How to Have Sex | Consentimento é uma palavra difícil de soletrar

How to Have Sex quer passar um sentimento específico, lá para o final do filme, dentro de um aeroporto, uma cena que parece longa demais para o incomodo que ela passa, mas que, ao mesmo tempo, serve de preparação para aquilo que a personagem está pedindo desesperadoramente desde o primeiro plano do filme. O que vem nesse meio é só um subterfúgio.

Como se o filme escrito e dirigido por Molly Manning Walker fosse refém desse instante. Não que o resto do filme seja vazio ou qualquer coisa do tipo, muito pelo contrário, sua sensibilidade e delicadeza deixarão os espectadores tão próximos da personagem que tudo se desenrolará em uma sensação dolorida e solitária. Sentimentos tão comuns para qualquer um, mas que, quase sempre, precisam ser escondidos ou deixados de lado diante das imposições ao redor de cada um.

Isso tudo só funciona, por How to Have Sex te engana. Fingindo no começo ser um daqueles filmes onde três jovens, Tara, Skye e Em (Mia McKenna-Bruce, Lara Peake e Laura Ambler) chegam a Malia, na Grécia, em meio a um feriado cheio de ainda mais jovens próximos dos primeiros anos dos restos de suas vidas, vulgo, “fim do ensino médio”.

Com bebidas, drogas, música alta e hormônios escorrendo pelos poros, o planos das três é se divertir e, como o título promete, transarem. Mas a qualidade da direção de Manning Walker nunca permite que o filme seja só sobre isso. Sua câmera experiente de uma década de direções de fotografia sempre olha para as personagens como se tentasse desvendar seus olhares e pequenas ações.

Os diálogos são certeiros e constroem essas personagens como uma agilidade incrível. Em poucos minutos do filme é fácil entender o quanto Tara está ali, mas não está, mesmo por trás de todo uma “carapaça sociável” que empresta para ela uma força que ela talvez não tenha. O modo como a diretora entende o local e a linguagem que quer passar é espetacular e poderosíssimo. Quando precisa ser verdadeiro e real, é como se fosse uma quarta personagem com elas, mas se quer entender o que uma das três está pensando, não tem o menor receio de olhá-la com desconfiança ou até tristeza.

Aos poucos, Tara vai se tornando não só a protagonista, mas também solitária e insegura. A baixa profundidade de campo embaça tudo ao redor dela, portanto, mesmo no meio de uma multidão, é como se ela estivesse sozinha. Diante de sua dor, a diretora parece se permitir desviar o olhar e tentar entender o seu corpo falando através da força de seus dedos na areia.

Mas tudo isso é feito enquanto tenta não julgar demais o vazio desses jovens. Não se deixando levar pela vilanização simples de um ou outro personagem. Da violência ou da humilhação, do desprezo ou até daquela sensação de não caber naquele mundo, tudo vai rodeando Tara e colocando-a em uma espécie de vórtice que a espreme dentro desse mundo que ela parece não estar preparada para viver, mas que irá viver, afinal é a única opção que enxerga ter. Ou ela se encaixa nesse lugar, ou estará ainda mais sozinha.

A história de Molly Manning Walker busca esse lugar onde o consentimento pode ser uma palavra complicada demais para ser usada. Onde a ilusão da liberdade não está ligada ao que, por exemplo, Tara quer, mas àquilo que ela acha que quer, e a cada passo que ela dá, mais solitária ela está nessa rua onde todos já se divertiram e só sobrou ela em meio ao lixo e às lembranças embargadas pelos prazeres artificiais e hedonistas de um feriado longe de casa.

Mas isso tudo não é o filme, mas sim a preparação para aquela cena lá no final. Um momento absolutamente delicado e dolorido onde o espectador ficará arrasado por não poder consolar Tara e pedir para que ela seja verdadeira e honesta com ela mesma. Uma preparação para aquele momento onde, mesmo diante da hesitação, fica fácil entender de onde sai o receio de se enxergar diante daquilo que ela se tornou. O que vem depois é uma declaração de amor e proteção através de um gesto simples e que parece demorar demais para acontecer.

How to Have Sex não é sobre fazer sexo, mas sim sobre entender o real significado do vazio que rodeio o prazer desimpedido e irresponsável. Sobre aquele sentimento de insegurança que emplaca o olhar para o futuro sem certezas. How to Have Sex é sobre seguir em frente, mas não sem ninguém, nunca.


“How to Have Sex” (UK/Gre, 2023); escrito por Molly Manning Walker; com Mia McKenna-Bruce, Lara Peake, Enva Lewis, Samuel Bottomley e Shaun Thomas


Trailer do Filme – How to Have Sex

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