O mundo é feito de escolhas. O cinema também, de cada linha do roteiro, até a posição dos atores em cena e a ordem dos planos sendo cortados na montagem. Tudo escolhas. Escolha ou Morra, novo terror da Netflix, também é sobre escolhas. Assisti-lo também é uma escolha.
Talvez você deva ver. Principalmente se gosta de filmes de terror, mas viu poucos, porque quem viu muitos, vai achar que Escolha ou Morra tem um pouco de tanta coisa que nem percebe direito onde quer chegar. E não chega enquanto fica no meio de um caminho entre O Chamado, Corrente do Mal e um monte de “body horrors” genéricos.
O começo é uma boa escolha de ideias do roteiro de Simon Allen, Matthew James Wilkinson e Toby Meakins, o último também dirige o filme. Mas falta entender a razão de precisar de tanta gente para chegar em um filme que só tem uma ideia boa e o resto é desastroso. Mas realmente a ideia inicial é boa.
Um jogo de computador que parece um daqueles RPGs de texto (se você é velho o suficiente, sabe do que eu estou falando!) onde o jogador acaba descobrindo que a fantasia dele invade a realidade e começa a mandar ele fazer escolhas violentas e aterrorizadoras. A trama é contemporânea, então falar de “RPG de Texto” no computador pode parecer algo velho e ultrapassado, mas Kayla e Isaac (Iola Evans e Asa Butterfield) são dois jovens sem grana que trabalham com consertos de computadores e equipamentos velhos (ou vintage).
OK, isso parece forçado, mas tudo bem, é um filme de terror meio vagabundo que pede pouco de seus espectadores, então é possível relevar alguns tropeços. Isso porque a dupla descobre que quem “fechar” (os velhos entenderão) o jogo, irá ganhar uma centena de milhares de dólares. Isso porque quem passa esse recado por telefone em uma “hotline” é o próprio Robert “Freddy Kruger” Englund. E isso não tem nada a ver com o filme. Mas siga em frente.
O terror do filme está nas escolhas, que quase sempre envolvem alguém sofrer alguma maldade que pode ser fatal, ou alguém diferente sofrer alguma maldade que pode ser fatal. Em alguns casos, as opções pode ser morrer de um jeito ou morrer de outro. Enfim, nem um padrão o filme segue. Cada fase pode ser uma surpresa e não existe possibilidade de torcer pelos personagens, já que não faz sentido qualquer caminho que o filme toma. Isso poderia ser divertido e inesperado, mas é só uma bobagem.
O trabalho do diretor Toby Meakins é esforçado, as cenas de terror são boas, mesmo vazias. O gore é visual e deixa sempre aquela aflição e uma vontade de desviar o olhar, mas Meakins permanece firme em respeito aos fãs do gênero. Mas o filme chega em um lugar que talvez seja uma escolha das piores que ele poderia tomar.
É difícil entender qual a intenção do terceiro ato. Talvez até seja legal entender o funcionamento sobrenatural do jogo, mas a decisão final de criar uma luta final que parece confortável demais com a ideia da violência auto infligida ser uma solução para algo. Por mais que esse confrontamento possa soar como uma metáfora para algum tipo de luta interna, o resultado final na tela é só algo exposto e a impressão de a ideia de provocar a violência em si mesmo pode ser uma solução. Não deveria. Mais ainda, os cineastas precisariam ter cuidado com ideias do tipo.
De qualquer jeito, a solução é de mal gosto e ainda acaba pulando para outro lugar, um de vingança e amargor. Falta responsabilidade para entender o material que tem em mãos. Ou talvez seja apenas alguns atalhos morais que deveriam ser melhor discutidos, do contrário, nem deveriam ser colocados no filme. E isso foi uma escolha.
De escolha em escolha, o filme vai seguindo por um caminho que não chega em lugar nenhum minimamente interessante. Um lugar até meio óbvio e que só surpreende por escolher a pior das soluções. Assistir Escolha ou Morra é uma escolha, talvez uma escolha ruim, mas quem garante que essas escolhas são sempre boas?
“Choose or Die” (EUA, 2022); escrito por Simon Allen, Toby Meakins e Matthew James Wikinson; escrito por Toby Meakins; com Iola Evans, Asa Butterfield, Robert Englund, Angela Griffin e Eddie Marsan.