Quem sabe um dia o cinema irá conseguir adaptar um jogo de vídeo game sem fazer com que isso se torne uma desgraça. Monster Hunter é apenas mais uma prova disso. Já em termos de ambições, o esforço do Paul W. S. Anderson para destruir mais uma franquia do games é bem eficiente.
Para quem não ligou o nome à pessoal, Anderson é o mesmo cara que criou uma expectativa enorme de quebrar essa maldição das adaptações de jogos com seu Resident Evil, mas quem acompanhou a série até mais do que a primeira metade do primeiro filme, sabe que ele preferiu rumar para um lugar bem esquisito, principalmente nas continuações. Mas se tudo der certo, Monster Hunter não vai sofrer desse problema e irá acabar por aqui mesmo.
A história da série de jogos, ao que tudo indica, mostra um “caçador de monstros” de um mundo de fantasia que… caça monstros. Os tais monstros são bem maiores que ele, então é preciso ir colecionando itens e melhorando a capacidade do personagem, até ele estar pronto. É óbvio que não é isso que acontece no filme.
Nele, primeiro você é apresentado para uma tripulação de caçadores que singram pelo deserto desse mundo fantástico. Os cabelos e roupas são meio ridículos, mas pelo menos chegam mais perto do visual original, o que deve ser legal para os fãs. Mas um desses “caçadores”, literalmente, já que o nome dele é Hunter (Tony Jaa), acaba caindo do navio. O filme então vai para outro lugar, acompanhar a equipe de soldados americanos em algum deserto qualquer e que acaba entrando em um portal e indo parar nesse lugar dos monstros. Em pouco tempo, apenas a líder dos soldados, Artemis (Milla Jovovich) continua viva… então é hora de caçar monstros.
Para a defesa do filme, a ideia está lá. Hunter e Artemis precisam juntar uns itens e derrotar uns “sub monstros” para conseguir dar fim em um monstrão que está rodeando a dupla em uma ilha de pedra no meio do deserto. A ideia é acabar com ele para poderem seguir até uma torre que brilha no horizonte e que deve ser o caminho de volta para a Terra.
O roteiro do próprio Anderson não está preocupado em nada além disso, tem um fiapo de mitologia que surge em certo momento, e até um gato cozinheiro antromórfico que dá em cima da protagonista enquanto o Ron Perlman surge mais uma vez com uma peruca ridícula. Mas como você já está no meio de toda essa bagunça, isso não chega a ser um problema tão grande.
No resto do tempo, Monster Hunter é só isso mesmo: humanos com armas estranhas enfrentando monstros gigantes e encontrando soluções criativas para saírem vencedores dessa briga. E se isso funciona no jogo, por que não funcionaria no cinema? Essa talvez seja a pergunta que todo realizador devia se fazer antes de adaptar um game para as telonas. Infelizmente, a maioria parece ignorar a resposta.
O grau de imersão de um vídeo-game é tão profundo que o jogador se refere ao personagem controlado como “eu”, algo que não ocorre no cinema, portanto, a repetição de ações dentro um formato jogável, apenas com poucas mudanças de uma situação para outro, é mais que suficiente para agradar os jogadores. Entretanto o cinema entrega uma imersão mais onipresente e distante, o espectador não está vivendo aquilo, mas sim sendo levado por aquela história para um mundo mágico onde aquilo faz sentido. O cinema é uma história em volta da fogueira, enquanto o videogame é uma brincadeira de pega-pega, que pode ser repetitiva, mas isso não atrapalha.
Monster Hunter, assim como diversas adaptações de games para o cinema, aposta em levar a experiência do jogo para o filme, não como uma pequena parte de uma história maior, mas sim como foco principal desse esforço. O que sobra em estilo e vontade estética de levar o filme para as telas, falta em uma trama que faça sentido ou que, pelo menos, tente existir.
Afinal, se as pessoas quisessem só ficar caçando monstrões sem uma história para escutar, talvez dessem preferência para pegar o joystick e jogar umas duas horas de Monster Hunter, com certeza irão se divertir bem mais do que aqui, no filme.
“Monster Hunter” (EUA, 2020); escrito e dirigido por Paul W.S. Anderson; com Milla Jovovich; Tony Jaa; Ron Perlman, T.I., Diego Boneta, Megan Good, Josh Helman e Jin Au-Yeung