Inimigos Íntimos | Real e novo mesmo dentro dos clichês do gênero


[dropcap]É[/dropcap] fácil soar pedante quando você dá de cara com algum filme de gênero que sai do circuito de Hollywood e mostra o quanto é possível ser novo, mesmo dentro de todos clichês. Soa até como “anti-americanismo” e outras baboseiras. Mas a culpa não é nossa, mas sim de filmes como Inimigos íntimos.

O filme francês é escrito e dirigido por David Oelhoffen e tem uma sinopse que poderia estar na boca cheia de pipoca de qualquer fã de filme policial. Um policial e um criminoso que se juntam para investigar a morte de um amigo de infância em comum. Se é possível acreditar que uma história dessas em Hollywood se tornasse uma experiência frenética e cheia de balas, explosões e slow motion, o que se tem aqui é um filme humano, tenso e de sentimentos complexos.

Exatamente como o diretor Bong Joon Ho disse em seu discurso no Globo de Ouro, “assim que vocês vencerem a barreira das legendas, serão introduzidos e muitos mais filmes maravilhosos”. É lógico que isso não vale “na ponta do lápis” para o Brasil, já acostumado com as legendas, mas vale para lembrar muita gente de que o cinema não está só em Hollywood.

Quem se aventurar em experiências como “Inimigos Íntimos” vai, automaticamente, perceber o quanto os estereótipos podem ser muito melhor explorados. Aquela sensação de humanidade não com um diálogo inteligente, mas acompanhando um criminoso sobrevivendo a um atentado e não atirando por aí ou fugindo pelos becos, mas sim voltando para casa buscando um abraço do filho enquanto as lagrimas correm por sua face.

Oelhoffen aponta sua câmera para bem perto de seus atores, mas lhes dá espaço para respirar. Corre com eles enquanto eles não são “heróis de filmes de ação”, mas sim sobreviventes. Opções tensas, imediatas e que criam um filme visualmente dinâmico e interessante. O anti-climax de um suspense que não acaba em uma perseguição, mas sim em um monte de tiros frustrantes e desesperados, criando uma experiência nova para quem está acostumado com o desfile sensorial de seus companheiros do outro lado do Atlântico.

Em Inimigos Íntimos, a trama não está interessada no luxo, mas sim na humanidade. Olha de longe a Torre Eiffel em um horizonte entrecortado por prédios populares e ruas espremidas. Um labirinto onde não existe saída para seus personagens. A tragédia é inevitável, as opções de ambos esbarram em tantas barreiras morais que seria impossível permitir que isso tudo tenha um final feliz.

Mas ninguém está preocupado com o “final feliz”, mas sim com a experiência tensa, inteligente, emocional e poderosa. Mais do que tudo humana.

Do lado do elenco, o belga Matthias Schoenaerts já é conhecido em Hollywood, tendo participado de produções como Ferrugem e Osso, Operação Red Sparrow e A Garota Dinamarquesa. Aqui, parece entender seu personagem e não faz nunca dele uma caricatura do anti-herói, mas sim alguém que sabe suas opções e escolheu seu caminho, mas sem nunca deixar para trás tudo aquilo que ele acredita ser o mais correto.

A química dele com o outro protagonista, Reda Kateb, funciona bem, justamente, pela incrível qualidade do ator francês. Seu personagem é dolorido, sabe estar no limite da moralidade de sua profissão, mas entende o quanto isso é sua única opção. O peso de suas decisões cria esse personagem complexo e forte, um trabalho sutil e espetacular.

Inimigos Íntimos é então um daqueles exemplos de filmes de gênero que entende as possibilidades do terreno onde está pisando e não quer ser um manifesto contra o cinema americano preguiçoso e sem criatividade… ainda que suas qualidades acabem tendo esse efeito.


“Frères Ennemis” (Fra, 2018), escrito por Jeanne Aptekman e David Oelhoffen, dirigido por David Oelhoffen, com Mathias Schoenarts, Reda Kateb e Adel Bencherif.


Trailer do Filme – Inimigos Íntimos

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