Não é raro que, depois de despedir-se de um papel icônico, os atores em questão tenham dificuldade em encontrar outro personagem à altura do talento até então demonstrado. Mesmo assim, para quem acompanhou Breaking Bad, é impossível não se entristecer ao ver Bryan Cranston preso a um filme do calibre de Tinha Que Ser Ele?. Afinal, esse desolamento diante do trabalho desperdiçado do ator é, de longe, o sentimento mais intenso despertado pela produção.
A comédia (no sentido mais amplo da palavra) traz Cranston como Ned Fleming, dono de uma gráfica, casado com Barb (Megan Mullally) e pai dos jovens Stephanie (Zoey Deutch) e Scotty (Griffin Gluck). Com vinte e poucos anos e na universidade, Stephanie convida a família para visitá-la durante o recesso de final de ano para conhecer seu namorado, Laird Mayhew (James Franco). Ned, que sempre teve um relacionamento muito próximo da filha, se incomoda com o fato de ela ter demorado para lhe contar sobre o rapaz. Isso, entretanto, não é nada comparado ao desespero que ele sente ao descobrir que Laird, um programador que se tornou milionário devido a um mobile game, é uma criatura totalmente fora do controle.
Na verdade, Laird não passa de um moleque deslumbrado com as possibilidades oferecidas por seu dinheiro. James Franco tenta imprimir charme e carisma ao personagem, mas ele é simplesmente insuportável. Este desastre é dirigido por John Hamburg, que também assina o roteiro ao lado de Ian Helfer ¿ a premissa surgiu dos dois e de Jonah Hill. Aqui, eles parecem um trio de adolescentes fascinados por terem permissão de falar ¿peitos¿, ¿pênis¿ e ¿porra¿, palavras que basicamente resumem o vocabulário completo de Laird.
Todo o senso de humor do longa segue esse padrão e, assim, somos sujeitados a inúmeras e inúmeras gags envolvendo secreções corporais, excrementos e partes íntimas. Um garoto soltando palavrões, para desespero dos pais? Confere. Alguém forçado a esconder-se em um cômodo em que um casal começa a transar? Confere. Adultos de meia-idade se drogando porque, hahaha, não é hilário ver ¿velhos¿ chapados e, ainda por cima, falando de sexo? Confere. Uma cena interminável envolvendo fezes e outra igualmente insuportável envolvendo urina? Confere.
Mas é claro que Tinha Que Ser Ele?, lá no fundo, acredita estar passando uma importante mensagem sobre tolerância, expectativas e o poder do amor. Assim, mesmo que jamais vejamos Laird e Stephanie dividindo uma cena sequer que nos leve a entender pelo menos um pouco que diabos a garota vê nele, a narrativa trata a crescente compreensão entre Laird e Ned como algo tocante e revelador para ambos.
Da mesma maneira, ainda que o roteiro dê espaço para Stephanie declarar que não é posse de ninguém para ficar sendo disputada por seu pai e por seu namorado, ainda é incômodo ver Laird solicitando a aprovação de Ned para pedi-la em casamento.
Mas tem mais! Tinha Que Ser Ele? Também quer discutir a importância da modernização da indústria e, para isso, faz da mansão de Laird uma residência totalmente livre de papel, para desespero de Ned, que não sabe como anotar alguma coisa sem papel e caneta. Enquanto a indústria gráfica aparentemente foi demolida pela internet, Laird colhe os frutos de um sucesso que ele não tem chance alguma de repetir, mas toda essa conversa sobre tecnologia, tradição e trabalho não chega a lugar nenhum.
O único momento divertido do longa acontece já no terceiro ato, e envolve a reação de um grupo de pessoas à aparição de dois convidados inesperados. Mas não se preocupe: depois de algumas risadinhas, você apenas ficará torcendo para que a dupla em questão tenha recebido muito bem em troca dessa participação ingrata.
Afinal, Tinha Que Ser Ele? é uma comédia tão imatura, patética e irritante quanto o personagem a que o título se refere.
¿Why Him?¿ (EUA/Camboja, 2016), escrito por John Hamburg e Ian Helfer, dirigido por John Hamburg, com Bryan Cranston, James Franco, Zoey Deutch, Megan Mullally, Griffin Gluck, Keegan-Michael Key, Zack Pearlman, Cedric The Entertainer, Tangie Ambrose e Jee Young Han.