Branco Sai, Preto Fica Filme

Branco Sai, Preto Fica

Branco Sai, Preto Fica tem uma ideia promissora, consegue implementá-la, e ainda que se alongue desnecessariamente em vários momentos, consegue estabelecer um argumento no mínimo interessante. Passado, Branco Sai, Preto Fica posterpresente e futuro se combinam para convergir em um ponto no tempo: a invasão policial em uma danceteria na região periférica de Brasília que fez com que duas pessoas não conseguissem mais andar normalmente. Para nosso protagonista, Marquim, o mais trágico é não poder dançar. Marquim, além de ator, é um personagem da vida real.

O filme mescla o tom documental e futurista para enriquecer aquele universo produzido com baixo orçamento. Por inserir testemunhos como narração em off, causa realismo. Por envolver viagem no tempo e seu imediatismo, causa tensão. A correção de um sistema social injusto que puniu os negros por muito tempo ganha duas frentes nessa realidade: jogar uma bomba ou processar o estado.

E é essa a parte que eu mais gosto no roteiro. Não uma cena específica, mas a ideia de que as pessoas se cansaram e partiram para o ataque. Mas não contra um racismo brasileiro, onde a realidade nunca é muito clara, mas contra um inimigo invisível que finalmente foi rastreado em pelo menos um evento: o massacre na danceteria. A partir do momento que isso fica claro eles viram heróis. Meus heróis, pelo menos. Ainda mais por terem se tornado deficientes físicos e não vítimas do sistema, ainda que tenham motivos de sobra para tal.Branco Sai, Preto Fica Crítica

Acompanhamos a vida dura de Marquim, vivendo sozinho em uma cadeira de rodas, através de sua rotina para sair e chegar de casa. A felicidade para ele pode ser resumida em relembrar seus dias de dança tocando (e cantando) seus discos de vinil em sua rádio clandestina. As músicas, além de servirem como uma ótima trilha sonora, são nostálgicas por natureza por resgatar o movimento hip-hop. Aliás, a história da noite fatídica é narrada através de um rap improvisado por ele mesmo logo no início da trama. Branco Sai, Preto Fica preza pela economia em contar sua história para manter a rotina como o núcleo de sua desesperança. Desesperança essa que nos leva a constatar que a “ex-ceilândia” é um lugar de tão poucos amigos que Marquim precisa se proteger através de câmeras circundando o local e uma entrada pelo segundo andar da casa que desce até o que seria o térreo, mas que lembra o subsolo pós-holocausto nuclear.

Não é nenhuma novidade que Brasília seja rodeada de miséria, seja em um raio de cem quilômetros ou milhares deles. O que torna Branco Sai, Preto Fica empolgante é exatamente o seu distanciamento temporal, o que permite essa extrapolação pela realidade alternativa em que fanáticos religiosos chegam ao poder, tornando tudo ainda mais dramático. Ou será que todo essa dramaticidade não está presente nos dias atuais e é esse distanciamento que nos faz enxergar com um olhar mais crítico? Às vezes a ficção, científica ou não, é o caminho mais cru para a auto-crítica do tempo em que vivemos.


idem (Bra, 2014),  escrito e dirigido por Adirley Queirós, com Marquim do Tropa, Shockito, Dilmar Durães, Gleide Firmino e DJ Jamaika


Trailer – Branco Sai, Preto Fica

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