O Bar | #006 | 666 Filmes de Terror


[dropcap]M[/dropcap]uitas vezes o terror não vem com monstros e criaturas paranormais, às vezes o terror vem junto do ser humano mesmo. O Bar, do espanhol Álex de la Iglesia é sobre seres humanos e de até onde eles podem chegar diante da vontade de sobreviver.

E Iglesia não faz isso de modo sutil, mas sim apela a um caminho surpreendente, violento, sujo e aterrorizante. O que são algumas das piores (na verdade, melhores) características que um filme de terror pode ter.

Sua câmera acompanha uma moça, Elena (Blanca Soarez) andando por uma rua em seu celular, mais preocupada com seu encontro às escuras com que qualquer outra coisa no mundo. Iglesia foca seus esforços nela e nesse primeiro encontro, o faz para fechar o filme com uma rima onde essa imagem é trocada por um farrapo humano que beira o invisível, talvez o mesmo estado que vivia o mendigo, Israel (Jaime Ordóñez).

Ambos acabam indo parar dentro de um bar com mais nove outras pessoas, e quando duas dessas saem do bar e são abatidas por um atirador de elite, o pânico na rua torna tudo ao redor deles vazio, e o desespero dentro do bar aos poucos vai transformando tudo em um filme de terror.

Um terceiro personagem ainda parece acometido por um vírus misterioso que faz com que a relação entre os sobreviventes se torne um jogo de incertezas e mentiras, todos com o âmbito único de sair vivo daquela situação. É óbvio que não sairão, sobra para Iglesia ir acompanhando a espiral de insanidade que constrói esse quadro de selvageria.

O diretor assina o roteiro com um parceiro de outros filmes, Jorge Guerricaechevarría (do maravilhoso O Dia da Besta), e ambos focam seus esforços em criar um clima alucinante, com diálogos rápidos e que, por pouco, não se amontoam em uma verborragia disforme. Mas essa talvez seja a intenção, afinal, aos poucos aquelas pessoas vão chegando a um limite que ultrapassa qualquer capacidade deles de encontrar uma saída lógica e minimamente coerente com tudo aquilo que acreditavam ser a visão de mundo que tinham.

Amizades de décadas se rompem diante da mínima possibilidade de um dos lados impedir o outro de ter mais chances, assim como preconceitos e desvios vão se libertando junto dessa falta de opções. A cada segundo que esse grupo passa sem entender o que está acontecendo fora daquele bar, mais camadas e camadas de suas personalidades vão se abrindo e desvendando o quão horrível eles são de verdade.

O Bar Crítica

O Bar faz isso com a naturalidade de um cineasta que sabe lidar com personagens à beira de suas capacidades, todos ali sabem que estão prestes a não terem controle por suas ações, então uma arma, por exemplo, se torna a diferença entre o certo e o errado. E são esses pequenos detalhes que empurram a trama para um final obviamente aterrorizante. Não em termos de uma reviravolta de informação, mas sim do como esses personagens se tornam animais enjaulados.

Bem verdade, pouco importa o que realmente está acontecendo fora daquele bar, é o que acontece dentro (e embaixo), que fará o espectador grudar na cadeira enquanto vai vendo essas pessoas se corroerem pelas suas próprias certezas e decisões.

Iglesia faz isso enquanto mascara o começo disso com um humor cínico que ao pouco se esvai e escorre por um ralo que pode significar, ou não, uma única chance desses personagens sobreviverem. Assim como, aos poucos, o ritmo frenético de cortes e diálogos vai se deixando levar para o peso de cenas muito maiores e momentos dolorosamente lentos, como quando um dos personagens tenta passar por um buraco muito menor que seu corpo.

E como é de se esperar, Iglesia entrega tudo isso com uma câmera que busca imagens que lutam pela possibilidade de serem exageradas e rebuscadas dentro de uma crueza que conversa com o cinismo de seus diálogos. Talvez O Bar extrapole o visual para que o espectador se sinta ainda mais refém da proximidade com estereótipos tão comuns à maioria das pessoas, tanto dentro quanto fora do cinema.

Diante dessa proximidade, o maior horror é tentar pensar em como cada um de nós iria reagir diante de um cenário tão desesperador quanto esse. O terror maior é ter que acabar o filme acompanhado o que sobrou daquela bela mulher, agora vagando pelas ruas sem as cores, luzes e beleza que escondem os verdadeiros seres-humanos.

Como se Iglesia soubesse que, para encontrar a verdadeira pessoa por baixo daqueles camadas e máscaras, o melhor caminho seja arrancar tudo com violência e sujeira suficiente para não deixar que aquela imagem linda nunca mais caiba nesse ser humano que descobriu sua verdadeira face. Uma face que só surge diante da vontade primitiva de sobreviver.

Confira os filmes da coluna 666 Filmes de Terror


“El Bar” (Esp/Arg, 2017), escrito por Álex de la Iglesia e Jorge Guerricaechevarría, dirigido por Álex de la Iglesia, com Blanca Suárez, Marios Casas, Carmen Machi, Secuno de la Rosa, Jaime Ordóñez, Terele Pávez, Joaquín Climent, Alejandro Awada e Jordi Aguilar.


Trailer do Filme – O Bar

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