A Criança | Falta poesia, sobram atuações

A Criança é um épico que caminha por uma crise histórica sem fazer parte desta, compartilhando com o espectador momentos da vida privada de uma família onde seus costumes atrapalham a vida de todos, mesmo que ditos livres. É um gigantesco teatro no campo onde o amor encontra oponentes à altura, onde a poesia portuguesa não atinge os corações porque já estão todos falando em francês.

O seu pano de fundo é histórico quase como uma coincidência, pois não se encontra paralelo aos acontecimentos do filme. Estamos no início do século 16. A coroa portuguesa acabou de perder seu herdeiro e a esperança ainda está no ventre da princesa, o que naquela época não inspirava muita confiança. O único descendente poderia ser perdido facilmente, bastando um parto mal sucedido. A única chave para desvendar a época onde se passa o filme é que Bela (João Arrais), o protagonista, é uma criança adotada.

O que está acontecendo nessa família do interior próximo de Lisboa é que as intenções deste filho único é abandonar sua família e seguir o caminho de sua noiva, Rosa (Inês Pires Tavares), que deseja retornar para sua terra natal. A família está vulnerável desde que perderam seu outro filho, um assunto nunca falado durante as refeições ou entre elas. A mãe, Maria (Maria João Pinho), sofre de melancolia por conta de um amor perdido e o pai, Pierre (Grégory Gadebois), mantém uma relação misteriosa e que quase escapa aos nossos olhares curiosos dos costumes da época.

A Criança | Falta poesia, sobram atuações

Direção de estreia da dupla Marguerite de Hillerin e Félix Dutilloy-Liégeois e uma das escolhas nesse ano para a Mostra de SP, este filme é falado quase totalmente em francês com algumas poucas frases em português, o que soa bem estranho pela história se passar apenas em Portugal, embora seja fácil de compreender pelas notas de produção: adaptado livremente de uma obra literária francesa e dirigido por franceses, as complicações nessa tradução não atingem nenhum objetivo multicultural, exceto a estranheza.

As atuações são um negócio fino, além do necessário para um roteiro delicado e sutil demais para fazer algum barulho que atinja a mente do espectador. Veteranos como Grégory Gadebois e Maria João Pinho enriquecem alguns momentos, embora o trio de jovens que mais ganha tempo de tela, João Arrais, Inês Pires Tavares e Alba Baptista, façam de tudo para tornar essa experiência mais televisiva que cinematográfica. Abusando de clichês de atuação, como abraçar seu estereótipo e compor quadros inertes em longas cenas, o elenco mais jovem frustra o que poderia ser uma provocação até que curiosa.

Como é de praxe em filmes de diretores estreantes, falta o pulso firme no controle do tom com que o drama é convertido em personagens pelo elenco mais inexperiente e a vontade de cortar o que está sobrando nos rolos de filmagem. Quando a tragédia anunciada acontece as consequências não são sentidas nos personagens, mas na duração de cada cena de conclusão.


“L´enfant” (Por/Fran, 2022), escrito e dirigido por Félix Dutilloy-Liégeois e Marguerite de Hillerin, com Grégory Gadebois, João Arrais e Maria João Pinho.


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