A essa altura do campeonato seria mais que normal não se empolgar com a existência de Jurassic World: Reino Ameaçado, afinal, verdade seja dita, desde o segundo filme, ainda dirigido por Spielberg, a série vem mergulhando em um poço se fundo, isso, até o anterior mostrar que o fundo era ainda mais embaixo. Reino Ameaçado vem para arrumar isso.
E não confundam qualidade com dinheiro. Dinossauros enormes irão sempre encher os bolsos do estúdio, não importa que o filme seja um remake capenga do original ou tenha uma menina lutando contra velociraptors enquanto se apresenta em um número de barras paralelas.
O que nos leva a Reino Ameaçado, que tem muita coisa dos outros filmes até, mas o faz como um meio de chegar a uma história concisa, diferente, inédita e que ainda abre as portas para uma quantidade impensável de continuações que o dinheiro permitir. Tudo isso embalado em um filme de terror.
Quem diz isso não sou eu, mas sim, entre alguns pontos, a carreira do novo diretor da franquia, o espanhol J.A. Bayona, que, estre outros, dirigiu o drama intenso Sete Minutos Depois da Meia Noite e o agitado O Impossível, mas que surgiu para o grande público com o (já clássico do gênero), O Orfanato. O roteiro continua nas mãos da dupla do anterior, Colin Trevorrow (que também dirigiu) e Derek Connely, mas o astro é Bayona.
Bayona está acostumado a fazer seus personagens lidarem, tanto com sua insignificância diante do cenário geral, quanto com uma situação que eles são incapazes de fazer algo a não ser tentar sobreviver. E isso é o cerne de qualquer filme de terror que se preze.
Em Reino Ameaçado, depois do incidente do último filme, a Ilha Nublar ficou abandonada, até que uma erupção vulcânica violenta ameaça a vida de seus “novos habitantes”, o que leva o mundo a uma discussão moral nunca antes vista em um filme da franquia: Como lidar com a extinção dos dinossauros?
A questão é que, a partir do momento que eles foram “desextintos”, eles passaram a existir, e isso faz, por exemplo, com que uma geração de crianças hoje já tenha nascido com a existência desses seres. Claire (Brice Dallas Howard), sai então do perfil executiva de salto que comandava o parque, para se tornar a chefe de uma ONG que tenta salvar os dinossauros. O que a leva a um multitrilhardário, Benjamin Lockwood (James Cromwell), que na verdade tinha sido parceiro do Doutor Hammond (Richard Attenborough) na criação dos dinossauros e que agora pretende tirar os animais da Ilha Nublar e levar para outro lugar e deixar que eles vivam em um ambiente exclusivo deles.
Mas para isso dar certo, eles precisam dela para ativar um sistema de GPS implantado neles e de Owen (Chris Pratt) para dar conta da velociraptor Blue. É claro que existe um vilão com interesses escusos, mas isso pode ficar para depois. Já que isso tudo ai é só o primeiro ato do filme, que toma um caminho bem longe daquilo que você imagina.
Também nem esperem que essa discussão pela extinção fique martelando no filme, não fica, Bayona está muito mais preocupado em fazer um filme ágil e com uma quantidade satisfatória de cenas de ação empolgantes. Não necessariamente cenas gigantes com enormes dinossauros, mas sim valorizadas pelo tamanho que necessitam ter. O resultado disso é empolgante e interessante de um jeito que só Spielberg tinha conseguido fazer. E Bayona sabe disso.
Reino Ameaçado abre escuro, chuvoso, cheio de sombras e ataques a espreita, em cinco minutos você tem certeza de estar vendo um filme de terror. E no resto do tempo ele parece seguir essa mesma linha onde, ao mesmo tempo em que é preciso pensar em salvá-los, os personagens precisam lidar com um inimigo vindo deles. Se mais uma vez eles usam o recurso do animal geneticamente mudado, agora o fazem com uma razão suficientemente interessante, já que, ainda que ele seja um dinossauro, ele não é puro, e é com os puros que você precisa se preocupar. Afinal, são esses puros que irão comer os vilões e salvar os mocinhos.
E cada cena de ataque é interessante, resultando em um embate no terceiro ato que é tão empolgante quanto as crianças fugindo dos velociraptors no primeiro filme. E enquanto Spielberg já abusava do terror para criar essa tensão, Bayona só continua fazendo o que o mestre já tinha deixado claro que funcionava. Existem até momentos que beiram o gênero nos modelos mais clássicos (e que o Spielberg adora!), como quando acompanham uma violenta sombra atacando outras sombras de humanos prestes a morrer.
Bayona sabe o limite da violência que a série se permite ter, e até da um passo além (assim como Spielberg), mas tenta a todo custo fazer isso sem prejudicar a censura de seu filme (em certo momento, um personagem é dividido entre dois dinossauros, mas é com a melhor das intenções narrativas).
Mas talvez Bayona, como eu disse lá para cima, esteja mais preocupado é com o momento inesquecível. Quando entra dentro daquela bola de vidro do filme anterior e acompanha, sem cortes, o desespero dos personagens com ela afundando no mar, o que ele quer é convidar o espectador a sentir aquilo, se aproximar da ação e ter a mesma sensação de estar sendo perseguido por um T-Rex olhando para o vidro retrovisor que deixa “tudo mais perto”. Bayona faz um trabalho para ser lembrado.
E quando ele para ação para observar um brontossauro ser tomado por uma erupção vulcânica e sumir dentro dessa névoa de poeira, deixado para trás rumo a sua extinção, você tem certeza que Bayona com certeza não será esquecido. Nem ele, nem Jurassic World: Reino Ameaçado, que, definitivamente, é um suspiro de criatividade que renova a série e mostra que ainda há muito espaço para um mundo de dinossauros.
No momento em que Ian Malcom (Jeff Goldblum) diz que a humanidade irá perder essa guerra, o que você quer é ver isso acontecer, afinal, pode dar um filmão.
“Jurassic World: Fallen Kingdom” (EUA, 2018), escrito por Derek Connoly e Colin Trevorrow, dirigido por J.A. Bayona, com Chris Pratt, Bryce Dallas Howard, Rafe Spall, Justice Smith, Daniella Pineda, James Cromwell, Ted Levine, Jeff Goldblum, Geraldine Chaplin e BD Wong.