Dirigido por um veterano coordenador de dublês, De Volta ao Jogo nos apresenta a um ótimo personagem e utiliza um roteiro simples, pouco intrincado, para focar no que interessa: as ótimas sequências de ação.
Depois de anos trabalhando para a máfia russa ¿ que, graças a ele, alcançou a privilegiada posição de que usufrui atualmente –, John Wick (Keanu Reeves) decide abandonar a vida de matador profissional e viver uma “vida normal”, o que consegue ao lado de sua amada Helen (Bridget Moynahan). Após um câncer levar sua esposa à morte, porém, Wick encontra-se desolado e solitário, algo que Helen havia antecipado, o que a levou a presentear postumamente o marido com uma adorável cachorrinha beagle. Novamente com “alguém para amar”, o protagonista reencontra a esperança de permanecer levando uma vida normal – até que o mimado Iosef (Alfie Allen), filho do chefe da máfia para a qual Wick trabalhava, decide roubar seu adorado carro vintage e, no processo, mata seu novo animal de estimação. O desejo de vingança impulsiona Wick que, assim, vai se adentrando cada vez mais no mundo que tanto se esforçou para abandonar.
A partir de então, De Volta ao Jogo acompanha Keanu Reeves metendo socos e balas nos incontáveis capangas que Viggo (Michael Nyqvist), o chefe da máfia, manda para cima dele. Além disso, ele tem que se livrar de outros matadores profissionais, atrás da recompensa bilionária que Viggo, tentando proteger seu herdeiro, prometeu para quem assassinar Wick. O roteiro descomplicado assinado por Derek Kolstad, assim, é eficiente ao evitar reviravoltas forçadas e coincidências idiotas, mantendo o foco na vingança de Wick e dando espaço para espetaculares sequências de luta, que Chad Stahelski comanda com segurança. O diretor estreante cria uma mise-en-scène que permite que o espectador acompanhe com clareza a ação, o que é essencial também para estabelecer Wick como uma perfeita máquina de matar, afinal, não adiantaria Viggo discursar sobre a letalidade do matador se, na hora da ação, não pudéssemos perceber as diferenças entre Wick e seus adversários.
Por outro lado, Kolstad e Stahelski são inteligentes ao criarem um submundo do crime com regras próprias: em De Volta ao Jogo, Nova York tem um hotel e uma boate exclusivos desses profissionais, e as cobiçadas moedas de ouro são o passaporte. Além disso, apesar de ser predominantemente masculino, o longa ao menos evita o velho clichê da “mulher morta para motivar o protagonista”: sim, Wick recentemente perdeu a esposa, mas não foi sua morte que o colocou de volta à profissão – o retorno foi motivado pelo frágil estado emocional em que ele se encontrava. Da mesma forma, ela morreu de câncer, e não assassinada pela máfia ou por outro inimigo do marido. A asssassina profissional Ms. Perkins (Adrianne Palicki), por sua vez, é tratada como igual, surgindo sempre em roupas práticas e condizentes com suas atividades – nada de sair por aí dando tiros de vestido curto e salto alto, como muitos filmes adoram mostrar.
Embalada por uma trilha sonora energética, a fotografia de Jonathan Sela flerta com o noir investe em tons de azul e de cinza para criar um ambiente melancólico e desolado, como o protagonista se encontra, mas pincelados com ocasionais cores néon que trazem dinamismo para as sequências de luta. O elenco coadjuvante, com nomes como Willem Defoe, Ian McShane e John Leguizamo em pontas de luxo, é eficiente ao retratar diferentes personas típicas dos filmes de ação mas, fora o próprio Wick, o roteiro não perde muito tempo desenvolvendo seus personagens.
Finalmente, Keanu Reeves faz de John Wick um protagonista interessante e carismático, alguém que realmente queremos ver vencendo. Prático e eficiente em campo, o matador não perde tempo com longos discursos ou torturas, matando seus inimigos assim que possível, o que, por sua vez, faz com que os realizadores tenham que salvar Iosef (Alfie Allen) facilmente demais para que ele não morra logo no começo do filme. Exibindo uma quantidade crescente de hematomas e cortes ao longo da projeção, o protagonista se mostra um homem forte também emocionalmente – quando Viggo tenta atingi-lo falando sobre a morte de Helen, fica claro que ele não está falando nada que o próprio Wick já não tenha considerado.
De Volta ao Jogo é, portanto, um filme de ação divertido e eficiente, comandado por segurança por um diretor estreante que faz valer sua experiência como coordenador de dublês ao criar sequências de luta movimentadas, tensas e muito bem coreografadas. E, quando tudo isso é centrado em uma protagonista que conquista facilmente o carinho do espectador, o espetáculo se torna ainda mais divertido.
“John Wick” (EUA, 2014), escrito por Derek Kolstad, dirigido por Chad Stahelski, com Keanu Reeves, Michael Nyqvist, Alfie Allen, Willem Dafoe, John Leguizano, Iam McShane e Adrianne Palicki