What Just Happened (EUA, 2008), escrito por Art Linson, dirigido por Barry Levinson, com Robert De Niro, Sean Penn, Catherine Keener, Bruce Willis, John Turturro, Robin Wright, Stanley Tucci e Kristen Stewart
por Vinicius Carlos Vieira
Se depois do Barry Levinson de “Bom Dia, Vietnã”, “Rain Man” e “Bugsy” surgiu o de “Toys”, “Jimmy Hollywood” e “Assédio Sexual”, é mais que razoável entender por que motivos seu sensacional “Mera Coincidência”, de 1997, tenha sido tão celebrado, mas também razões para seu novo “Fora de Controle” dar as caras de modo tão subestimado, tanto aqui, direto em DVD, quanto nos Estados Unidos, lançado em 2008 e se tornado um fracasso de bilheteria, e como o próprio Ben (Robert de Niro) faz questão de lembrar, “são os números que interessam”.
Não que “Fora de Controle” mereça ficar na seção de medalhões da cinematografia do cineasta, tampouco mereça ser jogado na outra extremidade, principalmente por compartilhar com seus acertos, como de sua preocupação de discutir um assunto, de um jeito tão ferino quanto “Mera Coincidência”, porém um pouco revoltado além da conta, o que vai fazer a alegria dos amantes do assunto, mas acabar vazio para quem vai à procura apenas de uma boa história (coisa que “Mera…” tira de letra).
Aqui Levinson aponta suas armas para a própria indústria, acompanhando alguns dias na vida do produtor vivido por de Niro, às voltas com barbas, cachorros mortos, egos, meias, ex-mulheres, agentes, cortes final e no fundo de tudo isso, filmes. Não uma comédia non-sense, mas sim um exorcismo desse mundo, uma tentativa de passar a limpo o cinema como indústria.
Não que isso impeça o filme de, por um lado, ser uma comédia, pelo contrário, criando sim um punhado de ótimas situações, não pontuais, mas que se amontoam em um riso difícil que sai pelo canto da boca muito mais pelo absurdo da situação, e de uma certa desconfiança autobiográfica de toda trama, do que de uma ou outra sketch. Levinson trata-a como algo vivo, que não para de acontecer, que vai agregando assuntos a cada momento que passa e por fim, dá ao espectador um retrato distorcido de um quadro maior, mas igualmente bizarro.
Mais que isso, talvez Levinson tente o tempo inteiro desmistificar uma Hollywood que a maioria não conhece, por meio de pequenos conflitos que formam uma dinâmica interessante, mas que, por outro lado acaba carente de uma linha principal mais concreta (coisa que “O Jogador” de Altman, que trata um pouco do mesmo tema, faz com mais facilidade ao criar uma trama de gênero para mover a crítica), diminuindo o peso, principalmente, do fim do filme, onde o personagem de de Niro é obrigado a perceber que é “só um produtor”, como o próprio Bruce Willis, vivendo ele mesmo, faz questão de repetir um punhado de vezes.
E é jogando a luz sobre esses arquétipos da própria indústria que o filme ganha essa sobrevida que faz dele uma opção acertada. Levinson dialoga com o astro cheio integridade artística, com o diretor brigando por seu corte final, pelo estúdio pressionando tudo pelo menor prejuízo, com o agente e com o aspirante a roteirista tentando vender sua história, tudo nas costas desse produtor, que só quer, em uma foto com 20 mais influentes produtores de Hollywood para uma revista, estar entre “aqueles que fazem uma coisa pelo filme e não apenas colocam seus nomes dos pôsteres”. Um personagem quase trágico, que parece ter todo poder do mundo, sem conseguir exercer nada desse poder, tendo apenas que lidar com egos inflados enquanto dança conforme a música.
Em uma vontade meio desesperada de se posicionar diante da trama, Levinson só escorrega ao colocar na imagem de seu produtor uma carga de coitado que pouco combina com o personagem, que acaba se tornando meio apático e romântico demais. O diretor toma um lado contra as estrelas e os estúdios, e resguarda um pouco demais o outro lado, do qual ele faz parte, como produtor e diretor, o que condiz com sua verdade, mas fragiliza demais a trama por inteiro.
Com tudo isso, pelo menos, “Fora de Controle” serve como uma crítica a um marasmo intelectual e uma dependência econômico em que o cinema atual a cada dia se perde mais, em uma indústria cheia de elogios falsos e sentidos duplos, com cartazes que celebram apenas os números das bilheterias, sem sequer citar o nome do filme ou diretor, “afinal só os números importam”, uma realidade fria que parece mais preocupada com a reação da platéia do que com a eficácia de seu filme como cinema. Que luta com todas as forças contra um cachorro morto, sem perceber o quanto todo resto faz pouco sentido, mas que, por sorte, consegue vez ou outra, criar pessoas com Levinson, com senso de humor suficiente para rir disso tudo.