Entre os reviews de alguns dos críticos europeus sobre este possível último filme de Michael Caine com Glenda Jackson, A Grande Fuga, há um consenso de que não se fazem mais filmes como esse. O que me chama a atenção é que alguém ainda assista filmes como esse.
Oitenta anos separam as gerações de agora e os ingleses, franceses e americanos que adentraram o território tomado pelos alemães sabendo que não voltariam. Pelo menos não a maioria. Para um panorama mais histórico sobre este sangrento dia assista Dunkirk.
Hoje a visão de uma guerra em países civilizados é uma imagem romântica. E como fica a cabeça dos sobreviventes depois de tantas mudanças no mundo? São vistos como herois? Suas estátuas serão derrubadas no futuro depois de suas narrativas reinterpretadas ao bel prazer de gerações alienadas?
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Nada disso importa em A Grande Fuga, um drama e um romance lúdicos sobre sonhos e pesadelos do passado. É sobre um casal que atravessou décadas juntos e agora se suportam em uma das fases mais difíceis: envelhecer enquanto morrem aos poucos, os remédios se acumulando após cada refeição. E dar graças a Deus por serem um dos privilegiados a chegarem lá.
Na verdade não. Nenhum dos dois está grato. Para espanto da jovem enfermeira que supostamente conviveu algum tempo com o casal. O enredo não se dá ao trabalho de estabelecer relações. Ele narra um conto onde detalhes de seus personagens estão espalhados na percepção do espectador. Tanto é assim que as outras pessoas que aparecem na história, o veterano do exército e o jovem da marinha, são reflexos do personagem de Michael Caine. É tudo sobre o casal principal.
Jackson e Caine conseguem manter um equilíbrio elegante entre o cansaço da velhice e a energia para suportar cada dia com alegria e um certo sarcasmo. Estar velho é saber que se está despedindo aos poucos do mundo e eles encaram isso como mais um traço inevitável do cotidiano.
O contraponto é que a geração atual insiste em romantizar o que o personagem de Caine faz ao ir sozinho prestar suas homenagens aos veteranos de guerra do dia D. Um fuzuê na TV anuncia o evento com estardalhaço. Tudo precisa ser positivo e recebido com salva de palmas. E isso cansa o casal. Quem não se cansaria?
Ciente de não ser nada demais, A Grande Fuga de fato é um filme que não se faz mais hoje em dia. Nem deveria ser feito. O projeto comercial é de alcance limitado e sua história piegas consta em uma lista virtualmente infinita de dramas pessoais que podem ser encontrados em biografias cheias de poeira e recortes de jornal amarelados. E o mais importante é que, sinceramente, a geração não liga para herois do passado. Exceto se for um casal de velhos? Fica o questionamento.
“The Grate Scaper” (UK/EUA/Sue, 2024); escrito por William Ivory; dirigido por Oliver Parker; com Michael Caine e Glenda Jackson.