[dropcap]O[/dropcap] maior problema da cultura pop atualmente é seu público e as expectativas. Han Solo – Uma História Star Wars é a vítima da vez dessa combinação que vem esmagando filme pelo puro prazer de poder reclamar nas redes sociais.
Existe pouco em Han Solo que possa ser considerado um problema que o faça destoar da enorme quantidade de filmes do gênero (aventura) lançada em qualquer país e em qualquer período do cinema. Mas falar que Han Solo é uma porcaria se tornou um hobby de quem criou uma expectativa que não foi realizada. Na verdade, uma expectativa que nem poderia ser realizada.
Han Solo é um filme que acontece entre os Episódios III e IV da saga Star Wars, vem de lugar nenhum e não tem como chegar em lugar algum. É apenas “uma história Star Wars”. Um “prequel” que tenta contar a história do piloto da Millenniun Falcon antes de encontrar com Luke Skywalker em um bar em Tatooine. Simples, só isso. Sem pretensão nenhuma de ser maior do que essas quatro linhas.
Não rouba os planos da estrela da morte e “vira o jogo” como em Rogue One, a diversão aqui é só acompanhar a maior quantidade de referências possíveis. O objetivo é única e exclusivamente montar esse mosaico que é Han Solo. Quase como um presente para os fãs (de verdade), que só querem passar mais umas horas com seu personagem preferido.
No filme, Solo (Alden Ehrenreich), ainda jovem, foge de um planeta comandado por uma criminosa e seu bando de asseclas em meio a fábricas de naves. Solo deixa para trás seu grande amor, Qi´ra (Emilia Clarke) e parte em busca de um jeito de conseguir uma nave e voltar para lá e busca-la. Mas seu destino cruza com uma equipe de contrabandistas liderada por Beckett (Woody Harrelson) e eles são obrigados a armar um grande roubo como dívida a um “warlord”, Dryden Vox (Paul Bettany).
É lógico que nesse meio, assim como Solo encontra Qi´ra, também vai se cercando de situações, personagens e naves que os fãs já conhecem. Do jeito que qualquer um iria adorar… se não fossem uns chato.
Ehrenreich não é Harrisson Ford, e isso não importa nada. O Han Solo que todos aprenderam a amar não é um ator, é uma ideia. Um estereotipo que se repete em toda cultura desde sabe-se lá quando. Pense na quantidade de vezes que o protagonista encontrou seu “novo melhor amigo” em um bar onde ele mostrou a todos o quanto é bacana e perigoso. Pensa na penca de anti-heróis que são muito mais corajosos que o protagonistas, mas essa coragem vem com um canalhice charmosa e um passado ambíguo.
Se não existe um desenvolvimento do personagem, é porque ele já lhe foi apresentado, o que os roteiristas Jonathan e Lawrence Kasdan querem agora (junto com a Disney e a Lucasfilms) é contar uma história. Simples assim. Sem que ela nasça ou morra dentro do novelão da família Skywalker.
E fazer isso de modo bem feito é o mínimo que se poderia querer. Ron Howard (que herdou o filme da dupla Phil Lord e Chris Miller, depois que foram despedidos) está talvez em um de seus trabalhos estéticos mais interessante, que sai da mesmice preguiçosa de ligar a câmera e observar Robert Langdon correndo por ai e chega mais perto de seu trabalho em Rush. Mais cheio de personalidade e com material visual para encher a tela.
Suas cenas de ação são empolgantes, seus enquadramentos são claros e seu elenco funciona. Tudo isso aliado a um roteiro que, se não tem soluções incríveis (tudo bem a volta de Qi´ra tem cheiro de deus-ex-machina), pelo menos tem diálogos que funcionam e consegue enfiar goela abaixo praticamente todas as referências que o personagem criou em quatro filmes que participou.
E se isso é pouco para você, que queria Star Wars Episódio 3.5, a culpa não é de Ron Howard e nem de nenhum roteirista. A culpa é sua, que cria uma expectativa de algo que você não tem controle e fica chateado por vê-la se cumprir. Um problema que já afetou o oitavo episódio e deve ainda atrapalhar todo material da franquia que não se encaixar nessa expectativa.
Talvez falte humildade para entender que Han Solo é apenas “uma história Star Wars”. Não uma história que quer mudar o universo ou deixar um legado (o legado do personagem você já conhece), apenas uma história. E nesse caso, uma história divertida, bem feita, com personagens interessantes e algumas boas reviravoltas. Tudo isso muito bem dirigido por um dos grandes cineastas de sua geração. Querer mais do que isso de uma história despretensiosas que foi pensada só para os fãs se esbaldarem com as referências é querer um pouco mais do que “Han Solo” sequer pensa em ser.
“Solo: A Star Wars Story” (EUA, 2018), escrito por Jonathan Kasdan e Lawrence Kasdan, dirigido por Ron Howard, com Alden Ehrenreich, Joonas Suotamo, Woody Harrelson, Emilia Clarke, Donald Glover, Thandie Newton e Paul Bettany.