É difícil entender ou até colocar em palavras o que é The Room. Tudo que envolveu sua produção e seu criador, Tommy Wiseau, podem até fazer o filme virar um cult mítico, mas esse misto de comédia sem risos, drama sem emoção e produção sem qualidade é algo que beira a tortura.
Wiseau e sua Wiseau Films surgiram de algum lugar misterioso com seis milhões para fazer um filme que não faz sentido algum. Primeiro, The Room nasceu como uma peça devidamente frustrada, o que fez com que isso se transformasse em um livro de 500 páginas que foi igualmente ignorado. Por fim, com seis milhões saídos sabe-se lá de onde, Wiseau mergulhou em The Room.
Seu nome deve aparecer uma meia dúzia de vezes nos créditos iniciais e o que vem a seguir é um desfile de tudo de mais errado que um filme possa produzir. Tudo em The Room soa errado, a trilha sonora sobre São Francisco parece ter sido roubada de algum filme de cavaleiros medievais, cheio de névoa, florestas e duendes. Sim, até duendes fazem mais sentido que The Room.
E o que se vê em sua primeira meia hora de filme é Wiseau no papel de Johnny, com um terno meio folgado demais, uma risada que parece não se encaixar no resto do clima e três cenas de sexo que podem ser consideradas as mais vexatórias da história do cinema. Uma música brega não combina com os corpos se esfregando (de modo ¿geograficamente¿ esquisito) e uma câmera rodando pelo quarto, sem contar os gemidos artificiais em primeiro plano, que completam a vergonha.
Se as cenas de sexo são constrangedoras, os diálogos conseguem assumir uma posição ainda pior. Nada parece ter sido escrito por alguém que, algum dia na vida, tenha sequer conversado com outro ser humano.
No pouco de história que esse troço tenta tecer, Johnny é um cara esquisito que está noivo de Lisa (Juliette Danielle) que, por sua vez, está ótima e apaixonada, até que se torna uma megera sem coração à partir do mais absoluto nada e resolver odiar Johnny. Para isso, entre outras coisas (como embebedar o noivo), resolve seduzir o melhor amigo de Johnny, Mark (Greg Sestero). O que vem depois disso é o mais completo caos em forma de narrativa.
Nada faz sentido, os personagens parecem mudar de humor de um corte para o outro, assim como suas motivações… bom, elas não existem… ou existem e você não entende quais são ou de onde elas vêm. E junto delas, alguns personagens também vêm em vão, assim como arcos dramáticos e até a própria geografia dos cenários (já que a câmera se perde em seu eixo).
Em certo momento, Denny (Philip Haldiman) é ameaçado por um traficante com uma arma e que ¿quer seu dinheiro¿. A cena é interrompida por ¿Johnny e cia.¿ levando o bandido para a polícia enquanto Denny toma um sermão antidrogas que poderia estar em um vídeo institucional baratinho.
E você pode estar se perguntando: ¿quem é Denny?¿. Denny é um vizinho que quer observar Johnny fazendo sexo com a noiva, mas que encara uma luta de travesseiros e que, com seus vinte anos (mais ou menos) é o candidato a ser adotado por Johnny. E isso nem é a coisa mais estranha do filme.
Talvez o momento mais estranho seja aquele em que você observa dois casais de extras fazerem seus pedidos em uma cafeteria sem nem sinal de nenhum personagem do filme em cena. Ou talvez quando um personagem descobre que tem câncer e… e… nada, não existe nem reação da filha da personagem, como se aquilo fosse uma gripe ou dor de cabeça. E é melhor mesmo não se apegar a esse câncer, já que, assim como o traficante, ele não irá mais voltar para The Room.
Ainda no assunto ¿vergonha alheia¿, o ¿jogo de futebol¿ com os personagens a dois passos de distância uns dos outros é tão esquisita quando a sequência da foto de casamento que, surpreendentemente, não mostra a tal foto.
E se é difícil colocar em palavras o que é The Room, talvez seja mais difícil ainda parar de apontar seus defeitos e maluquices. O que levará todos a pensar o quanto a vontade de fazer um filme pode ser maior do que a capacidade de fazê-lo. Mas pior que tudo isso, The Room é hipnotizante, já que você não conseguirá desviar o olhar desse desastre e ficará a todo tempo apreensivo pelo quão bizarro ele pode se tornar depois do próximo corte.
“The Room” (EUA, 2003), escrito e dirigido por Tommy Wiseau, com Tommy Wiseau, Greg Sestero, Juliette Danielle, Philip Haldiman, Carolyn Minnot e Mike Holmes