Talvez o nome original de Estrelas Além do Tempo, “Hidden Figures” (“Figuras Escondidas”) não faça jus à realidade, já que o mesmo acaba comentando o monte de homenagens, placas e nomes em prédios que as três protagonistas colecionaram durante suas carreiras. “Figuras Esquecidas” muito provavelmente coubesse melhor.
E esse esquecimento é tanto de uma sociedade inteira, como da própria indústria do cinema, que já poderia ter contado essa história antes. Por sorte Estrelas Além do Tempo vem junto de uma movimento onde Hollywood tenta exorcizar a história recente do país. Histórias Cruzadas tentou fazer isso e até Um Estado de Liberdad esbarra nisso, mas o importante é mostrar o quanto há tão pouco tempo os Estados Unidos e a segregação racial conviviam “tão bem”.
Mas de modo muito menos melodramático que os dois citados, Estrelas Além do Tempo se fecha em um ambiente e tenta contar uma história que atinge um público mais amplo (e mais branco). Sem também tentar ser tão denso como Selma, a ideia aqui é mostrar os corredores de uma dos maiores orgulhos do país, a NASA.
O roteiro escrito por Allison Schroeder e Theodore Melfi (que também dirigiu), à partir de um livro de Margot Lee Shetterly, mostra essas três mulheres negras (vividas por Taraji P. Henson, Octavia Spencer e a cantora Janelle Monáe) que trabalham com uma espécie de calculadoras humanas da Agência Espacial dos Estados Unidos. E como você pode muito bem esperar, cada uma delas cumprirá um papel importante nessa corrida espacial que colocou o primeiro astronauta yankee no espaço e em volta da Terra.
E só por isso o filme já seria suficientemente interessante para chamar a atenção, já que são várias histórias deliciosas que rodeiam o trio e mostram o esforço delas para vencer dentro de uma sociedade racista e machista. E para o bem dele mesmo (do filme), parece desviar o olhar da violência racial que se intensificava fora dos muros da NASA, como se estivesse apenas interessado no que acontece dentro dela.
Diferentemente de Histórias Cruzadas que tinha pretensões mais profundas para discutir o racismo, mas preferia olhar para o outro lado, Estrelas Além do Tempo é quase uma diversão escapista que tem a sensibilidade de discutir um problema social enquanto ele caminha com sua trama. Melfi então simplesmente não parece preocupado em se estender muito com o que acontece nas casas dessas três mulheres, não tenta forçar uma simpatia através da fragilidade delas, muito pelo contrário até, é a força delas que mais segura o filme.
E o espectador se percebe mais interessado nisso mesmo, na NASA e no como aos poucos essas segregação racial vai se derrubando em busca de um bem comum. Sim, para quem movia as peças, raça ou gênero não importavam muito desde que a “Mãe Russia” fosse vencida.
Essa tolerância toda fica à cargo do personagem de Kevin Costner, enquanto Jim Parson e Kirsten Dunst, não deixam ninguém esquecer da questão racial. Costner vem no piloto automático e Parson se mostra fraquinho e comum quando está fora de seu personagem em The Big Bang Theory, enquanto do lado das protagonistas, Henson (que é a protagonista propriamente dita) se deixa ser afetada e exagerada demais, com Monae se mostrando uma ótima surpresa. Todos orbitando os bons trabalhos de Spencer e Dunst, com destaque para a segunda que se leva por um sutileza incrível na hora de construir essa megera racista que não parece nem ao menos achar que está fazendo algo muito errado. Infelizmente Dunst vai acabar sendo ignorada pela presença de Spencer, que nunca esteva tão na moda como nos dias de hoje e acaba sempre supervalorizada.
Já Melfi por trás das câmeras não peca pelo exagero e parece só apontar sua câmera para o elenco enquanto termina por não ter nenhuma cena ou sequência a ser lembrada, ainda mais, pois sabe que o principal interesse de seu público é acompanhar as pequenas realizações de suas protagonistas e as curiosidades que rodeiam essas pequenas histórias. Por outro lado, o que o diretor parece buscar mesmo é a oportunidade de glorificar essas mulheres negras, como quando acompanha elas andando pelos corredores da NASA de modo vitorioso.
E nisso, nessa vontade de ser o filme “baseada em fatos reais de um Estados Unidos racista” do momento, ele é infalível. Tanto por mostrar o preconceito, quanto pela velha história do “underdog” que Hollywood tanto ama, ainda mais quando o derrotado no final é a boa e velha União Soviética durante a Guerra Fria. Enfim, Estrelas Além do Tempo tem tudo aquilo que todo mundo quer.
“Hidden Figures” (EUA, 2016), escrito por Allison Schroeder e Theodore Melfi, à partir do livro de Margot Lee Shetterly, dirigido por Theodore Melfi, com Taraji P. Henson, Octavia Spencer, Janelle Monae, Kevin Costner, Kirsten Dunst, Jim parsons e Mahershala Ali