E o Oscar é sempre assim, muita expectativa, algumas surpresas, uma eterna tentativa de aproxima a longa cerimônia com seu público, algumas piadas boas no meio de um monte de escorregões dos roteiristas e um monte de estrelas do cinema citando de boca cheia os estilistas que assinaram seus vestidos. Isso tudo e um pouco de cinema.
Na parte do cinema, o que s pulou aos olhos foi a confusão dos votantes e os prêmios que causam estranheza. E logo de cara, no primeiro prêmio da noite, ver Christoph Waltz levar sua segunda estatueta no lugar de Tommy Lee Jones, e prever uma noite que não acabaria bem para o Lincoln de Steven Spielberg, era apenas mais um sinal do exagero diante do filme.
Eram 12 indicações, se transformaram em 10 derrotas. Incluindo aquela que todos achavam óbvia por falta de competidores, já que Tarantino, Kathryn Bigelow e Ben Affleck foram esnobados para dar lugar a um monte de gente com cara de perdedores. E em um momento de completa confusão da Academia, quem saiu perdendo foi o próprio Spielberg, que talvez até merecesse o Oscar de Melhor Diretor, mas viu o tailandês Ang Lee, e seu As Aventuras de Pi, ser a grande surpresa da noite.
Diante da tentativa de vaporizar o número de prêmios para que Argo não ficasse com o principal prêmio de noite e só, a Academia esqueceu-se do competente trabalho de Lee, ainda mais em um filme cativante e cheio de significado, com um visual estonteante, um ótimo uso de 3D e todas as ferramentas para conquistar seu público. Incluindo os votantes da Academia. Por um segundo, já com três prêmios para colocar no cartaz (e na caixinha do DVD/Blu Ray) Ang Lee deixou Spielberg sem entender nada, e fez com que todos aceitassem a possibilidade de que talvez “Argo” pudesse mesmo não ganhar o Oscar. Mas só por um segundo mesmo.
Na verdade William Goldenberg já tinha deixado todos adivinharem onde aquela noite pararia ao ganhar o Oscar de Melhor Montagem por seu trabalho em Argo, já que, talvez até mais que as quatro categorias (diretor, ator, atriz e roteiro) uma das que mais dita o grande vencedor da noite é essa. Ainda que isso só prove mais uma vez a estranheza da situação geral, já que Goldenberg deve ter tido mesmo um baita trabalhão ao “colar” os pedaços filmados por um diretor que nem ao menos foi indicado ao Oscar. Mas tudo bem, é só agradecer “o nosso diretor Ben Affleck” que a situação fica ainda mais estranha.
Affleck não ser indicado pode parecer um assunto repetitivo, mas que precisa ser esgotado ao seu máximo, já que seria impensável não enxergar as qualidades técnicas do diretor em seu trabalho. Para sorte da história que se escreveu no domingo e entrou para os anais da sétima arte, Affleck pode subir ao palco com seu Oscar e ouvir seu parceiro de produção, Grant Heslov (ainda na presença de um calado e barbudo George Clooney, também produtor) lembrar que um filme não se faz sem um diretor.
Mas se a noite não foi de Spielberg, ela foi então de Affleck e seu segundo Oscar (reinterado por Chris Terrio ao receber seu Oscar de Melhor Roteiro Adaptado). Na verdade, é possível até achar que a noite foi dos galãs que conquistaram Hollywood, e não só de Affleck lembrado por seu Oscar de Roteiro por O Gênio Indomável (junto do amigo Matt Damon), mas também do ano em que o próprio Clooney entrou para a História da Academia de Ciências e Artes Cinematográficas de Hollywood, como o primeiro artista da história a ser indicado em seis categorias diferentes: Produtor (Argo), ator (Michael Clayton, Os Descendentes e Amor Sem Escalas), ator coadjuvante (Syriana), diretor (Boa Noite e Boa Sorte), roteirista original (Boa Noite e Boa Sorte) e adaptado (Tudo pelo Poder). Quem sabe agora ele não inventa de virar maquiador, diretor de fotografia ou resolva fazer um filme estrangeiro, para bater seu próprio recorde.
Mesmo assim, na contagem final, o grande ganhador da noite pode ter sido Argo, com apenas três prêmios, mas quem vai sair rindo à toa vai ser mesmo Ang Lee e seus quatro prêmios, ou talvez Quentin Tarantino e seu Django Livre, com dois prêmios (Roteiro e Ator Coadjuvante)… Na verdade, é difícil afirmar quem acaba sendo o maior ganhador da noite, mas é fácil apontar quem foi o maior perdedor, e olha que Steven Spielberg nem merecia sair da noite com um estigma desse tamanho.