O documentário Life, Animated conta a incrível história de Owen Suskind, diagnosticado como autista aos três anos de idade, incapaz de falar e de ações motoras minimamente coesas e que através dos filmes da Disney abriu um portal surpreendente de comunicação com o mundo externo. Apenas por esta premissa este filme vale cada segundo de nossa atenção.
E por quê? Simplesmente porque hoje o mundo enfrenta um desafio global aparentemente intransponível. Estamos cada vez mais conectados e paradoxalmente desconectados. A comunicação não é mais um desafio tecnológico, mas fundamentalmente humano. E conseguir trazer os autistas para mais perto de nossa tribo mundial está entre um dos objetivos mais nobres e úteis para a sociedade.
Owen é um caso a ser estudado, um exemplo de como a atenção e carinho de pessoas próximas aos autistas – no caso, os pais – conseguiu ser a diferença mínima que alterou profundamente seu futuro.
E isso, infelizmente, o documentário não torna um de seus pilares. Ele prefere o caminho fácil de uma história emocionante: deixe as pessoas falarem, se emocionarem. Use uma narrativa simplista, pavimentada de desenhos que ilustrem o que se passa pela cabeça de Owen. Com isso o filme se rebaixa ao seu nível, e não permite que haja nada mais na história que a pequena introdução que fiz. Essa introdução – autista usa Disney para se comunicar – é repetido à exaustão sem acrescentar nada mais. Acompanhamos Owen se formar no colégio, ir morar sozinho, dar um discurso na França e ser aplaudido copiosamente, e nada disso parece ser sequer comparável à grande conquista daquela família, que já havia perdido as esperanças quando Owen fez três anos de idade.
A narrativa conduzida pelo diretor Roger Ross Williams baseado em um livro escrito pelo pai de Owen parece nunca surpreender, sendo uma sucessão de pequenas reportagens televisivas esteticamente enfadonhas, burocráticas e repetitivas. Lá vem mais um desenho que irá mostrar o que Owen está pensando. Agora Owen está caminhando na praia com o irmão. Agora os pais vão contar mais um detalhe irrelevante e a mãe irá escorrer mais uma lágrima.
Sem qualquer paixão pelo projeto, os cineastas parecem andar à deriva e possuem menos senso crítico do que o próprio Owen aparentemente desenvolveu. Em certo momento há um revés inesperado na vida do jovem, que é tratado como um desastre pela família, uma calamidade, e que logo é racionalizado pelo próprio Owen. Não há drama na história exceto o forçado artificialmente pelo filme, que insiste em sua premissa por cansativos 90 minutos.
Certamente há algo a se aprender com os autistas. Isso já está claro para o mundo e Owen é um brilhante exemplo. Porém, não é se colocando em seu próprio nível histérico de enxergar a realidade ou superestimar suas capacidades que os objetivos de comunicação com essas pessoas especiais e dignas de cuidado serão alcançados. Certamente não com um filme que emula o pior na Disney: suas esquisitices assépticas e simplificadas de como a vida funciona.
Life, Animated” (EUA, 2016), escrito por Ron Suskind, dirigido por Roger Ross Williams, com Jonathan Freeman, Gilbert Gottfried, Alan Rosenblatt, Owen Suskind, Ron Suskind