A Cor que Caiu do Espaço | Lovecraft, Nicolas Cage, magenta e loucura


As lendas que vão de Providence até Arkham dizem que as melhores adaptações para os cinemas de alguma obra de H. P. Lovecraft vêm de material que não foi escrito por ele. Sua influência no terror da metade do século 20 para frente é descomunal, mas seus livros tem um jeitão meio hermético e pouco visual, seu segredo quase sempre esteve no clima e no medo, na loucura e não no monstro. A Cor que Caiu do Espaço tenta quebrar essa maldição.

Talvez até quebre, por mais que ainda fique muito abaixo de filhos bastardos de Lovecraft como O Enigma do Outro Mundo, À Beira da Loucura e O Enigma do Horizonte (só para citar três… e eles já ficarem de dicas). Mas o que importa é que A Cor que Caiu do Espaço tenta, e talvez até abra as portas para novas tentativas do cinema. Principalmente diante de uma leva de produções no gênero que se apegam bastante ao clima, como A Bruxa, O Farol e Mandy. Esse último, intimamente ligado a A Cor que Veio do Espaço, não só pela presença de Nicolas Cage.

A oportunidade de filmar essa adaptação nasceu, justamente, quando a produtora SpectreVision (de Mandy), resolveu bancar a ideia do diretor Richard Stanley, espécie de “persona non grata” nos corredores de Hollywood desde mais duas décadas atrás quando foi expulso do terror A Ilha do Doutor Moreau e nem teve seu nome creditado no filme. Mas tudo bem, agora tudo vai dar certo, já que, ao que tudo indica, Stanley e o diretor sueco Henrik Moller fizeram um ritual à Yog-Sothoth enquanto estavam nos Pirineus para que A Cor que Veio do Espaço desse certo (isso é verdade!).

Quem conhece a obra de Lovecraft já pode imaginar o nível de maluquice do cidadão. Mas a verdade é que o filme aconteceu. Então quem é o maluco aqui?

Stanley escreveu o roteiro com Scarlett Amaris e tira a história lá do final do século 19 e a traz para os dias de hoje. O cerne é o mesmo da história original, uma família que vive em uma fazenda até que, durante uma tempestade, vê cair em seu quintal uma espécie de meteoro que, logo no dia seguinte, some, mas deixa uma aura de loucura que vai tomando todos ao redor dela. No livro, uma cor indescritível começa a brilhar sobre tudo, no filme ela é magenta mesmo.

O que vem a seguir é o caminho dessa família em direção à insanidade e, aos poucos, até ainda para mais longe disso. O que, para os fãs do gênero, é uma justificativa para dar uma chance ao filme, já que Stanley realmente chega em um nível de esquisitice e horror digno dos melhores momentos de John Carpenter e sua criatura no ártico. Portanto, A Cor que Veio do Espaço é realmente perturbador o suficiente para você poder acreditar que ele é uma boa adaptação de Lovecraft.

O visual é interessante, Stanley nunca apela para o susto artificial, mas sim para uma câmera que gosta do que vê e permanece olhando para aquilo, mesmo que seja minimamente incômodo. Infelizmente, falta a Stanley um pouquinho de robustez visual, suas composições são quadradas e ultrapassadas, e por mais que funcionem, nunca dão ao filme aquela impressão de loucura que, por exemplo, gente como Ari Aster (Midsommar) e Panos Cosmatos (Mandy) conseguem criar. Talvez falte um toque de psicodelia para Stanley e isso impede A Cor que Caiu do Espaço de ser muito maior.

Por fim, é impossível falar dessa tentativa de trazer Lovecraft para os holofotes sem citar Nicolas Cage. Assim como em Mandy (sim, não me canso de citar essa obra-prima!), A Cor que Caiu do Espaço dá a oportunidade do ator de fazer o que ele mais gosta: enlouquecer. Cage começa com tudo no lugar, mas quanto mais mergulha nessa insanidade púrpura, mais se solta e mais exageradamente divertido ele se torna. Não existe intenção de segurar Cage, nem na sua canastrice, muito menos na maluquice de olhos esbugalhados e coberto de sangue que ele, mais uma vez, se torna. Talvez para os mais puristas isso signifique uma atuação ruim de um cara que ganhou o Oscar, para quem acompanha o ator, sabe o quanto ele fica à vontade com essa possibilidade de atuações bizarras e que não se levam tão à sério. O resultado é tão divertido quanto o filme.

E o melhor disso tudo, Stanley parece fazer disso uma espécie de projeto pessoal, então o respeito é tamanho que não foge de linhas e mais linhas tiradas diretamente dos originais de Lovecraft. Assim como entende o clima necessário para que o filme funcione como uma daquelas adaptações interessantes o suficiente para nem parecerem ser feitas à partir de obras do escritor.


“Color Out of Space” (EUA/Mal/Por, 2019); escrito por Rchard Stanley e Scarlett Amaris; dirigido por Richard Stanley; com Nicolas Cage, Joely Richardson, Madeleine Arthur, Elliot Knight, Tommy Chong, Brendam Meyer e Julian Hilliard


Trailer do Filme: A Cor que Caiu do Espaço

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