Último filme com direção de Anna Muylaert, O Clube das Mulheres de Negócios é um filme protagonizado por mulheres que brinca com a inversão de papéis. Ele será um mistério para muita gente que quiser “decifrar” as mensagens por trás desse mundo paralelo onde as mulheres estão no poder mundial.
Apenas para tornar mais claro o universo do filme: diferente de várias distopias rolando soltas pelo cinema nos últimos anos, este filme não é uma delas. Se trata de fato de uma outra realidade onde as mulheres são o sexo forte e os homens são meros joguetes, cuja existência dos mais feios é tolerada, e a dos mais bonitinhos autojustificável. Imagine o Brasil dominado por mulheres por gerações e você verá uma idealização por trás dessa sociedade alternativa.
A direção de Muylaert continua uma das melhores coisas de seus filmes. Há um frescor e uma energia que empolgam o espectador ansioso por novos conteúdos, novas ideias. Mesmo que nesse caso a ideia não seja daquelas óbvias que dispensam nosso raciocínio crítico. Porém, para os mais obstinados com novidades na sétima arte, filmes como esse são até mais celebrados, pois não entregam de bandeja uma visão do mundo. Ele distorce o mundo e nos convida a pensar a respeito, seja qual conclusão formos tirar disso tudo.
A atmosfera do filme é de fato de inversão. O comportamento por trás dessas mulheres poderosas na política, na mídia e no dinheiro são exatamente os mesmos que veríamos em um filme onde o centro das atenções fossem os homens. Elas contratam jovens bonitos para servi-las com roupas bem curtinhas. Elas preparam entrevistas praticamente compradas para evitar escândalos morais por conta de seus abusos. Elas estão ativamente buscando novos pedaços de posse e influência onde quer que seja. Como a religião, em um exemplo bem marcante e que convenientemente vira pano de fundo.
O roteiro e a produção são também assinados por Muylaert, o que garante a liberdade criativa que queremos de um projeto desses. Usando como cenário uma casa de repouso para mulheres de negócios na faixa dos 1%, os ambientes em volta deste clube exclusivo vai sendo revelado aos poucos e de maneira orgânica. Os custos por trás de algumas surpresas na história não devem ter sido baratos, e o resultado, principalmente os relacionados com computação gráfica, pode dividir opiniões. Digamos apenas que não se trata de uma produção bilionária do conglomerado Disney, mas até que foi feito com algum esmero.
As atuações de um elenco amplo são esforçadas, mas o roteiro é mecânico. Difícil de dizer que era essa a intenção, mas o que se sente é que falta fluidez nos cortes e a junção de várias cenas em paralelo acabam nos fazendo esquecer qual é a história principal. Ela se fragmenta frente à vontade de contar múltiplas visões deste mundo dos avessos. Não estou dizendo que o resultado fica confuso, pois não fica, mas a energia inicial não recebe aquele impulso nos próximos atos para mantê-lo vivo. O diálogo acaba substituindo o frescor dessa espécie de Admirável Novo Mundo ou alucinação coletiva.
O que eu sei é o seguinte: é difícil não ter a atenção sequestrada por estes 90 minutos de inspiração, de experimento. É um presente para cinéfilos ansiosos por algo novo. O mistério será encontrar alguém que não se sinta nem que ligeiramente interessado por esta ideia.
“Clube das Mulheres de Negócios” (Bra, 2024); escrito por Gabriel Domingues, Anna Muylaert e Suzana Pires; dirigido por Anna Muylaert; com Rafael Vitti, Luis Miranda, Cristina Pereira, Irene Ravache, Louise Cardoso, Katiuscia Canoro, Grace Gianoukas, Polly Marinho, Helena Albergaria, Shirley Cruz, Ítala Nandi, Maria Bopp, Verônica Debom, André Abujamra, Fernando Billi, Tales Ordakji e Nani de Oliveira Clodd Dias.