Pode parecer simples, mas não é. Fazer um filme de terror não é apenas copiar uma fórmula e jogar um assassino em qualquer lugar para matar jovens, o que o faz ser um exemplar a ser lembrado envolve muito mais coisas, mas principalmente, criatividade e conhecimento do gênero. Predadores Assassinos tem tudo isso.
O filme é escrito pelos irmãos Patrick e Shaw Rasmussen, que vem de uma leva de terrores com orçamentos baixos, mas uma coisa em comum: grande ideias. Predadores Assassinos é uma ideia incrível, e quando encontra o diretor francês Alejandre Aja, o resultado é esse terror divertido e que acertará os fãs do gênero em cheio.
É claro que quem não gosta muito de terror vai achar tudo meio exageradão e apelativo, entretanto, duas qualidades que caem como uma luva em um filme sobre um ataque de crocodilos.
Nele, Kaya Scodelário (de Maze Runner) é Haley, uma jovem que vai procurar o pai (vivido por Barry Pepper) no meio de uma tempestade. O problema é que ela não encontra só ele desmaiado no porão da antiga casa da família, mas também uma horda de crocodilos (na falta de um coletivo mais correto).
E pronto, só isso mesmo. O resto é um exercício de gênero. E acreditem, é mais que o bastante.
Aja tem a seu favor a estética e o conceito. Sabe fazer uma cena ser tensa com as soluções mais acessíveis e objetivas. O filme abre com uma simples disputa de natação, mas em poucos minutos você sabe tudo o necessário sobre a personalidade da protagonista e já está torcendo por ela, deixando tudo muito fácil. Cada corte, cada pequeno slow motion, cada composição, tudo pelo mesmo objetivo de criar uma tensão à flor da pele. E isso sem nem ter nenhum crocodilo por perto.
O roteiro dos irmãos Rasmussen então, se esforça para tudo isso fazer sentido e vão além. Criam uma relação familiar complexa e um motivador que serve perfeitamente bem para aproximar pai e filha e ainda fazer daquela casa um significado importante para ambos. É lógico que você, rodeado de crocodilos, esperando pela morte por desmembramento ou por afogamento irá desistir em algum momento, portanto, encher esse degrau com um drama sincero e uma crise familiar adulta e interessante só ajuda a fazer você acreditar naqueles protagonistas.
Tirando isso, Predadores Assassinos é sobre como fazer uma situação ruim ficar pior. O objetivo dos roteiristas e de Aja é empilhar uma série de problemas que vão aos poucos minando qualquer tipo de esperança para a dupla de personagens. E como isso é divertido!
Em certo momento, o pai cria uma teoria estapafúrdia sobre o barulho da água da chuva os ajudar a passar pelos crocodilos, e não importa se ela funcionaria ou não, ali, naquele momento, seria um tiro no pé, a não ser que, dois segundos depois da frase ser dita chuva cessasse. O espectador abre um sorriso com a ironia da situação e você percebe o quanto Aja está interessado nesse exagero incrivelmente mórbido e divertido. Ninguém ali quer permitir que os personagens terminem o filme sem uma boa dose de dor e sofrimento.
Haley em outro instante parece dizer para Aja e para os Rasmussen um “vocês devem estar brincando” (“You got to be fucking kiddin me!”) que resume o desespero dos personagens. Antes de dar certo, tudo dá muito errado. E quanto mais crocodilos envolvidos, mais errado, consequentemente, mais interessante.
Em termos de computação gráfica os crocodilos não atrapalham, mas talvez seja melhor você não os encarar muito ou encontrará um ou outro defeitinho. De qualquer jeito, na hora que eles entram em ação, tudo fica perfeito o suficiente para nunca te tirar de dentro do filme. E acreditem, eles entram em ação o bastante para valer a pena cada construção de tensão.
Aja é um diretor habilidoso nesse sentido, criou filmes de afundar os espectadores na poltrona, como o remake de Viagem Maldita (“Hills Have Eyes”) e sua grande obra, o francês Alta Tensão, portanto, o que faz aqui não é novidade em sua carreira. Uma grande tensão finalizada sempre com algo explosivo e empolgantes, isso enquanto maltrata seus protagonistas, mutila-os, suja e machuca. Se eles chegarem ao final sem estarem “no bagaço”, então todo esforço não terá valido a pena.
E quando no final, enquanto sobem os créditos, você dá de cara com “See You Later Alligator” é fácil entender o quanto Aja estava brincando o tempo todo com seu espectador, não se levando tão a sério quanto poderia. Afinal, depois de um ataque de uma dezena de crocodilos, uma tempestade gigantes, várias lacerações e uma amputação com seu devido close-up, Predadores Assassinos é uma pequena aula do quanto fazer um filme de terror divertido pode parecer simples, mas na verdade passa por tudo isso ai em cima, incluindo o Bill Haley.
“Crawl” (EUA, 2019), escrito por Michael Rasmussen e Shaw Rasmussen, dirigido por Alejandre Aja, com Kaya Scodelario, Barry Pepper, Morfydd Clark e Ross Anderson.