De todos os gêneros puramente americanos, talvez o “road movie” seja o que tem raízes menos yankees, já que tem origem lá na Odisseia do Homero e sempre serviu de inspiração para cineastas pelo mundo inteiro (afinal, até Bergman viajou por esse caminho em O Sétimo Selo e em Morangos Silvestres). Ainda assim, o holandês Jackie parece muito mais preocupado em desbravar o gênero mesmo é na “terra do Tio Sam”. Por sorte, sem perder a sensibilidade de quem vem do velho continente.

E mesmo esquemático e fácil, o filme dirigido por Antoinne Beumer, se esforça para encontrar uma profundidade em seus personagens e situações que extrapolam alguns simples encontros pelo caminho. Na verdade Jackie quase não usa esse subterfúgio, o que o torna de certo modo até lento, mas ainda assim parece preocupado o suficiente com seu trio de protagonistas para que essa opção narrativa acabe agradando a maioria.

Esse trio é formado por duas irmãs gêmeas holandesas (Carice Van Houten e Jelka Van Houten) que, criadas por um casal gay, acabam tendo que ir para os Estados Unidos para cuidarem da viagem de sua mãe biológica (Holly Hunter), que nunca conheceram, até uma clinica de reabilitação, já que ela sofreu um acidente que a engessou a perna até a altura da coxa. O problema (e que leva a esse road movie) é que ela não pode simplesmente pegar um avião, e a única solução acaba sendo ter que cruzar algumas centenas de quilómetros em um trailer caindo aos pedaços que a mãe chama de lar.

Com uma premissa simples, mas funcional, é difícil imaginar que a história possa ir para algum lugar que não seja o óbvio, já que as duas, por mais que sejam irmãs, acabam descobrindo que pouco se conhecem e estão completamente afastadas, fazendo com que esse “passeio” as torne mais unidas e, mais importante ainda, acabem se conhecendo melhor. E se até ai não parece existir nada de muito novo, é por que Jackie só faz isso mesmo durante a grande maioria do tempo. O que nem de longe é um problema, mas apenas não o deixa se sobressair.

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Mais ainda, Jackie parece refém de uma atuação pouco interessante da personagem título vivida por Holly Hunter, que não segura a personagem, a deixa esquisita demais e exagera cada vez que abre a boca (e sai uma frase de efeito). Uma opção que ainda carrega um olhar triste demais, melancólico, e que faz ser impossível acreditar que o destino dela seja outro senão aquele que todos imaginam no exato momento que o roteiro a faz cruzar com uma doença degenerativa qualquer.

E por mais que isso seja óbvio desde muito antes nessa história, é justamente esse terceiro momento que talvez salve o filme e entregue uma deliciosa reviravolta que conquista até quem naquele momento já não dava nada pela produção. Um ponto que ainda faz todo resto passar a fazer muito mais sentido e resulta em uma tentativa sensível de contar essa história não só sobre as duas, mas também sobre essa mulher que, no final das contas, aprende o verdadeiro significado do que é ser mãe. De deixar um legado e ser lembrada.

Jackie (o filme e a personagem), por sua vez, não será lembrado muito depois de seu fim (muito menos como nenhum daqueles citados no primeiro parágrafo), mas, pelo menos, pode ter a certeza de fazer isso com uma tremenda honestidade com seu espectador. E isso é suficiente para que ele seja, pelo menos, muito bem aproveitado no que se propõe.


“Jackie” (Hol, 2012), escrito por Marnie Blok e Karin Van Holst Pellekaan, dirigido por Antoinette Beumer, com Carice Van Houten, Jelka Van Houten e Holly Hunter


Essa crítica é parte da cobertura da Itinerância da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

Trailer do filme Jackie

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