Ambientado em um futuro próximo em que o mundo tenta se reerguer após “a crise de 2020”, O Neon Através do Oceano surge temporal por ter sido gravado durante a pandemia de Covid-19 e, ainda que sem dar muitos detalhes sobre o que aconteceu na realidade do longa, imaginar como seria o processo de retomada da “vida normal”. Porém, a forma vazia com que aborda seus temas e constrói seus personagens acaba prejudicando seu caráter analítico.
Dirigido pelo filipino-australiano Matthew Victor Pastor, o filme acompanha a jovem Mandy (Waiyee Rivera) em sua transição da adolescência — demarcada de forma concreta pelo fim do Ensino Médio que se aproxima — para a vida adulta.
Vivendo com o pai (com quem tem uma relação, no mínimo, conturbada) em Melbourne, na Austrália, ela encontra-se longe da mãe depois que esta foi para Manila, nas Filipinas, cuidar de um parente doente. A tal crise de 2020 parece apenas ter reforçado os problemas e traumas que cada um já carregava em relação ao outro. Enquanto isso, Mandy começa a se aproximar da tutora Serena, com quem tem aulas particulares.
Pastor acompanha a rotina de Mandy de forma quase observacional. Ao mesmo tempo que isso traz uma naturalidade ao longa, também o prejudica: em meio a subtramas envolvendo imigração, divórcio, amadurecimento e sexualidade, o cineasta parece ter pouco a dizer sobre o que vemos na tela, fazendo com que o vazio esteja não apenas nos personagens, mas no próprio O Neon Através do Oceano. Há algo de metalinguístico nisso, mas claramente esse vazio não é de todo intencional.
De qualquer forma, há algo de melancolicamente belo nas ruas ainda bastante vazias de Melbourne, que não apenas escancaram a solidão e os conflitos internos da protagonista, como também servem como uma espécie de vislumbre de nossos próprios futuros. Talvez essa tentativa de retratar a situação atual do mundo seja um dos contratempos do longa: Pastor, afinal, está refletindo sobre algo ainda muito recente (e, é claro, corrente).
O Neon Através do Oceano, porém, cumpre seu propósito de ser um filme não sobre a pandemia, mas sobre o isolamento social, feito durante o isolamento social — e, fosse mais sólido, talvez conseguisse se tornar memorável por isso. O que resta é um exercício interessante que tem mais força estética do que documental.
“The Neon Across The Ocean” (Aus/Fil, 2020); escrito e dirigido por Matthew Victor Pastor; com Waiyee Rivera, Gregory Pakis, Corey Reason, Alfred Nicdao e Lilibeth Munar.
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