Excelentíssimos Filme

Excelentíssimos | Uma casa de cartas prestes a cair


[dropcap]N[/dropcap]ão sou uma pessoa chegada a política, mas curto assistir House of Cards. Todo esse emaranhado de poder materializado em homens engravatados munidos de retórica e troca de influências em um verdadeiro circo imoral de personagens temporários me fascina pela exatidão com que essa barbárie sofisticada é desmistificada na fala, no grito e na “lei”. Excelentíssimos, documentário/colagem do diretor Douglas Duarte, consegue nos fornecer exatamente isso a respeito de um evento marcante do Brasil recente que transformou completamente a visão que o brasileiro médio tinha da já tão surrada democracia que vivemos.

Iniciando o longa (bem longa, duas horas e meia) vemos a última aparição pública da ex-presidente Dilma Rousseff, se despedindo após deixar permanentemente o cargo ao ser deposta através de um processo de impeachment. É esse processo o alvo de Douglas Duarte, e para isso ele reconstrói as circunstâncias desde o início da maior investigação sobre corrupção da história do país, a operação Lava Jato, até a votação e os resultados pós-votação da retirada do poder de um representante eleito. O formato de apresentação dos fatos é importante, porque faz surgir um debate mais ou menos sério a respeito do processo previsto na Constituição: ele poderia ser considerado uma forma de golpe de Estado?

Para averiguar isso Duarte realiza montagens de diferentes fontes – TVs, vídeos caseiros, entrevistas que ele conduziu, gravações telefônicas – para se mostrar o mais imparcial possível. É importante em um caso desses tentar ser imparcial – por mais impossível que seja – para que o equilíbrio de forças permaneça durante todo o filme e seja o fio condutor de uma narrativa tensa que nos faz pensar durante toda sua duração.

E Excelentíssimos está, sem dúvida, colocando o espectador para pensar, pois ele não entrega tudo de bandeja. Ele nos deixa, assim como em House of Cards, saber até um limite os acontecimentos, para depois nós mesmos montarmos em nossas cabeças as teorias por trás do que foi visto.

Excelentíssimos Crítica

Por exemplo, ele constrói a narrativa da esquerda (ou o governo de situação) de que os partidos de oposição estavam duramente empenhados em tomar as rédeas do governo federal nas eleições de 2014, custe o que custar. Foi uma eleição acirrada onde Dilma foi reeleita com uma porcentagem mínima de vantagem. Logo em seguida começa a surgir a ideia de impeachment com o uso das famigeradas pedaladas fiscais que a presidente cometeu durante o primeiro mandato e ao estancar a ferida orçamentária meses antes das eleições. Isso é fato. Porém, é um fato contundente em um processo de impedimento de um governante eleito democraticamente? Esse é basicamente o debate que se segue de ambos os lados conforme as peças do xadrez político vão se movendo de vários lados.

Para quem gosta de novela, ou se interessa pelo que acontece em Brasília, Excelentíssimos é uma ótima pedida, pois cria relevância em sua trama através de uma edição cirúrgica que nos entrega a arquitetura de um ataque ao poder e suas consequências, como o surgimento de representantes do povo mais extremos, como Jair Bolsonaro, surgido da bancada evangélica, conservadora, e que, profeticamente, se torna o presidente nas eleições de 2018, e embora o autor do documentário não tivesse como saber disso ao fim das filmagens, esboça essa pontinha do futuro muito bem para o brasileiro comum, mas muito mal para quem vem de fora e não entende o surgimento no filme dessa figura seguido de gritos de “mito” por alguns cidadãos do lado de fora.

É preciso contextualizar para os leigos, e isso o diretor, compenetrado já no processo, se esquece de se atentar.


Excelentíssimos (Bra, 2018), dirigido por Douglas Duarte

Trailer do Filme – Excelentíssimos

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