“O sistema judicial existe para proteger os poderosos”. Esta é a base da teoria que permeia o thriller Tese Sobre um Homicídio. Ideia esta que, infelizmente, é deixada de lado ao decorrer do longa, que, mesmo assim, é um exemplar interessante e envolvente dos filmes de gênero argentinos.
Nele, o astro Ricardo Darín vive Roberto Bermudez, advogado criminal, longe da prática, mas dando aulas na Universidade de Buenos Aires. É lá que conhece Gonzalo Ruiz Cordera (Alberto Ammann), um de seus novos alunos e filho de um antigo amigo, Gonzalo então lhe apresenta sua tese sobre o sistema judicial: nada acontece com quem mata uma borboleta, mas, se alguém destrói um exemplar de alguém rico e poderoso colecionador deste inseto, é preso. O sistema, portanto, não existe para proteger a borboleta (o povo), mas, sim, para que os poderosos não sejam prejudicados. Mesmo imediatamente declarando que poderia mostrar dezenas de argumentos que refutariam esta ideia, Bermudez se interessa pela figura inteligente e dedicada do aluno, até que, ao descobrir o assassinato de uma jovem do lado de fora de sua sala de aula e perceber que a moça usava um pingente de borboleta, passa a desconfiar que Gonzalo, em um intricado jogo de gato e rato, é o assassino e está deixando pistas para que o professor consiga pegá-lo.
A partir de então, passamos a acompanhar a trajetória de Bermudez enquanto este tenta desesperadamente descobrir a verdade, não demorando a encontrar novas pistas indicando Gonzalo como autor do crime, assim como indícios de e que ele quer ser decoberto – tudo isso enquanto tomadas do professor com o olhar perdido no banho e a ótima tomada que mostra seu desespero em encontrar algo em seu apartamento, com a câmera circulando pelo ambiente e mostrando a confusão do lugar (e da mente do advogado), indicam que Bermudez possa estar lutando uma guerra inexistente.
Darín entrega uma performance sólida, como de costume, mas a ambiguidade do roteiro de Patricio Veja, baseado em livro de Diego Paszkowski, não existiria sem o excelente trabalho de Alberto Ammann, que transforma Gonzalo em um jovem charmoso e sedutor que pode muito bem ser um sádico serial killer – ou apenas um jovem advogado determinado e admirador de seu professor.
Roteiro este que, porém, falha não apenas ao não deixar claras as motivações do professor (a proximidade com o local do crime e com seu aluno demonstram seu interesse inicial, mas por que ele arrisca sua credibilidade e sua longa carreira por isso?), mas, principalmente, por abandonar a tese que dá nome ao longa. A jovem assassinada, Valeria de Natale, não tem muitos recursos e trabalha como garçonete para sustentar o pequeno apartamento que divide com a irmã, Laura; enquanto isso, Gonzalo vem de uma família rica e é filho de um poderoso advogado, além de ser, ele mesmo, um advogado competente. Nessa situação, se fosse pego, Gonzalo facilmente conseguiria uma pena reduzida ou mesmo se livrar completamente das suspeitas, beneficiando-se do sistema que tanto critica. Isto, porém, não é explorado no thriller.
O final faz sentido e é interessante dentro da narrativa, fazendo com que o espectador saia de Tese sobre um Homicídio com questões interessantíssimas apenas levantadas pela história, que, mesmo sendo um bom exemplar do gênero, se destacaria mais entre longas similares se tivesse escolhido dar mais destaque a elas.
Tesis sobre um Homicidio, escrito por Patricio Vega, dirigido por Hernán Goldfrid, com Ricardo Darín, Alberto Ammann, Calu Rivero, Arturo Puig e Mara Bestelli.