[dropcap]O[/dropcap] Criador de Universos (“El Creador de Universos” no original) em seu próprio título já revela a petulância de um mini diretor caseiro. E a primeira cena já revela a picaretagem de alguém que não quer ir pra escola. A análise da criação de um filme é a melhor parte, e a criação de seu roteiro a pior. Infelizmente o filme nos mostra muito da pior parte e muito pouco da melhor.
Essa, claro, é a percepção de quem não sabe nada sobre o filme e se baseia inteiramente no que é visto dentro dele. A história por trás, contudo, pode te interessar: o jovem Juan possui Síndrome de Asperger e passa o dia criando histórias dramáticas de assassinato com sua avó, Rosa, de 96 anos. A diretora Mercedes Dominioni é sua irmã e resolveu filmar uma história sobre ele. Mas claro que para quem vem de fora não há qualquer informação sobre isso no filme, o que torna tudo muito insípido.
Porém, a brincadeira toda não se resume a isso. Ao nos mostrar um garoto com uma câmera de mão filmando a sua avó e a si mesmo e depois nos mostrar o resultado das filmagens o filme está atiçando nosso lado filmmaker e criando duas camadas de ficção documental. Em uma delas, temos vídeos caseiros feitos por alguém obviamente sem habilidade alguma de cineasta. Na outra, se trata da observação do que a popularização das câmeras trouxe ao mundo e um questionamento interessante: é uma coisa boa?
Talvez seja. O grande plot do filme é a avó do garoto, lúcida apesar dos 96 anos. As filmagens podem ajudá-la a manter a lucidez em vez de apenas definhar em casa tomando remédios. Como não nos é revelado praticamente nenhum detalhe dessas duas realidades ficamos na mesmice: o garoto é viciado em novelas de crimes, a avó aguenta o guri brincando de cineasta e a verdadeira cineasta por trás das câmeras decide que esta é uma boa história.
Criando uma tela muito fina de cotidiano, sem personagens que se prezem, o roteiro adaptado da realidade de Mercedes apela para o “humanismo pelo humanismo” e acaba soando banal demais, sem potência para conseguir erguer alguma narrativa que seja. Em resumo: ele acaba sendo chato, ainda que sua história real, fora das câmeras, seja bacana.
O que podemos analisar em um filme como esse é como ele estragou a experiência, e o que podemos fazer para aproveitá-lo é entender o que saiu de errado. Eu aposto na falta de detalhes suficientes do pano de fundo onde a história se passa, a falta de cuidado em editar a narrativa principal para obter detalhes mais interessantes ou a falta de bom senso em fazer um filme como esse. Seja como for, tem algo faltando no universo desse criador.
Esse texto faz parte da cobertura da 42° Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
“El Creador de Universos” (Uru, 2017), escrito e dirigido por Mercedes Dominioni.