[dropcap]O[/dropcap] mais difícil da série Harry Potter, enquanto filme, talvez seja uma necessidade de se reinventar a cada episódio para, somente em seu fim, fazer o espectador olhar para trás e dar de cara com uma grande história que se separasse por oito filmes (o livro final ganhara dois episódios), e nisso, diante desse sexto, o que se pode achar é que, até agora, tudo vai rumando conforme ordenado.
Harry Potter e O Enigma do Príncipe tem talvez a mais ingrata das tarefas, maior até que a do primeiro, que teve que apresentar esse universo para a platéia. O Enigma… vem logo depois da Ordem da Fenix, com certeza o melhor de toda série, e isso vem a ser seu maior inimigo, o filme de 2007, contava com várias unanimidades ao seu favor, o de hoje, não parece se repetir, mas tampouco deixa um aquele frescor sobreviver mais uma vez. David Yates volta mais uma vez para a cadeira de diretor, e novamente faz um trabalho consistente, já parecendo deixar sua marca visual na série, principalmente por ainda tratar o extraordinário como algo corriqueiro, deixando as imagens falarem por si só, como se apontasse sua câmera para a história e deixasse se levar a sério, como tudo o mais a sua volta. Yates trata o espectador como o adulto que já se tornou, na verdade, algo mais como um pós-adolescente, que cresceu lendo os livros de J. K. Rowling e não está mais a procura de um produto infantilizado.
O que parece não deixar seu filme decolar como anterior, parece ser a ausência de Michael Goldenberg como roteirista, dando lugar para a volta de Steve Kloves, que escreveu todos os outros. É nesse momento que Goldenberg dá a pinta de ter sido um dos grandes responsáveis pelo filme anterior ter sido tão acertado, Kloves parece não conseguir carregar a trama como seu antecessor, deixando-a por vezes truncada e episódica demais. Por mais que consiga ligar tudo, sem deixar nada fora da linha narrativa principal, ainda assim dá a impressão de uma intercalação de sub-tramas excessiva, como se o filme tivesse que fazer alguns intervalos para mostrar certos personagens e depois correr de volta atrás da história.
Kloves peca ainda em criar uma história quase didática, que precisa explicar demais o que está acontecendo e o que vai acontecer, resultando assim em sequencias repetitivas em sem muito importância dentro da trama, mastigando tudo, muito mais que o anterior e assim perdendo em drama e suspense, já que, por vezes os personagens predizem o que vão fazer e, por outras, até desmancham uma ou outra reviravolta, como se contassem com o único intuito de fazer um filme que se torne mais fácil para o espectador digerir.
Talvez ainda mais, por não contar com uma história tão interessante, principalmente por se localizar no ingrato lugar de penúltimo, que não pode apresentar mais muita coisa, e muito menos finalizar nada, paralisada diante de todo resto, O Enigma do Príncipe precisa simplesmente ser uma grande preparação para um final com cara de apoteótico. Aqui, a escola de bruxos já não é mais tão segura, e parece se preparar para uma investida maciça de Valdemort e seus Convençais da Morte, por outro lado, Harry Potter já convive, mais que claramente, com seu destino de escolhido, e, ainda parece já encarar bem melhor esse seu lado heroico. O Enigma do Príncipe serve principalmente para colocar sobre o tabuleiro de xadrez, cada peça que será usada durante os dois últimos filmes.
Essa linha principal frágil, permite mais ainda que os coadjuvantes de Harry ganhem um maior espaço, principalmente diante de uma escola de magos na flor da adolescência e com seus hormônios vazando por seus poros, definitivamente fazendo o filme ganhar em simpatia. E são nesses momentos que o roteiro acerta, se mostrando enxuto e, por que não, quase sistemático, em sua estrutura, ligando tudo de um jeito crível porém com pouca sutileza.
Por fim, mesmo que, de cara, a ótima combinação da direção de arte detalhista com a fotografia, criando um visual fantástico, marcante e extremamente comprometido com a narrativa, Harry Potter e o Enigma do Príncipe, ainda se sobressai por fazer parte de um todo, por não tentar fazer nada que já tenha sido feito, não se escorar em absolutamente nenhuma fórmula e saber que está fazendo aquilo que pode dentro de suas limitações. Não tenta ser o melhor, nem ter as melhores sequencias, mas com certeza segura o espectador, criando ótimas expectativas pelo fim da saga desse bruxinho que, ainda tem muito gente para conquistar.
Harry Potter and the Half Blood Prince (EUA/GB, 2009), escrito por Steve Kloves, dirigido por David Yates, com Daniel Radcliff, Michael Gambon, Jim Broadban, Rubert Grint, Emma Watson, Helena Bohan Carter e Alan Rickman