X: A Marca da Morte sequer estreou nos cinemas brasileiros, mas foi um dos filmes mais falados no “mundinho cinéfilo” que acompanha avidamente tanto lançamentos de terror quanto os novos títulos da A24. O sucesso espontâneo era exatamente o que o diretor Ti West precisava para dar continuidade ao seu projeto, que já nasceu com a ideia de ser uma trilogia. Agora, Pearl chega às telonas impulsionado pelo sucesso de X e também pela maior presença do grande destaque do primeiro longa, Mia Goth.
Além de interpretar tanto mocinha quanto vilã em X, Goth é não apenas a estrela da prequel Pearl, mas também assina o roteiro ao lado de West — a parceria entre os dois e o profundo entendimento de ambos sobre quem é a Pearl e o que eles querem fazer com a personagem fazem deste um longa memoravelmente ácido, divertido e envolvente. Se X já era um filme que imprimia senso de humor à tensão e ao terror, Pearl se joga ainda mais na loucura e na bizarrice da personagem-título, rendendo momentos memoráveis.
Antes de nos adentrarmos neles, uma breve sinopse para quem está caindo de paraquedas aqui: Pearl conta a história de Pearl, uma jovem mulher que vive em uma fazenda texana com seus pais — o ano é 1918 e, em meio à Primeira Guerra Mundial e ao surto de gripe espanhola, a vida de Pearl está o mais distante possível de seu grande sonho: ser uma estrela da dança e estrear filmes em Hollywood.
Só que o marido (Alistair Sewell) dela está longe, na guerra, e Pearl se sente extremamente ressentida por ele ter ido para a Europa e tê-la deixado largada no Texas. Seu pai (Matthew Sunderland) perdeu a mobilidade e a fala por causa de sequelas da gripe e, por isso, a rígida mãe de Pearl (Tandi Wright) exige que a jovem a ajude com as demandas da fazenda e tenta podar todas as ambições da filha.
Mas já conhecemos muito bem a personagem de X e, portanto, sabemos que é uma mera questão de tempo até que Pearl perca a paciência de vez e resolva correr atrás fazendo o que for preciso para conquistar o que, na cabeça dela, é seu destino (“I’m a star! Please, I’m a star!”, berra ela aos prantos após uma audição).
Um dos maiores trunfos de West como diretor de Pearl é a escolha certeira dos enquadramentos e cortes que antecipam surpresas e quebram expectativas. Quando uma personagem sai por uma porta e aparece indo embora em um plano bastante aberto, já sabemos: Pearl vem logo atrás. Depois de ouvir um testemunho horrendo e caótico, ele corta para a cara confusa de uma ouvinte tentando manter a pose e não para alguém desesperado e amedrontado com o que acabou de ouvir.
E não é à toa que Goth tanto estrela quanto ajuda a roteirizar o filme, Pearl é todo dela e é difícil imaginar atriz mais perfeita para o papel. Se inicialmente Pearl consegue o que quer com sua voz e olhar doces, vê-la perder o controle aos poucos e começar a falar mais e mais agressiva e desesperadamente é tão assustador quanto divertido. Sabemos até onde Pearl é capaz de ir e, na prequel, vemos uma jovem sonhadora se transformar em vilã sanguinária — mal posso esperar para ver o que a dupla Goth e West vai entregar no próximo título da trilogia, MaXXXine, cujos eventos devem se passar após os de X.
Aliás, outro elemento fascinante em Pearl são as pequenas referências que o filme faz à X, que surgem pontualmente sem desviar o foco da história, mas ajudando a criar uma linha narrativa e a fortalecer o mundo bizarro e fascinante que Ti West está criando: adoro o plano que mostra a protagonista pisando no X que marca o posicionamento que ela deve ocupar em um palco — mas a referência mais reveladora é quando Pearl, fascinada pelo brilho de Hollywood, demonstra repulsa ao ver pela primeira vez um filme pornô.
Conduzido com uma forte estética vintage que dá um ar de glamour trash ao longa — e já podemos descrever a imagem de Pearl com seu vestido vermelho e seu machado de icônica? —, Pearl é uma loucura insanamente divertida e um tremendo passo adiante em todas as qualidades já demonstradas em X.
