Nada de Novo no Front (Netflix, 2022) | Crítica do Filme

Nada de Novo no Front | Nunca há vencedores

Depois de mais de 100 anos de cinema, é possível ter algumas certezas, uma delas é que os melhores filmes de guerra nunca são sobre as guerras, mas sim sobre os seres humanos no meio delas. O novo Nada de Novo no Front só reforça essa máxima.

Uma máxima que já foi duas outras vezes levada para as telas, uma em 1930, que até levou para casa dois Oscars (Melhor Filme e Melhor Diretor, para Lewis Milestone), e outra menos badalada e feita para a TV em 1979. Mas todas são baseadas no livro de Erich Maria Remarque, por sua vez baseado nas suas próprias experiências como soldado durante a Primeira Guerra Mundial.

Essa nova produção da Netflix então bebe diretamente na obra de Remarque, com o roteiro escrito pelo trio Lesley Paterson, Ian Stokell e também pelo diretor Edward Berger. O resultado é um retrato humano da desumanidade da Guerra. Dessa e de todas as outras, afinal os terrores são os mesmos.

Por entender esse lado universal, Nada de Novo no Front, mesmo retratando uma época muito específica, ultrapassa completamente as barreiras do tempo e coloca o espectador dentro dessa guerra com sentimentos que poderiam estar em qualquer conflito. Parafraseando outro filme: do êxtase até a agonia.

De modo ao mesmo tempo delicado, visceral e poderoso, o filme não começa com o protagonista, mas sim com apenas mais um soldado anônimo avançando contra as linhas inimigas francesas. A câmera de Berger não poupa esforços na hora de se manter sem cortes e acompanhar os últimos momentos desse jovem sem nome. Mas o interesse é em sua roupa, depois dela ser transportada pelo front, lavada e costurada, é ela que vai parar nas mãos de Paul (Feliz Kammerer), um jovem alemão empolgado com a possibilidade de representar seu país em uma guerra que, ele talvez não saiba, mas já durou tempo demais.

Nada de Novo no Front | Nunca há vencedores

Paul e mais três amigos inseparáveis partem então para o campo de batalha, sem treinamento ou preparação, apenas uma vontade de mudar um mundo que pouco se importa com eles. O filme acompanha de perto essas quatro figuras que se tornam rapidamente trágicas, principalmente ao serem colocadas de lado com os alto escalões dessa guerra, tanto representados pelo burocrata responsável por uma possível rendição (Daniel Bruhl), quanto pelos generais dando suas ordens rodeados de comida e serviçais.

Ainda que a intenção do filme seja sempre mostrar esses horrores de estar no campo de batalha, a violência, a fome, o desespero, a delicadeza de cada pequena felicidade, a dor da perda e mais um monte de situações que colocam o espectador com esses personagens perdidos dentro dessa guerra, o roteiro sempre faz questão de contrapor a distância entre a lama e o sangue da batalha e a limpeza dos ternos passados e pratos cheios de comida de quem decide realmente o futuro da guerra.

Por isso mesmo, Nada de Novo no Front é um filme com um visual estupendo, uma direção de fotografia de James Friend que rivaliza com alguns dos melhores trabalhos dentro do gênero e uma recriação de época extremamente precisa, mas tudo isso para contar essas pequenas histórias. Não que o filme seja episódico, mas sabe que precisa esclarecer cada ponto da guerra de modo delicado e humano, afinal ele nunca é sobre a guerra.

Cada diálogo do roteiro não quer repetir alguma ideia que já está na tela, mas sim enriquecê-la com a vida (e morte) desses homens (jovens). As pitadas de esperança que surgem em meio a todo desespero são quase sempre varridas pela verdade violenta da batalha. Uma conversa sobre o que poderá ser feito depois da guerra parece vazia diante da pouca expectativa de vida de cada um. Nada de Novo no Front está lá para mostrar o soldado recolhendo a identificação dos soldados mortos enquanto olha para eles como anônimos que são. O poder e tristeza de momentos como esse são construídos pelo diretor com um respeito e uma delicadeza que fazem do filme uma experiência emocionante e desesperadora.

Berger olha para seus personagens principais, tanto Paul, quanto Matthias Erzberger (Bruhl) e procura ali um pouco de razão e paz dentro de uma situação que faz pouco ou nenhum sentido. Em um vagão negociando com os franceses, Erzberger está realmente tentando salvar Paul, mas o orgulho e falta de humanidade dos ternos passados ao seu redor (de ambos os lados), não estão preocupados com Paul ou nenhum outro corpo que está, momentaneamente, vestindo aquela farda.

Nada de Novo no Front quer mostrar que existem seres humanos dentro de qualquer guerra, mas também se esforça para deixar claro o quanto não existe vencedores, apenas perdedores. Na sua maioria anônimos e que foram esquecidos pela história, mas ainda assim seres humanos pegos no meio da cobiça e orgulho de outros, nesse caso, menos humanos.


“Im Western Nichts Neues” (Ale/EUA/UK, 2022); escrito por Edward Berger, Lesley Paterson e Ian Stokell, à partir do livro de Erich Maria Remarque; dirigido por Edward Berger; com Felix Kammerer, Albrecht Schuch, Aaron Hilmer, Moritz Klaus, Adrian Grunewald, Edin Hasanovic e Daniel Bruhl


Trailer do Filme – Nada de Novo no Front

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1 Comentário. Deixe novo

  • Carlos Roque
    08/11/2022 19:53

    um filme em que a agonia é um dos personagens principais

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