Decisão de Partir (2023) | Crítica do Filme

Decisão de Partir | Mais um filme diferente e imperdível de Park Chan-wook

Não existe filme comum nas mãos do diretor coreano Park Chan-wook. Quase como se ele enxergasse esse lado esquisito e quebrado até na história mais comum. Ou talvez não exista o comum e Chan-wook só saiba levar isso para a tela, exatamente como em Decisão de Partir.

A premissa poderia estar em um punhado de suspenses noir do cinema, um policial (Hae il Park) é enviado para investigar a morte de um homem ao pé de uma montanha. Não demora muito para ele suspeitar da própria viúva da vítima (Tang Wei), na mesma rapidez com que os dois se apaixonam. E quanto mais ele chega perto da verdade, mais o relacionamento dos dois irá impedi-lo de tomar as decisões corretas.

Obviamente que Decisão de Partir não é só isso e o roteiro do diretor em parceria com Chung Seo-Kuyng carrega o espectador para um lugar que não deixa de ser esperado, mas é muito mais complexo do que parece. Algo que fica entre a obsessão e a desconfiança. Entre um romance normal e uma violenta necessidade de se completarem. Talvez o filme seja sobre isso mais do que sobre qualquer assassinato misterioso ou culpado.

De modo hábil e provocador, Decisão de Partir não deixa que o espectador fique durante muito tempo lutando contra essas dúvidas. Não demora muito para todo mundo ter certeza da culpa dela (e isso não é um spoiler) e o diretor te leva para esse caminho. A diversão é acompanhar o esforço emocional do protagonista para ignorar essas certezas e tentar passar por cima disso para aceitar seu amor.

Song Seo-rae, a esposa da vítima, não é uma “femme fatale” descomplicada, mas sim alguém que está o tempo inteiro nessa corda bamba entre o amor e a culpa. Wei faz isso com leveza e permite que tudo pareça uma simples manipulação, mas ao mesmo tempo carrega o sentimento daquilo ser real. Uma incerteza que mergulha o filme em uma tensão que transporta toda experiência para um lugar completamente inesperado.

Leia a crítica de Decisão de Partir

É difícil ter certeza se o amor dos dois é algo real e a construção de Park Chan-wook brinca com isso durante todo tempo. O relacionamento dos dois é sempre quebrado pela lembrança de que ela pode realmente ser a culpada e que ele precisa voltar a investigar isso, mesmo depois do caso fechado. Talvez em busca de uma verdade que o libertará, não que irá desvendar um crime ou prenderá uma suspeita. Ele precisa se entender, talvez por não conseguir aceitar essa paixão enquanto não se livrar de todas incertezas que rodeiam o caso.

Ao mesmo tempo que toda essa tensão vai se formando, o diretor coreano aceita suavizar grande parte desse começo com uma espécie de humor quase inconsequente. Toda esquisitice do detetive Jang Hae-joon constrói um cenário onde tudo parece caminhar para uma farsa, quase como se suavizasse o peso do resto do filme. Nada exagerado, mas mais tenso e carregado, tentando entender a dor dos dois mundos separados enquanto os caminhos de ambos voltam a se cruzar diante de ainda um terceiro momento de Decisão de Partir.

Como se Park Chan-wook brincasse com o espectador e estivesse o tempo inteiro apontando o filme para um lado completamente diferente daquilo que se espera. Quase como uma grande brincadeira que aos poucos vai se tornando séria e poderosamente emocional. Seus protagonistas vivem um relacionamento esquisito e obsessivo, assim como o diretor cria o filme perfeito para eles, um filme esquisito e obsessivo.

A precisão estética de Park Chan-wook é sempre incrível, assim como a capacidade interminável de construir a violência através do clima e não só de sangue ou qualquer gore. Aos poucos Decisão de Partir, como absolutamente qualquer filme de Park Chan-wook vai rumando para um lugar que o espectador quer desviar o olhar e não encarar. Como se ele não tivesse medo de contar aquela história doa a quem doer, mesmo que isso mergulhe o espectador em um lugar sombrio e incômodo.

Um filme sobre violência, mentiras e obsessões, dirigido por um diretor que sabe manipular todos esses sentimentos e com uma trilha sonora de Jo Yeong-wook que não deixa o espectador pensar, espremendo sempre seus sentimentos como se esmagasse-os dentro desse monte de sentimentos que brigam para serem sentidos. Um filme onde nem o “eu te amo” se permite ser comum.


“Heojil Kyolshim” (Cor, 2022); roteiro de Park Chan-wook e Chun Seo-Kyung; dirigido por Park Chan-wook; com Park Hae-li, Tang Wei, Lee Jung-hyun e Go Kyung-Pyo


Trailer do Filme – Decisão de Partir

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