Um homem cansado de sofrer com sua doença aceita seu destino e parte para o mar. Uma mulher acuada diante das circunstâncias tenta fugir do destino. Quando um policial entra na história o que está flutuando em águas calmas vai aos poucos se agitando, conforme a tempestade vem chegando. El Pampero, ou “O Mimo”, é o encontro tenso e dramático em uma paisagem entre duas fronteiras (Argentina e Uruguai), e onde as regras são frouxas o suficiente para questionarmos se tudo aquilo não é uma metáfora para a vida.
Talvez não seja. Dirigido por Matías Lucchesi e escrito por ele e Gonzalo Salaya, El Pampero utiliza pouquíssimos elementos, como as figuras já citadas da doença e da mulher misteriosa, além do policial mau-caráter, e os repete para tentar extrair daí um relacionamento que vai se formando por compaixão e um certo companheirismo universal quando encontramos pessoas que precisam de ajuda.
Claro que o filme é sobre todo esse desenvolvimento, o que quer dizer que assisti-lo irá se tornar uma atividade muitas vezes enfadonha se você está em busca de algo mais agitado. Há poucos diálogos, e eles sequer são necessários, já que os olhares e os movimentos dentro de um barco são suficientes para entendermos o que está acontecendo (ou ao menos desconfiar).
Julio Chávez faz Fernando, um homem que toma remédios constantemente mas não consegue afastar a dor do seu corpo que anuncia seus últimos dias. Sua atuação é ritmada, lenta, compassada. Sentimos a dificuldade até do sujeito respirar para conseguirmos assim imaginar como deve ser difícil para ele ir buscar dois galões da água. Sua decisão de guardar sua bússola em uma caixa e partir para o mar, deixando as mensagens do filho na secretária eletrônica (alguém ainda tem isso?) não-respondidas é de um simbolismo tocante, mas nunca dramatizado para fazer chorar. É um fato, simplesmente.
Já Pilar Gamboa como a misteriosa Carla é também puro realismo. Ela se sente acuada e tenta analisar qual a melhor saída. Entre dois homens no meio do nada, ela precisa decidir astutamente onde conseguir apoio, e estando do lado de uma pessoa seriamente debilitada por uma doença desconhecida não facilita para ela.
E César Troncoso (Elis) faz Marcos, a parte mais caricata da história, e a mais simbólica: quando uma autoridade (surpresa!) se acha no direito de mandar nas pessoas. Policial de fronteira, se espanta quando o amigo deixa de cumprir o ritual de passar um tempo com ele, quando logo vemos pelos olhares de Fernando que Marcos é menos seu amigo do que uma passagem obrigatória para seguir em paz. São os diálogos entre Marcos e Fernando os mais tensos, e são eles que conseguem dinamizar um pouco a narrativa.
Porém, perdido em mesmices, El Pampero nunca de fato consegue dizer a que veio, ou se mostra decepcionante quando revela seu clímax. Sacrificando a sutileza mostrada até agora, com a câmera balançando no ritmo de um barco praticamente inerte e um ambiente fechado e claustrofóbico (seja dentro do barco ou em meio a um estreito rio cercado de árvores), o filme não sabe dosar com propriedade sutilezas e exageros, preferindo se manter como o bom e velho thriller que estamos acostumados a ver, com uma simples história, um simples objetivo e uma simples conclusão.
Não que isso seja ruim. É simplesmente mais do mesmo embalado em uma história simples demais para ser parte de um longa.
“El Pampero” (Arg/Fra/Uru, 2017), escrito por Matías Lucchesi, Gonzalo Salaya, dirigido por Matías Lucchesi, com Julio Chávez, Pilar Gamboa, César Troncoso