E mais uma vez fica em pauta a escolha do filme nacional que deverá concorrer a representante do Brasil no Oscar… e mais uma vez os gênios que se juntam nessa “comissão de extraordinários”, em nome do Ministério da Cultura, dão uma bola fora. Não, não sou imbecil o suficiente de falar que Tropa de Elite 2 não merecia ser o escolhido, só acho que essa escolha acaba sendo, pela primeira de muitas vezes, acertada demais.
Para não deixar dúvidas, é simples, desde 2007, onde o sensacional Cinema, Aspirinas e Urubus foi escolhido, mas não passou para os finalistas, o Ministério da Cultura parece ter sido esmagado por essa necessidade de ver o nome do Brasil na noite do Oscar. Lá atrás, quando ele não chegou aos cinco finalistas mundiais o quinteto de indicados então continha obras como O Labirinto do Fauno, Dias de Glória, Depois do Casamento, Rio da Lua e A Vida dos Outros (que levou a estatueta).
Por mais que possa parecer clichê, não foi Cinema, Aspirinas e Urubus que perdeu, foi os outros que ganharam, e não só do representante nacional, mas desbancaram até o sucesso Volver de Almodovar (que ainda deu uma indicação à Penelope Cruz no mesmo ano). É a partir dessa decepção que tudo descamba, Tropa de Elite acaba não sendo indicado no próximo ano e ai é ladeira abaixo.
Diante do desespero de conseguir passar por aquele tapete vermelho no dia da premiação, a “comissão de extraordinários” então apela para um atalho, mau e porcamente falando. Se existia a lenda de que a Academia de Cinema de Hollywood sempre adorou uma criança e um velhinho, então por que não escolher o competente O Ano que Meus Pais Sairam de Férias, que ainda por cima tem seu fundo político etc. etc. etc.? A desculpa de que Tropa de Elite era “brasileiro demais”, “violento demais” ou “sei lá qualquer coisa demais”, permitiu que o melhor filme do ano (e compartilhando com Cidade de Deus e Central do Brasil o título de divisores de água dessa retomada do cinema nacional) não fosse indicado, o burburinho tivesse início e hoje o peso de tamanha imbecilidade cegasse a escolha para o famigerado “indicado a indicado” de 2012.
E o enorme desespero em ser “escolhido” continuou assombrando o cinema nacional, como se ainda faltasse um último carimbo de qualidade para o que fosse feito no Brasil. Uma bobagem de proporções estratosféricas que só prejudicou mais ainda que as produções nacionais pudessem ser elas mesmas, Última Parada 174, pueril, fraco e sem a mínima personalidade acabou sendo escolhido em 2009, afinal Bruno Barreto já tinha chegado até o Globo de Ouro com seu Dona Flor e seus Dois Maridos, “talvez seu nome ainda fosse lembrado e levado em conta”… azar de produções tremendamente mais interessantes como Chega de Saudade e Meu Nome não é Johnny que não eram dirigidos por alguém “conhecido”, e mais ainda, pior para o extraordinário Estômago, “Já que ninguém viu o filme mesmo”.
Como em uma enorme bola de neve, o que veio na sequência foi só o resultado disso, e o fraco Salve Geral acabou sendo escolhido mesmo repleto de equívocos narrativos, estruturais e visuais. Nesse momento, ou era essa tentativa de “ganhar o carimbo” ou aceitar que opções herméticas como A Festa da Menina Morta, Se Nada mais der Certo e Feliz Natal seriam, esses sim, a cara do cinema nacional: inquieto, cheio de personalidade e com uma vontade imensa de fazer seu próprio cinema.
Tropa de Elite 2 ser escolhido depois de mais um insucesso no ano passado com Lula – O Filho do Brasil de bola da vez, mas com o assunto sendo praticamente soterrado por uma discussão completamente idiota que colocava política, religião e uma malfadada pesquisa aberta ao público como pontos importantes da escolha, e não a qualidade do filme, o que, essa semana, acabou se dando com a escolha para 2012. Mesmo que por linhas tortas.
Talvez Tropa de Elite 2 seja escolhido, fique entre os cinco, ganhe a estatueta e o cinema nacional possa, mais uma vez, viver sem querer provar coisa alguma para ninguém, mas é tremendamente difícil acreditar que isso possa acontecer. No afã do momento, e diante da oportunidade de poder fazer justiça, aquela escolha errada de 2008 refletiu agora, com a escolha de uma sequência para disputar uma vaga.
A segunda “aventura” do capitão Nascimento pode até ser considerado um filme melhor que o primeiro, com um José Padilha muito mais seguro daquilo que tinha em mãos, mas em nenhum momento Tropa de Elite 2 tenta ser um filme independente e único. Tropa de Elite 2 só é o que é por que antes dele existiu Tropa de Elite, e é difícil acreditar que na hora de escolher os cinco concorrentes dessa categoria os “velhinhos da Academia” parem e pensem “Nossa, esse é o segundo, melhor então ver o primeiro antes”. Acusem-me de pessimista, mas acreditar nisso é pura ingenuidade.
O maior ás na manga de José Padilha em Tropa de Elite 2 é justamente permitir que seu público se divirta com o arco narrativo que vai desde aquele primeiro tiro dos personagens de Caio Junqueira e André Ramiro, passando pela presença magnética de Wagner Moura e chegando até a ao ótimo Milhem Cortaz, que, mais que qualquer um só funciona no segundo graças a ironia de todo caminho que ele percorreu. É lógico que Tropa de Elite 2 toca em novas feridas, mas faz isso pois seu espectador já estava aberto à elas.
O tiro do personagem de André Ramiro no começo do segundo filme, sem a existência do primeiro não é o ato de alguém que chegou àquela fronteira por ser um bom policial, mais um dentro daquela tropa, mas sim o reflexo do último plano do primeiro filme, o que deixa com que, mais tarde suas ações ganhem um peso de proporções enormemente maiores, e não simplesmente uma “mudança de ideia” (que, infelizmente, é que o vai acontecer com muitos que virem apenas essa parte 2).
A ironia disso tudo é que, mesmo tomando uma atitude completamente contrária às que vinham sendo feitas, a “comissão de extraordinários” tomou a decisão mais justa, mas, provavelmente, sem nem pensar nisso.
E se Assalto ao Banco Central e Federal tiveram a cara-de-pau de se inscreverem para uma vaga (o que só diminuia o número de candidatos), por outro lado, Vips e Bruna Surfistinha acabariam se mostrando candidatos muito mais fortes, com histórias concisas, personagens marcantes, atuações seguras, direções esforçadas, assuntos universais e a existência firme sem a necessidade de qualquer contexto.
Na superfície de toda essa discussão, minha personalidade pessimista me faz achar que Tropa de Elite 2 é uma escolha que corre atrás, desesperadamente, daquele carimbo de qualidade da Academia de Cinema de Hollywood, e não uma escolha sincera, pelo melhor filme do ano no Brasil (isso sem dúvida!). Como eu disse, talvez ele ganhe ou não (obviamente!), mas a resposta das verdadeiras ambições dessa “comissão de extraordinários” ou de uma verdadeira mudança de mentalidade só virá no ano que vem, quando for anunciado o próximo “candidato a candidato”, até lá, o melhor é torcer mesmo para que as “copias de análise” de nosso candidato leve anexado o primeiro Tropa de Elite, ai quem sabe teremos uma agradável surpresa.