O diretor Noah Baumbach faz em Mistress America um trabalho menos intelectualmente fechado que seu Frances Ha, mas emprega a mesma atriz, Greta Gerwig, que surge de sopetão e é a mesma Frances que conhecemos no filme anterior.
A história é saborosa do começo ao fim, com diálogos inteligentes, bem colocados, e com uma dinâmica que, assim como em Juno, de vez em quando corre o sério risco de soar “inteligente demais para ser realista”. E, de fato, em muitos momentos o espectador irá parar, respirar e se imaginar mais em um palco de teatro do que em uma sala de projeção.
Ainda assim, a distinção fica por conta do ar menos indie que Baumbach emprega em seus personagens (escrito a quatro mãos entre ele e Gerwig), sempre apelando para a cultura pop mais acessível, além de realizar com sua editora, Jennifer Lame, um trabalho fluido demais para uma comédia pseudo-dramática, cheio de quadros certinhos até em sua simetria cômica (como quando três personagens se encontram geometricamente dispostos em uma escada olhando para o andar inferior, ou quando todos se juntam para ler).
A história gira em torno da recém-graduanda Tracy (Lola Kirke), que luta tanto para arrumar um amigo quanto para conseguir um lugar em um exclusivo clube de escritores da faculdade. Ao conhecer sua futura meia-irmão (Gerwig), a mais velha, mais faladeira e mais-tudo Brooke, acontece uma espécie de paixão platônica entre uma escritora e sua futura obra. E conforme ambas passam os dias juntos, ela compõe uma história através da percepção que tem da sua nova amiga.
Estamos em Nova Iorque, mas curiosamente, diferente dos filmes de Woody Allen, esse é apenas um detalhe do filme. O que importa, mais do que tudo, é observar a dinâmica entre essas duas, que de dependência simbiótica passa a flertar com uma espécie de relacionamento passivo-agressivo. Assim como um casal secundário que participa da farra intelectual em que se metem quando Brooke decide lutar pela sua ideia de um restaurante onde todos possam viver suas vidas em harmonia indo visitar o ex-namorado roubado por sua amiga.
Impulsionado mais pela “performance” dos diálogos do que pelos atores em si, Mistress America é uma longa exposição de ideias filosóficas por trás do que todos acham sobre mulheres. Diferente da eterna perdedora Frances, aqui temos uma escritora disposta a capturar os inúmeros momentos da amiga. Mas isso constitui uma exploração não-requisitada? Ou são simplesmente pessoas seguindo suas vidas egoístas e interesseiras? O filme toma um lado, mas a questão é muito mais além do que aparenta no filme. Se há algo digno de nota, é justamente a capacidade do filme em oscilar seu humor sem perder a sua moral, quase aristotélica, quase matemática, e ainda assim, apaixonante.
“Mistress America” (EUA, 2015), escrito por Noah Baubach e Greta Gerwig, dirigido por Noah Baubach, com Greta Gerwig, Lola Kirke, Matthew Shear, Jasmine Cephas Jones, Heather Lind e Michael Chernus