A Escolha Filme

A Escolha

Na adaptação de Nicholas Sparks deste ano, um homem e uma mulher completamente diferentes um do outro se conhecem e se odeiam à primeira vista. Mas – surpresa! – a irritação na verdade esconde a atração incontrolável entre o casal. Na bela cidade costeira em que vivem, os dois se entregam à paixão e embarcam em uma jornada que – outra surpresa! – envolve uma tragédia. Será que o protagonista conseguirá fazer A Escolha necessária? Será?!

O roteiro de Bryan Sipe é tão formulaico que poderia até render um filme… interessante é exagero, mas vamos lá: poderia até render um filme que não fosse um desastre completo se, ao menos, nos apresentasse a personagens envolventes, que nos fariam rir, chorar e amar ao lado deles mesmo enquanto eles trilham um caminho completamente óbvio. Mas não é o que acontece aqui e, assim, estamos fadados a acompanhar, ao longo de intermináveis 110 minutos, a história de Travis (Benjamin Walker) e Gabby (Teresa Palmer), que se conhecem quando ela se muda para a casa ao lado.

Ele é um solteirão convicto que prefere curtir a vida, seu emprego bacana e sua casa ao lado dos amigos em vez de se prender a uma garota, mesmo que todas as mulheres se encantem com ele – ei, pelo menos é isso o que ouvimos repetidas vezes de outros personagens; o tal “charme irresistível” de Travis, na realidade, surge apenas como “pé-no-saquismo” e “babaquice”. Ela se mudou da cidade para a ilha, onde pretende encontrar a tranquilidade de que precisa para estudar para passar nos exames de residência em Medicina.

Depois de uma discussão detestável em que Gabby acusa o cachorro de Travis de ter “se aproveitado da inocência de sua adorável garotinha” – e de descobrirmos que, apesar de Travis ser um veterinário experiente e de Gabby ser capaz de rapidamente identificar que sua cadela está grávida, nenhum dos dois considerou que, talvez, fosse uma boa ideia castrar cachorros que  andam por aí livremente -, os dois rapidamente passam a desprezar um ao outro. Até que uma emergência canina surge, Travis ajuda Gabby e os dois passam a se conhecer um pouco melhor. Mas continuam se irritando muito um com um outro.

Na verdade, Travis se irrita tanto com Gabby que o filme tenta transformar a frase “você me incomoda”, que ele repete à exaustão, em um ponto importante do relacionamento do casal. Mas claro que, apesar de tudo isso, os outros personagens percebem instantaneamente que Travis e Gabby são feitos um para o outro e estão destinados a ficar juntos para sempre – e após vê-los conversando uma única vez, a irmã de Travis já se considera apta a anunciar que ele “acabou de conhecer sua esposa”.

Mas, assim como o suposto charme de Travis, isso tudo também é apenas anunciado, já que o longa jamais consegue dar peso suficiente a seus personagens e aos relacionamentos entre eles para que nos convençamos de qualquer coisa. E nem o roteiro parece muito certo do que diz: se no início um dos amigos de Travis fala que a “namorada” dele, Monica (Alexandra Daddario) nunca fica por perto – e, assim, o relacionamento dos dois nunca vai pra frente -, mais tarde vemos a jovem anunciando o quanto gostaria de ter conquistado o amor de Travis. Tudo bem, isso poderia ser resultado de um relacionamento complicado, mas isso seria dar crédito demais ao longa.

O diretor Ross Katz não chega a atrapalhar, mas a fotografia está tão desesperada por nos apresentar à cidade costeira onde o filme é ambientado de forma extremamente cinemática que é difícil enxergá-la como um lugar mágico e apaixonante, e não como o cenário de um filme (ruim). Por outro lado, a decisão de pegar o discurso de Travis que abre o filme e, mais tarde, finalizá-lo com uma piada é extremamente destoante da narrativa – apesar de fazer sentido para o personagem, isso diminui a (pouca) profundidade da narração que abre e encerra o longa. Que, aliás – claro! – não está presente em mais nenhum momento, em um grave (mesmo que comum) erro de estrutura.

A Escolha Crítica

Em certo ponto do filme, Travis e Gabby tem uma grande discussão sobre uma decisão que ela se recusa a tomar. Ele vai embora aos prantos. Na cena seguinte, descobrimos que ela tomou a tal decisão no instante em que ele foi embora. A discussão, portanto, rende uma “importante” e dramática sequência, enquanto sua solução acontece longe dos olhos do espectador – A Escolha está interessada no drama, não na resolução deste. Assim, a jornada de Travis e Gabby acontece de forma melodramática, forçada e corrida, sem que tenhamos tempo – ou, francamente, vontade – de nos envolvermos ao lado deles.

E não é por falta de tentativa do elenco – Teresa Palmer é carismática e adorável, e faz o possível para imprimir um pouco de profundidade em sua personagem rasa. Benjamim Walker, por sua vez, pesa no sotaque sulista para encarnar o irritante Travis, que parece ter sofrido uma maldição que o força a ser engraçadinho o tempo todo. O resto do elenco é desperdiçado em papéis ingratos, principalmente Alexandra Daddario e Tom Wilkinson; já Tom Welling foi “agraciado” com um personagem que existe para cumprir a função de que o roteiro necessitar.

Mas a lista de problemas de estrutura de A Escolha ainda continua, e este é o mais grave de todos: depois que Gabby e Travis se casam e formam uma família (…spoiler?), o filme simplesmente esquece a ambição dela de ser médica, uma profissão para a qual ela tinha talento e à qual se dedicou muito. A alternativa é que isso não seja um erro do roteiro, mas uma decisão – misógina e completamente sem sentido para a personagem – de privar Gabby da profissão de seus sonhos quando ela se torna esposa e mãe. Há mulheres que querem isso, claro, mas nada do que havíamos visto até então indica que Gabby faz parte desse grupo. Ou, então, os cineastas se esqueceram desse detalhe, e vai ver que a vida profissional de um veterinário de cidade pequena é bem mais agitada que a de uma médica.

Ainda encontrando tempo para incluir uma conversa moralista sobre forças maiores e religão, A Escolha é exatamente o que esperamos de uma história de Nicholas Sparks: um filme que faz pouco caso da tragédia sofrida pela mulher, transformando-a apenas em fonte de tristeza, arrependimento e redenção para o homem. Ou seja, se você é fã do autor, vai adorar esta produção.


“The Choice” (EUA, 2015), escrito por Bryan Sipe, dirigido por Ross Katz, com Benjamin Walker, Teresa Palmer, Tom Welling, Tom Wilkinson, Maggie Grace e Alexandra Daddario.


Trailer – A Escolha

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