Horas de Desespero oferece alguns momentos de tensão palpável e sufocante – o que, unido ao bom elenco liderado por Owen Wilson e Lake Bell, impede o filme de ser uma total perda de tempo. O problema é que, para uma produção centrada em uma trama politizada, o roteiro se mostra inocente e ignorante.
Jack Dwyer (Owen Wilson), sua esposa Annie (Lake Bell) e as filhas pequenas do casal, Beeze (Claire Geare) e Lucy (Sterling Jerins) acabam de se mudar para um país asiático – que nunca recebe um nome. Jack está lá para trabalhar em um projeto que busca levar água potável ao lugar. Chegando no hotel, porém, eles descobrem que os telefones, televisores e internet estão fora do ar – mas, ei, afinal, o que esperar de um país “do quarto mundo”, como Jack brinca? Na manhã seguinte, porém, ele deixa o hotel em busca de um jornal norte-americano e se vê em meio a uma violenta revolução. Agora, Jack deve conseguir levar sua família com segurança até a embaixada dos Estados Unidos.
Sim, toda a ação e drama do longa está centrado em Jack – ele é o responsável por guiar e salvar sua família, que se mostra indefesa diante de tudo. O próprio Jack, é claro, não tem experiência nenhuma com uma situação desse tipo mas, de algum modo, consegue encontrar forças para enfrentar o terror que o cerca. O diretor John Erick Dowdle, que também assina o roteiro ao lado de Drew Dowdle, retrata bem o quanto é desesperador para um sujeito comum se ver naquele contexto, e o quão perturbador é, para sua família – e para o espectador – testemunhá-lo indo cada vez mais longe pela sobrevivência. É uma pena, portanto, que eles esqueçam que Annie esteja passando exatamente pelo mesmo arco dramático, preferindo tornar cada ação da esposa relevante apenas diante das reações que elas arrancam de Jack.
O roteiro, ao menos, faz um trabalho melhor com as meninas: Beeze e Lucy não são exemplos daquelas crianças irritantemente maduras e inteligentes dos filmes, que fazem comentários que ninguém daquela idade faria. Elas agem como crianças comuns vivendo um pesadelo, assustadas e exaustas. Mas vale notar que o fato de as duas serem meninas (e, portanto, “indefesas”) é utilizado pelos realizadores para potencializar ainda mais a imagem de “protetor” de Jack – se houvesse um garoto, ele certamente teria recebido seu próprio momento de heroísmo.
Se é o talento de Lake Bell que impede que Annie desapareça completamente da narrativa, Owen Wilson também se sai muito bem neste que é, provavelmente, seu papel de destaque mais afastado da comédia até hoje. Pierce Brosnan, por outro lado, também surge carismático, mas seu personagem é a personificação do conceito de deus ex machina, mantendo-se afastado da trama até o momento em que os Dwyers precisem dele.
O ponto alto do filme são, definitivamente, os momentos de absoluta tensão construídos por Dowdle quase como se eles estivesse dirigindo um filme de terror. A começar pela sequência inicial, brilhante ao acompanhar o segurança, o que cumpre três funções importantes: o espectador sabe que algo horrível está para acontecer, mas não sabemos o quê ou como; quando o segurança se afasta de seu protegido, a câmera o segue e, assim, ficamos distantes daquele que, sabemos, será o alvo; o segurança tinha a missão de proteger aquele homem e, portanto, acompanhamos sua impotência diante da violência, o que é um dos temas centrais do longa. Também merece destaque a sequência em que a família se vê obrigada a saltar de um prédio para o outro, e a maneira diferente que o diretor encontra de filmar cada um deles durante o ato.
Mas é mesmo em suas pretensões de produção politizada que o filme falha. Espetacularmente. Já errando feio ao nos levar a um país estrangeiro que jamais é identificado, o roteiro sequer perde tempo tentando compreender a revolução – afinal, eles parecem estar lutando por uma justa causa, apesar de serem os antagonistas. Da mesma forma, é preciso esforço para relevar a absurda inocência de Jack em relação aos objetivos de sua empresa e da aparente inexistente pesquisa sobre o país em que sua família vai morar por vários meses. Além disso, há momentos que parecem implausíveis, como algo que acontece na embaixada norte-americana.
Infelizmente, não é surpresa o fato de que este filme hollywoodiano coloque todos os seus holofotes sob uma família branca dos Estados Unidos, investindo principalmente na imagem de herói e protetor da família de seu protagonista. Enquanto isso, o sofrimento e a morte dos nativos daquele país não merecem mais do que alguns segundos de tela. Horas de Desespero se estabelece, portanto, como uma produção capaz de manter o espectador sem fôlego e preso à cadeira enquanto, ao mesmo tempo, falha em sua tentativa de discutir questões relevantes.
“No Escape” (EUA, 2015) escrito por John Erick Dowdle e Drew Dowdle, dirigido por John Erick Dowdle, com Lake Bell, Owen Wilson, Pierce Brosnan e Sterling Jerins