Cinquenta Tons de Preto é a maneira mais eficiente de criticar o sexismo de seu primo que deveria ser levado a sério, Cinquenta Tons de Cinza. Ele é uma paródia. Usa a mesma história do original e se aproveita de sua mediocridade para fazer comédia. De quebra, é um rodízio de comentários que, inspirados ou não, tentam ridicularizar uma situação que já é ridícula na fonte, mas embora possa soar redundante, não é. Certas coisas precisam ser ditas com outra forma de abordagem para serem visíveis ao público, e nada como uma comédia despretensiosa para isso.
Ainda por cima o filme se permite toda e qualquer piada sobre racismo, pois é sobre o relacionamento entre dois negros, o que lhe dá certa imunidade nesse assunto. Não se sabe se as críticas a respeito da palavra “nigga” (crioulo, em inglês) aparecer no filme de Tarantino, Django Livre, suavizou-a para ela ser usada aqui mais de uma vez, ou se simplesmente ninguém liga quando é uma comédia besteirol. De uma forma ou de outra, aqui não vemos apenas a nudez feminina, mas principalmente a afro-masculina, ridicularizada para fazer rir. Nesse sentido, o filme deveria chocar mais que o água-com-açúcar do Tons de Cinza. Não choca. Aparentemente na comédia – pelo menos a americana – pode-se tudo.
Mas não sejamos injustos: a história aqui é o que menos importa. Alguns detalhes são até non sequitur, como quando Hannah (Kali Hawk) diz ter um umbigo invertido durante a primeira cena de sexo, algo que não vemos nunca mais. O filme não é feito para figurar entre os melhores do ano. Felizmente, nem nos piores. Isso graças a um elenco carismático, cujo pilar reside tanto no poder de anasalar a voz de Kali Hawk (Missão Madrinha de Casamento) e na insistência em fazê-la soar como uma versão ridiculizada da personagem original de Dakota Johnson (funcionando parcialmente) quanto nas caretas e nos trejeitos do problemático Christian (Marlon Wayans).
Como toda paródia, há uma ou outra referência engraçadinha a outros filmes do momento, como 12 Anos de Escravidão, Whiplash, entre outros. Todos gratuitos, mas quase nenhum inserido totalmente deslocado, ou tão deslocado que não funcione. Algumas coisas funcionam bem, outras não. Rir é opcional e algo bem subjetivo nesse caso. Talvez você goste da maneira liberal americana de tirar sarro do conteúdo risível da autora E. L. James. Eu gostei; principalmente porque o politicamente correto não está em jogo aqui, ou se está, ficou tão disfarçado no meio das piadas que não faz tanta diferença.
De uma forma ou de outra, se você procura um besteirol qualquer, mas que contenha referências pop e (mal/bem)-intencionadas, Cinquenta Tons de Preto é uma escolha interessante, passageira e divertida. Até onde durar sua perversão humorística.
“Fifty Shades of Black” (USA, 2016), escrito por Marlon Wayans, Rick Alvarez, dirigido por Michael Tiddes, com Marlon Wayans, Kali Hawk, Fred Willard, Mike Epps, Affion Crockett