma faculdade negra vive essa semana de calouro enquanto tenta entrar em uma fraternidade (de negros). Código de Silêncio então só perambula por esses dias acompanhando esses quatro candidatos sendo humilhados, agredidos e desacreditados por seus futuros ¿irmãos de fraternidade¿ (ainda que isso possa parecer pleonasmo). Tudo isso até o famoso ¿Hell Day¿, onde enfim se tornarão o que quer seja que alguém se torna quando entra em uma fraternidade.
E se você acha uma bobagem esse papo de fraternidade que os americanos tanto adoram celebrar (eu acho!), vai se irritar com Código de Silêncio. Na sequência irá se revoltar mais ainda com a celebração de uma ferramenta usada para criar uma violência psicológica que se reflete em uma sociedade (americana) cada vez mais à vontade com esse tipo de separação étnica e social. Mas isso não vem ao caso, o que vem é o quanto o filme não sabe muito bem o que fazer com o material em mãos.
Isso principalmente, pois o roteiro de Christine Berg e Gerard McMurray parece preocupado em apenas acompanhar esses dias e discutir pequenos momentos a serem julgados. Falta uma linha que conecte melhor o que está por vir, um conflito que empurre a trama ou que, pelo menos, deixe seus personagens discutirem o que pensam sobre qualquer coisa.
Tudo fica pior ainda quando certos personagens acabam tomando atitudes que não são discutidas em nenhum momento antes de serem encaradas. O próprio personagem principal tem uma angústia que o leva a encarar uma atitude incrivelmente forte sem nem por um segundo colocar em prova o quanto aquilo lhe incomodava antes. Pior ainda, aparentemente não entende nada que aconteceu e faz disso um motivador que o coloca em um outro caminho. No final das contas esse caminho acaba sendo desastroso e é o único momento em que o filme engata a segunda marcha, mas ai já é tarde demais.
No comando disso tudo, Gerard McMurray estreia em longas e não consegue ser prático nem poético, soando apenas pretensioso quando quer ¿ir além¿ e estabanado e perto demais da ação (sempre escura em excesso) quando quer só contar sua história. Curiosamente, McMurray aparece como produtor executivo de Fruitivale Station, que acaba tendo uma estrutura semelhante, mas que não peca no resto do tempo e cria personagens apaixonantes e um final tenso. Coisa que não acontece aqui.
Até em um dos poucos bons momentos do filme, McMurray parece falhar e não perceber o quanto seu filme poderia ir além e mostrar o problema de uma sociedade. Diante de dois policiais brancos, seja calouro, presidente da fraternidade ou aquele veterano violento, todos se apequenam e deixam o medo dominar seus olhares baixos.
Mas infelizmente isso é um momento pequeno demais para compensar o resto do filme.
Mas talvez Código de Silêncio seja mesmo mais importante para mostrar que existe a possibilidade de fazer tramas com negros sem que sejam para negros ou panfletários. Esse ano Moonlight ganhou o Oscar justamente desse mesmo jeito, ano passado Creed fez praticamente a mesma coisa. O resultado disso a longo prazo (seja em qualquer um dos filmes citados) talvez sejam uma Hollywood menos branca e muito mais racialmente equilibrada.
E ainda que seja um desastre, Código de Silêncio pode mostrar que é realmente possível isso acontecer. E fica aqui a torcida para que isso aconteça mais e mais vezes.
“Burning Sands” (EUA, 2017), escrito por Gerard McMurray e Christine Berg, dirigido por Gerard McMurray, com Trevor Jackson, Rachel Bianca John, DeRon Horton, Steve Harris, Nafessa Williams, Trevante Rhodes, Tosin Cole e Malik Bazille