Em janeiro de 2011, um movimento de jovens no Egito tomaram a Praça Tahir. A idéia era confrontar o governo totalitário de Hosni Mubarak e uma ditadura militar que afundava o país. De lá para cá, esse mesmo movimento não só tirou Mubarak do poder, The Square Postercomo enfrentou a ditadura, conseguiu a volta das eleições, enfrentou o método com que elas foi pensada (assim como seu resultado) e, ainda por cima, tirou do poder o eleito Mohamed Mursi, representante da Irmandade Islâmica. The Square é o resultado disso tudo.

Primeiro como uma ferramenta para mostrar para o mundo o que estava acontecendo, já que “não viam nada na CNN nem na BBC”, como lembra um dos personagens, mas em certo ponto também como um arma para que a população não permanecesse indiferente diante do absurdo em que o Egito se encontrava. Do mesmo jeito que o documentário também irá servir de inspiração para quem quer o veja. Três pontos não só importantes, mas indispensáveis.

“Filmes tudo!”, é assim que um dos personagens faz com que The Square se torne obrigatório. É assim que ele encontra um meio de não deixar aquilo ser ignorado. É assim que ele, sem querer ou sem pensar, consegue criar um dos filme mais pertinentes dos últimos tempos. Isso por que é um filme verdadeiro, que não força uma situação nem procura esse ou aquele momento que irá conquistar o espectador, muito pelo contrário. Se deixa então ser linear e sensível dentro daquilo que se propõe.

Não faltarão lágrimas cada vez que a praça for tomada, nem quando a violências das autoridades criar mártires que só tinham como objetivo libertar seu próprio povo. Uma sensibilidade que é construída desde os primeiros momentos, mesmo que eles não estejam preocupados em encarar os perigos daquelas ações, mas sim o objetivo em comum. “Não importa quem é quem (se cristão ou muçulmano), o que importa é que sabem por que estão lá”, lembra um dos manifestantes.

Uma praça (do inglês, square) que se torna um símbolo. Tanto que, em uma reviravolta digna do melhores filmes ficcionais, ela se torna a ferramenta perfeita para que, não os jovens que começaram tudo aquilo, mas sim uma força paralela, vislumbrando suas possibilidades, se apodere dela para fins bem diferentes. E ver isso acontecer sob os olhos da câmera da diretora Johane Noujaim, é tão real que faz ser impossível não prever o desastre anunciado (e quem já sabia, pelos noticiários internacionais, passa a entender).

The Square Filme

E do mesmo jeito que aponta sua câmera com segurança, não esconde ser movida por uma humildade que lhe permite buscar a voz do outro lado. E por mais que em cada discurso do presidente(s) ela esteja ao lado dos manifestantes, Noujaim encontra espaço para deixar exposta as palavras das autoridades militares. E diante desse esforço transparente, ainda por cima, vai em busca da irônica (senão constrangedora) situação de uma das principais lideranças entre os manifestantes, que por um momento se mostrou importante para ligar todas as diferenças religiosas em torno desse esforço, mas acabou tendo que escolher um lado. E é visível o desconforto estampado em suas palavras, vindas de alguém que trava uma guerra interna entre ideologia e religião e que o transforma em um personagem complexo e poderoso.

Não por julgá-lo, coisa que em nenhum momento isso é feito, mas por tentar entendê-lo. Por tentar compreender como aquele mesmo povo pode então aceitar todas barbaridades de uma figura tão questionável quanto Mursi, se autoproclamando Faraó e indo em busca de um regime ainda mais totalitário do que o de Mubarak. Nesse momento, The Square é um tapa na cara, principalmente por se deixar discutir a legalidade do pleito que levou a isso. Com ou sem estrutura, o que a revolução queria ela conseguiu. Mas a que preço?

E depois de ver o filme nascer junto com esse movimento, esse épico político que demorou mais de dois anos para ser “encenado”, o espectador tem todo o direito de julgar a que preço essa escolha foi feita. Principalmente por que tem em mãos um material que se permite essa discussão. E o faz com tanta capacidade e veracidade que se torna obrigatório em termos socio-políticos contemporâneos. Assim como serve de inspiração, já que ao final, a impressão que fica é bem longe de uma luta que acabou, mas sim de uma que só está começando.


Idem (Egy/EUA, 2013), dirigido por Jehane Noujaim, com Khalid Abdalla, Dina Abdullah e Magdy Ashour


Trailer do filme The Square

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