Lá para o final de O Grande Mestre surge um garotinho chinês anônimo e se torna o pupilo mais jovem desse mestre do Kung Fu, Ip Man. Na verdade o menininho não é tão desconhecido assim, e ainda que não seja citado, é um cara chamado Bruce Lee e, provavelmente, é a parte mais interessante de todo o filme.
Bom, talvez isso soe exagerado, e é, já que o melhor desse pseudo-épico de Kung Fu são algumas das melhores lutas que o cinema viu em anos, mas para ligar tudo isso o filme de Kar Wai Wong não faz o mínimo esforço. Mas o mínimo esforço mesmo, não servindo direito nem como desculpa.
Tudo parece se resumir a quem luta melhor, quem sabe mais estilos de Kung Fu, quem vai se vingar de quem e, por fim, quem vai dar uma sova em um grupo de lutadores para mostrar que manda na cidade. Na parece então existir o mínimo esforço para carregar essa história por uma trama um pouco mais concisa, que saia de um lugar no começo e chegue a um outro lugar qualquer no final. Tudo então parece episódico e carregado sem cuidado, passando demais sob o foco de protagonistas demais e parecendo fazer questão de chegar a poucas conclusões minimante inesperadas.
De modo rasteiro, O Grande Mestre pode ser resumido como a história desse tal Ip Man (Tony Leung Chiu Wai), que não só foi mestre do Bruce Lee, mas também, aparentemente, um dos maiores nomes do Kung-Fu moderno. Mas também o filme acaba sendo sobre a vingança da filha (Ziyi Zhang) desse antigo grande mestre (que “passa o bastão” para Man) diante da traição de seu único discípulo, que, durante a guerra, passa para o lado dos japoneses, mas isso acaba não tendo nada a ver com a história. Por fim, espremido em um canto, ainda surge um tal de “Navalha” (Cheng Chang), que deve ser famoso por sua escola de Kung Fu em Hong Kong (a outra é do mestre Ip).
Enfim, é fácil desconfiar que para os grandes conhecedores da arte-marcial em questão, O Grande Mestre esteja repleto de referências, detalhes e easter-eggs, mas para o resto do mundo, tudo só soa mesmo como desculpa para as cenas de lutas. Isso, ou a história real é mesmo completamente chata e entediante (que eu duvido).
Entretanto, em qualquer um dos casos, grande parte do filme funciona, já que é constituído de cenas de luta que deixam no chinelo Hollywood, Ang Lee e Matrix, ainda que recicle boa parte dessas ideias (como chuvas e roupas). Mas, sem dúvida nenhuma que o faça de jeito muito mais interessante que qualquer citado.
Kar Wai Wong parece tratar cada cena de ação de modo milimétrico e preciso, misturando perfeitamente bem planos detalhes, planos abertos e ângulos inesperados, tudo deixando a impressão de que o que se está fazendo ali é puro Kung-fu (e se não é, engana direitinho). E diante disso, para os amantes dos clássicos filmes do gênero, O Grande Mestre é imperdível, até quando se diverte buscando a reação de um monte de espectadores dessas lutas e com a quantidade incontável de pessoas atravessando vidraças, sem contar muito (mas muito mesmo!) slow motion, poses e golpes tremendamente plásticos.
Uma combinação que surge como um espetáculo, mas que para ser apreciada no resto do tempo, além da história chata e monótona, ainda é preciso aguentar o mesmo slow motion, as mesmas poses e o mesmo exagero melodramático entre as lutas, em cada diálogo. Um problema que só ficar pior ainda por que no cinema o que todos querem mesmo ouvir é aquela parte do diálogo que diz algo parecido como “então vamos lutar” e permite a diversão começar.
Opções que fazem então que O Grande Mestre seja realmente um daqueles filmes clássicos de Kung Fu, com uma história rasa, personagens unilaterais, um monte de honra e frases de biscoito da sorte, mas que ninguém se importa com nada disso e só entra no cinema (ou, futuramente, não tirará do canal, onde deve fazer um baita sucesso com uma dublagem ruim) por que sabe que em alguns instantes algum “pretenso Bruce Lee” vai descer o braço em um número enorme de capangas genéricos enquanto come seu pacote de biscoitos.
“Yi dai Zong Shi” ( HK/Chn, 2013), escrito por Kar Wai Wong, Jingzhi Zou e Haofeng Xu, dirigido por Kar Wai Wong, com Tony Leung Chiu Wai, Ziyi Zhang, Qingxiang Wang e Cheng Chang
Essa crítica é parte da cobertura da Itinerância da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Trailer do filme O Grande Mestre