Deus e o Diabo na Terra do Sol | Um clássico remasterizado… e revisitado

Assisti na Mostra SP a Deus e o Diabo na Terra do Sol, o filme icônico de Glauber Rocha, criador do cinema novo na época, e agora em sua versão remasterizada de 2021, feita em 4k com base na restauração passada, de 2007, feita para DVD. Infelizmente houve apenas uma sessão. Ficam as impressões.

A primeira coisa que se nota nessa revisita é que o desenvolvimento do filme é muito problemático e pedestre, de ficar se arrastando em longas tomadas e de filmar as cenas de ação cheio de amadorismos. É até de se admirar que bons nomes da dramaturgia brasileira estejam associados com este filme, como Othon Bastos e Yoná Magalhães, mas importante lembrar que estes estavam no início de suas carreiras.

No entanto, curiosamente os atores menos conhecidos são os mais emblemáticos. Geraldo Del Rey faz Manuel, um fazendeiro que quis justiça e matou o coronel que quis ficar com suas vacas. Maurício do Valle faz Antônio das Mortes, com o título “matador de cangaceiros”, um personagem que ele levou depois para outros filmes. E, importante lembrar, foi um dos poucos filmes de Yoná Magalhães, e ela está muito bem, obrigado.

A produção rasteira ocorre com atores exagerados, teatrais, em um cenário onde Rocha quer de todas as maneiras nos forçar ao sono pela lentidão de suas cenas, e ao mesmo tempo se gabar, utilizando ângulos inusitados, brincando com a proporção entre os personagens, mas sem pensar muito na decupagem, ou seja, como melhor enquadrar os elementos na tela 4 por 3.

Aliás, não acredito que o cineasta estivesse pensando em muita coisa. Adepto da máxima “uma ideia na cabeça e uma câmera na mão”, isso é o que de fato vemos no filme, mas infelizmente a ideia na cabeça não vale muita coisa. Se trata de uma versão teatral da exploração do mais pobre pelo governo da República e referências à história sofrida do povo nordestino, não apenas pela seca, mas por terem sido sistematicamente massacrados pelas forças coronelistas e militares. Mais curioso é que em dado momento o profeta do povo, Lidio Silva, outra exageradíssima interpretação, comenta de forma saudosista sobre a época do imperador.

Cheio de diálogos pobres e cenas de ação risíveis de tão ruim, mesmo com duas horas de duração perde o foco e não se consegue entender este filme exceto sob os olhares históricos. É desonesto, mas acurado, dizer que filmes que o sucederam disseram muito mais sobre a exploração histórica do que este filme. Hoje ele é apenas um filme em preto e branco de duas horas com cenas lentíssimas e que não vai para lugar algum. Mas há quem defenda. Se você gostou do filme, leia-os, por favor.


“Deus e o Diabo na Terra do Sol” (Bra, 1964), escrito por Walter Lima Jr., Glauber Rocha e Paulo Gil Soares, dirigido por Glauber Rocha, com Geraldo Del Rey, Yoná Magalhães e Othon Bastos.


CONFIRA MAIS FILMES DA COBERTURA DA 46° MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA DE SÃO PAULO


Continue navegando no CinemAqui:

DEIXE UM COMENTÁRIO

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Menu