Um cinema com pouco dinheiro é sobretudo um cinema de intenções. Do Sul, A Vingança pode não ter dinheiro, mas tem tantas boas intenções que fazem valer cada real dos pouco menos de R$ 400 mil gastos para sua realização. Melhor ainda, é o primeiro filme “completamente realizado” no Mato Grosso do Sul e o estado só pode ter orgulho dessa realização.
Indo ainda mais longe e sem muito medo de exagerar, Do Sul, A Vingança se tivesse dinheiro suficiente estaria sendo perseguido nos cinemas como um daqueles filmes cults de começo de carreira de futuros grandes cineastas. Quase um Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes à brasileira.
A história não está tão próxima do “primo inglês”, mas está com ele nessa ideia de um emaranhado de personagens tropeçando entre si em uma história que parece maluca demais e que aos poucos vai se unindo até um final onde tudo se resolve com um punhado de balas e personagens declarando um monte de frases de efeito divertidas. Com uma falta de dinheiro que não atrapalha sua potência, Do Sul, A Vingança vai lá e faz o que deve ser feito.
Essa “consciência monetária” é uma arma do filme, já que ele compensa isso com muito humor e personagens que entendem as necessidades da produção. Uma mistura de risos com esse clima de violência que passa por Rio de Janeiro e vai até a famosa região da Fronteira do Mato Grosso do Sul com Paraguai e Bolívia, uma região famosa por um clima que deixaria os faroestes americanos com orgulho.
Do Sul começa com esse escritor, Lauriano (Felipe Lourenço) mergulhando de cabeça na região em busca de seu novo livro, uma história sobre o lendário criminoso Jacaré (Espedito Di Montebranco). O problema para chegar nele é desvendar esse folclore de criminalidade da região incluindo um monte de tipos divertidos como Febem (Bruno Moser), a advogada Dra. Lucia (Luciana Kreutzer) e a participação mais que especial do divertido e exagerado Coronel Massada, vivido pelo galã do cinema nacional, David Cardoso.

Todos exageros funcionam e quando você menos percebe está lidando com uma história que se leva a sério apenas o suficiente para construir uma trama, mas que se deixa levar pelas maluquices, armas apontadas para a tela e revólveres gigantes. É lógico que fica sempre a impressão de que um pouquinho mais de dinheiro deixaria tudo mais bonito, principalmente na fotografia e design de produção, mas, ainda assim, com tão pouco dinheiro, chegar em um resultado tão divertido e certeiro demonstra ainda mais o quanto Do Sul tem todas boas intenções no lugar.
Em certos momentos é como se o diretor Fábio Flecha fosse buscar soluções no mesmo lugar que gente como Robert Rodrigues buscou, como lá em seu primeiro El Mariachi, onde a violência meio “non sense” faz com que o espectador compre a ideia. Como a banda de rock sacando as armas no meio do show ou a apresentação exagerada dos pistoleiros ainda mais caricatos.
O roteiro sabe disso e valoriza esses momentos com diálogos que funcionam tão bem que fazem até com que as cenas que poderiam ser mais precárias ganhem força graças às ótimas ideias que movem esses embates entre os personagens, cheios de maneirismos que demonstram o quanto o filme representa aquele lugar e se permitem dar risada dos “preconceito geográficos” contra eles próprios e também, principalmente, cariocas e paulistas.
Do Sul, A Vingança é um filme de gênero puramente brasileiro. Mais precisamente do Mato Grosso, mas não um “Mato Grosso qualquer”, o “DO SUL”! E isso faz dele um daqueles momentos do cinema onde a gente percebe o quanto a Sétima Arte consegue sobrepujar os problemas orçamentários para alcançar sua maestria e demonstrar o amor desses realizadores pelo cinema. Um presente para quem gosta de cinema, mas mais do que isso, ama um cinema com cara de Brasil e essa capacidade nacional de ter “vários cinemas” dentro de um só. Independente do dinheiro que tenha a seu dispor.
“Do Sul, A Vingança” (Bra, 2025); escrito e dirigido por Fábio Flecha; com Felipe Lourenço, Espedito Di Montebranco, Bruna Moser, Luciana Kreutzer, Victor Samudio e David Cardoso.
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Amei sua análise! Muito obrigado!