O quão intensos são os diálogos das situações vividas pelos personagens em Eu Vejo Você em Todos os Lugares. Não são situações comuns, e por isso nos lembrariam a todo momento este ser um filme, mas a natureza naturalista das filmagens do diretor húngaro Bence Fliegauf, nos colocando em aproximação constante com essas pessoas, é de uma intimidade tão acachapante que nos rendemos ao filme e embarcamos na angústia desses seres humanos vivendo no seu limite, ainda que todas as conversas se desenvolvam dentro do lar.
Eu nem vou explorar os sete temas escolhidos pelo diretor/roteirista. Você precisa experimentar isso. Muitos lidam com a morte e torturas psicológicas, mas não há cenas fortes, apenas diálogos e atuações pra lá de inspiradas. É no “não-exagero” que o elenco se situa e nos entrega um intrincado jogo psicológico difícil de se desvencilhar. A todo momento estamos observando esse momento. Há um cabo de força estendido e invisível entre os protagonistas das discussões, mas ele está tão tenso por causa dos temas abordados que fica difícil não senti-lo. Ele está quase partindo, mas a habilidade do roteirista Bence Fliegauf é mantê-lo íntegro até o fim. E tenso.
Esse seria um trabalho teatral muito bem escrito e atuado em palco, mas a direção de Fliegauf vai além, pois ao nos situar dentro do lar dessas pessoas e com uma câmera que os colocam sempre seus rostos e expressões em evidência, se torna claro que não são apenas os diálogos que fazem o serviço, mas o movimento da câmera e o enquadramento. A própria fotografia contraditória, que evoca cores quentes de um lar na maioria das vezes aconchegante, é parte do que torna este um filme coeso, de textura indissociável do seu discurso.
Nossa vontade é sair de perto dessas pessoas, mas a cada fala que ouvimos a vontade é permanecer um pouco mais. “Até onde vai essa conversa?”, é o que você, caro espectador, irá ficar pensando boa parte do tempo em Eu Vejo Você…. Vai sair da sessão extasiado, espero. E irá encontrar repouso em nossas vidas mundanas, cotidianas, comunzinhas. Como é bom ser ordinário nessas horas.
“Rengeteg – Mindenhol látlak” (Hun, 2021), escrito e dirigido por Benedek Fliegauf, com Eszter Balla, Laszlo Cziffer e Péter Fancsikai.