No dia 28 de junho de 2009 Stephen Hawking não avisou nada para absolutamente ninguém e deu uma festa surpresa para um viajante temporal. Ninguém apareceu, o que o levou a crer que a viagem no tempo não existe (ou existirá, ou existiu!) no futuro. Ou simplesmente nenhum viajante do tempo quis ir. Pela lógica de Hawking, se existisse algum Flash em alguma realidade alternativa à nossa, ou até no nosso futuro, com certeza ele iria dar um jeito de impedir o lançamento desse The Flash. Mas ele estreou, para o nosso azar.
Entretanto, The Flash é um daqueles filmes que serão celebrados por uma parcela da sociedade de fãs e variações disso que celebrarão o filme como se ele fosse a melhor coisa lançada nos últimos tempos. Do mesmo jeito que as palavras que se seguirão nesse texto poderão ser combatidas com algum tipo de ligação desse escritor aqui com uma conspiração pronta para detonar os filmes da DC.
Mas eu também não tive uma versão do futuro que voltou para me impedir de continuar essas linhas. Portanto, nada de mim no futuro, nem viajante temporal e muito menos algum Flash.
Mas também se houvesse um Flash ele mesmo resolveria seus problemas e destruiria todos nós com ideias imbecis, soluções que não fazem sentido e um CGI tão ruim que estaria sendo xingado até pelos fãs da série de TV, se o filme fosse protagonizada por uma personagem feminina.
E se o CGI é ruim, o resto é um punhado de ideias interessantes misturadas em um mar de falta de sentido e quase um amadorismo narrativo. O texto do filme é assinado por Christina Hodson, de coisas interessantes e divertidas como Aves de Rapina e o filme solo do Bumblebee, e Joby Harold, que tem uma filmografia que mais parece uma ficha criminal, com Awake: A Vida por um Fio, Rei Arthur: A Lenda da Espada e Army of the Dead. Não que isso aponte culpados, mas talvez dê algumas dicas.
A ideia do filme vem lá dos quadrinhos, da saga Flashpoint (no Brasil, Ponto de Ignição). Nela (aqui no filme), Flash (Ezra Millher) descobre que consegue correr tão rápido que quebra a barreira do espaço-tempo e consegue assim viajar no tempo (e consequentemente no espaço, mas isso ele só descobre depois). E mesmo com o aviso do Batman (Ben Affleck) de que isso iria dar errado, o heróis corredor decide voltar no tempo para salvar a mãe de um ataque que a matou e prendeu seu pai. A ideia funciona à primeira vista, mas no retorno para o futuro, acaba voltando antes e dando de cara com uma nova versão de sua realidade, com “seu eu” mais jovem e um lugar onde os super-heróis não existem e o Kriptoniano Zod está chegando para dominar o mundo.
Então esqueçam a “Mãe Allen” o filme não é mais sobre ela nesse momento, porque o “Barry do futuro” sai com por ai com o “Barry mais jovem” para pedir ajuda para um certo cavaleiro das trevas de Gotham City (que naquela realidade não é o Ben Affleck, para o delírio dos fãs).
Não é surpresa que quem está de volta é o Michael Keaton, vulgo Batman original dos cinemas. Mas no resto do filme sobram surpresas para os fãs. Um caminhão de aparições com cheiro de “fan service”, principalmente quando o filme decide se livrar um pouco do Flashpoint e brincar de Crise nas Infinitas Terras, talvez uma das sagas mais famosas das HQs. Mas isso não importa, pois ela dura cinco minutos e é resolvida. E se isso pode ser uma referência que escapará de muita gente, ainda existe um caminhão de detalhes que deverão ser completamente ignorados por uma geração inteira de fãs mais novos e até por gente muito mais “rodada” que não está em dia com fofocas de Hollywood envolvendo Nicolas Cage, Tim Burton e aranhas gigantes.
Sim, se você não tem, pelos menos, 70 anos de referências do universo DC nas TVs e cinema, vai precisar de um guia ou de um amigo mais nerd que você.
Salientando, tudo isso em um GCI grotesco que, com certeza, diminui boa parte da homenagem a todas as figuras que aparecem. Mas por que elas estão por lá? Não importa muito, já que o filme sobreviveria absolutamente bem sem nada disso e esse final vergonhoso feito só para os fanzocas suarem de empolgação e citarem cada referência.
O filme chega nesse lugar aos trancos e barrancos. A trama vai correndo meio sem sentido e perdendo completamente o foco na maioria do tempo. Como é de se esperar, o Batman rouba a cena sempre que aparece, seja o Ben Affleck, o Keaton ou até um outro que fica de surpresa. O resultado disso é um Flash que pouco faz qualquer coisa de interessante durante a maioria estarrecedora do filme, guardando sua aparição para uma batalha final com dois Flashs, mas já é tarde demais.
Entretanto, com dois Flahs em cenas, Ezra Miller tem espaço suficiente para demostrar o quanto é esforçado. Mesmo sofrendo com uma completa mudança de personalidade do primeiro para o segundo ato do filme, ainda assim a dinâmica que cria com sua versão mais jovem é divertida e cheia de ótimos momentos. Mas esse Flash que era brincalhão, atrapalhado e irresponsável no começo do filme, fica maduro demais no resto da história, o que parece um erro estrutural do roteiro ou uma falta de capacidade de fazer o personagem passar por essa mudança na tela.
Mas Keaton está lá, com mais um monte de easter-eggs e detalhes que vão escapar à maioria dos olhares, mas que deixarão os fãs excitados com a própria capacidade de guardar tantas referências em suas mentes.
A festa do Hawking não deu certo. Esse Flash não deu certo. O tal DCEU deu menos certo ainda. Quem sabe agora tudo entre nos rumos e tamanho desastre seja um sacrifício inicial para novos e melhores dias da DC no cinema. Talvez o viajante no tempo está lá no futuro dando risada do Hawking e esperamos também que ele tenha se divertido com o nosso futuro com os heróis da Liga da Justiça e companhia, porque até agora o desastre é muito maior do que os poucos momentos de alegria. E The Flash está na primeira dessas categorias.