Furiosa: Uma Saga Mad Max | Um épico de vingança e asfalto

É possível que Furiosa: Uma Saga Mad Max se torne um dos filmes do ano, ou da década, que seja lembrado por todo sempre? Não sabemos. Na verdade, isso só o tempo dirá, mas é impossível cravar isso com a mesma certeza de quem o fez quando saiu de Mad Max: Estrada da Fúria. Esse pessoal não estava só empolgado, estava certo. Mas George Miller parece estar além dessa discussão. Como já estava algumas décadas atrás.

Ainda que uma certa memória emocional coloque o segundo Mad Max em um lugar muito maior do que ele realmente está, a ideia é a mesma. George Miller mudou os rumos do cinema com Mel Gibson e o primeiro filme, o nascimento dessa “Wasteland”, um lugar que se tornou um apocalipse de poeira e estradas depois que tudo deu errado. A história é sobre o Max do título em uma espécie de conto sobre vingança. É o sucesso dessa visão que o coloca na direção desse mundo.

É como se depois desse pequeno conto Miller sempre tivesse essa necessidade, essa vontade, de expandir aquilo que só arranhou. Agora tudo se repete. Depois de acompanhar Max sendo usado como bolsa de sangue antes de vê-lo ajudar Furiosa a criar seu próprio “novo lar”, agora é hora de dar uns passos para trás e conhecer o que tem por trás dessa história.

Portanto, não se enganem, do mesmo jeito que o segundo filme não tem nada a ver com o primeiro, Furiosa não é um filhote de Estrada da Fúria. Pelo contrário até. Furiosa é quase um drama épico no sentido mais clássico possível. Poderia estar se passando sobre sandálias romanas, espadas de samurais ou até a poeira do velho oeste, mas está lá, no mundo pós-apocalíptico dessa Austrália. Que junto tudo isso e mais um pouco, é verdade, mas faz isso para ter uma personalidade incrível em cada pedacinho desse lugar.

Immortan Joe e seus War Boys estão dispostos a irem para o Valhalla. O novo vilão, Dementus (Chris Hemsworth) anda pelo deserto com uma biga de motos e tenta convencer os oprimidos com o mesmo discurso de Gengis Khan. Esse monte de referências se misturam com essa espécie de tribo de Amazonas que vivem em um lugar de abundância no meio do deserto, um lugar onde pegar uma fruta a mais coloca a pequena Furiosa em perigo.

Furiosa é a oportunidade de Miller expandir a visão sobre esse mundo. De Gastown até a Fazendo da Bala, da Cidadela, até a Wasteland em si. Enfim, tudo está lá enquanto Furiosa (Anya Taylor-Joy) é mantida refém por Dementus antes de ser “vendida” para Immortan Joe para ser uma de suas esposas, mas que acaba se tornando uma das motoristas do War Lord antes de cruzar o caminho de Max.

Furiosa é então sobre esse arco de vingança. Sobre essa pequena menina que vai sobrevivendo com dois objetivos em mente: Voltar para a casa e se vingar de Dementus. Miller apenas coloca todas suas ferramentas visuais e narrativas à disposição dessa ideia. E como são muitas, o resultado é um espetáculo grandioso e tão cheio de criações e possibilidades que hipnotiza qualquer um. A câmera de Miller continua passeando por esse mundo como se não tivesse eixo. A caracterização de tudo ainda soa como nova e com mais detalhes. Sua história é objetiva e poderosa em cada solução.

Em resumo, tudo funciona.

E fica melhor ainda quando decide colocar seus personagens e antagonistas batalhando por suas sobrevivências sobre as rodas de carros, motos, caminhões e troços que voam. Cada batalha e cena de ação nessas estradas é como um espetáculo visual, acelerado, tenso e desesperador, como se o asfalto e as explosões fossem o único destino possível.

Falando em “destino”, Furiosa constrói seu destino à duras penas. Mais do que uma vingança, quase como se o ódio por Dementus aos poucos fosse se tornando uma mistura de senso de justiça, ódio e uma pontinha de esperança, que é o que a move no filme anterior. Seu embate com Dementus é de uma poesia que extrapola absolutamente qualquer outro momento da saga de George Miller. É como se a personagem sentisse que não é ninguém sem aquela ódio, que precisa daquela raiva para sentir que é possível ter de volta tudo aquilo que perdeu. Não só sua infância, mas praticamente sua humanidade.

Dementus não está em um lugar de vilanismo simples, mas sim colocado em uma posição de sadismo e espetáculo que confronta Furiosa como se aquilo fosse mais que uma vingança ou um pedaço da história. Chris Hemsworth explora essas possibilidades até seu máximo, não só com a prótese no nariz, mas com uma construção que excede a excentricidade de Immortan Joe para chegar em uma espécie de show de um homem só, mas com uma crueldade e uma impressão de que ele pode continuar sendo um rei louco qualquer enquanto seus súditos são apenas um detalhe.

Do outro lado, a Furiosa de Anya Taylor-Joe está em um lugar que é uma mistura do pistoleiro solitário à la o próprio Max, com uma fúria que a coloca em um lugar de emoções. Tem a precisão e o silêncio do western, mas a vivacidade e a potência de alguém movida por sua paixão pela própria vida e pela vingança. Furiosa respira essa vingança e passará por cima de qualquer coisa para chegar nela, a atriz entende perfeitamente bem tudo isso e cria essa mulher que fica entre a força e a fragilidade, mas com a raiva e o poder de uma bala. E a velocidade de um V8 gritando no deserto.

Tudo em Furiosa se completa entre essa história e o que vem em Estrada da Fúria, como se fosse uma coisa só. Ou como George Miller gosta de dizer, mais um conto, quase fábula, dentro desse mundo onde tudo se transformou em algo além daquilo que o ser humano estava acostumado a entender. Uma mistura de séculos de referências e ideias que culminaram em um mundo movido a gasolina, fúria, sobrevivência, poeira e vingança. Onde o ser humano se deixou levar pela possibilidade de se tornar quase mitológico. Furiosa e Max são como heróis dessa mitologia, movidos por seus destinos, mas mais do que isso, enfrentando esses monstros que se enxergam como deuses.

O interesse de George Miller está nesse lugar onde tudo para de fazer sentido e todos são cooptados por uma espécie de loucura. Acelerados como se estivessem fora do ritmo normal das coisas, mas sobre tudo isso, sobreviventes. E talvez Miller seja um sobrevivente também nesse cinema onde ser clássico e excêntrico provoca sensações de amor e ódio tudo na mesma marcha. Mas acreditem, Furiosa não será esquecido tão rapidamente como o peso do pé no acelerador, será lembrado como uma vingança lenta e espetacular. Afinal, Miller parece não saber fazer nada que não seja um espetáculo, até quando erra (e já o fez duas vezes com o próprio Max!), algo que, com certeza, não é o caso de Furiosa.


“Furiosa: A Mad Max Saga” (Aust/EUA, 2024); escrito por George Miller e Nick Lathouris; dirigido por George Miller; com Anya Taylor-Joy, Chris Hemsworth, Tom Burke, Alyla Browne, George Shevtsov, Lachy Hulme, John Howard, Angus Sampson, Elsa Pataky, Nathan Jones e Josh Helman.


Trailer do Filme – Furiosa: Uma Saga Mad Max

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